Há duas semanas oferecíamos umha pequena reportagem sobre o boletim “Gralha”, um dos fitos do jornalismo de base dos 90, e porta de entrada para o movimento reintegracionista e independentista dumha nova geraçom de militantes, na altura muito novos. Hoje visitamos umha publicaçom paralela ao boletim ourensano, coincidente com ele em alguns pontos, e enormemente divergente em outros. Falamos de Informaçom Obreira, a revista clandestina que chegava a dúzias de fogares naquela Galiza de há um quarto de século, e que apostava sem matizes por umha clara decantaçom política: independentismo revolucionário.
Corria o ano 1994. Havia menos dum lustro que se esboroara o socialismo real; a guerra civil desangrava os Balcáns, e o conflito servia a toda a imprensa occidental para a demonizaçom do nacionalismo, incluído o galego. Na nossa Terra, a imensa maioria do galeguismo apostara por priorizar as vias eleitorais. O EGPGC fora desarticulado em sucessivos golpes policiais, e a Assembleia do Povo Unido estava a piques de acometer a sua auto-dissoluçom. Naqueles tempos, porém, havia também assomos de esperança: a Galiza organizada respostava com contundência na crise pesqueira do fletám ou dos marinheiros do banco canário-saariano; nom demorariam em reeditar-se as tractoradas; pola base, germolavam o movimento reitegracionista, e um antimilitarismo que levaria milhares à rua em defesa dos insubmissos.
Naquele contexto, um grupo de veteranos militantes arredistas disponhem-se a lançar umha publicaçom. Entre eles estava o psiquiatra Ramom Muntxaraz, militante muito formado e com umha excepcional capacidade de trabalho cuja figura temos glossado neste portal. Com motivo da homenagem que o povo lhe tributou ao Muntxa, umha colecçom digitalizada de IO foi editada. No passado verao, Causa Galiza subiu à rede o completíssimo dossiê que IO dedicara à queda de Moncho Reboiras e à repressom de 1975.
Desde o primeiro momento, Informaçom Obreira definiu-se como umha revista clandestina; densa e trabalhada, sem ilustraçons. Alguns números superam as 60 páginas em letra tamanho 10. É a revista duns tempos e dum movimento que valorizava a formaçom e no que, longe das pressas de hoje, era habitual dedicar horas à leitura sossegada. Aliás de favorecer a reflexom IO tinha um fim tremendamente prático:
“temos claro qual é o nosso fundamental objectivo: ajudar a avançar ideológica e politicamente o Independentismo Revolucionário e o Comunismo na Galiza. E ponheremos o melhor de nós, como militantes.” O anonimato e a humildade som reivindicados: “Para militar no Movimento de Libertaçom Nacional nom é necessário estar ‘acreditado’ polas assinaturas de ninguém. Nom faz falta (mais bem sobram) carnets de pertença a Organizaçons, nem ‘curriculums’ históricos de militanças ‘passadas’, nem ‘medalhas de serviço prestados.” (IO, n.º 16)
Na cabeça de qualquer participante dos movimentos populares da altura estava presente a consciência de iniciar-se umha travessia no deserto; a ofensiva ideológica contra o independentismo e o marxismo era muito forte. Por isso no número 15 do IO afirmava-se:
“as mesmas razons que (no seu dia) nos levaram a publicar o primeiro número seguem hoje vigentes. E estas razons nom som outras que a progressiva liquidaçom dos Métodos Organizativos e de Luta, Revolucionários, sobretodo desde a esquerda política e sindical que (junto com a massiva intoxicaçom informativa do Sistema) estám a piques de converter a Galiza num Povo cada vez mais colonizado, embrutecido, desmobilizado.”
Formaçom e informaçom
Sem internet e com umha fractura geracional que se repite periodicamente na história da Galiza, era muito difícil para a mocidade recém politizada do país aceder à formaçom. A que salvava o cerco de silêncio fazia-o para ilustrar-se com as histórias oficiais do nacionalismo promocionadas polo conglomerado d’A Nosa Terra, normalmente silenciadoras ou caricaturizadoras do independentismo.
Informaçom Obreira deu a possibilidade de conhecer a linha mais subversiva do nosso movimento a dúzias ou centos de moços e moças. Graças a um meticuloso trabalho de arquivo e hemeroteca, IO resgatou para o público a mobilizaçom obreira de 1972, a queda de Reboiras e a liquidaçom do sector revolucionário da UPG, a resistência das Encrovas ou o nascimento do sindicalismo nacionalista.
O boletim pretendeu também informar, e fijo-o com solvência. As suas reportagens adoitavam fazer um varrido informativo pola imprensa do Regime, escolmando os seus cabeçalhos e desmontando os seus bulos. Através de IO podemos conhecer algum dos momentos mais tensos da Galiza dos ‘90. Com os efeitos da integraçom na UE ainda intensificando-se (levavam-se apenas duas décadas no mercado comum), a defesa dos sectores produtivos estava permanentemente presente na rua e no parlamento. Junto com a crónica do acontecido, IO apostava por um modelo comunicativo que punha nomes aos responsáveis políticos e económicos que naquela altura apostavam numha Galiza mais desindustrializada e desagrarizada, inaugurando a posterior monocultura dos serviços:
“o IR devemos tirar à luz da militança e do Povo Trabalhador Galego, os ‘nomes e apelidos’ das máfias, dos agentes do colonialismo, da intoxicaçom e da repressom fáctica. Ponhê-los a todos ao descoberto, pois som os que estám a ‘assassinar’ física e mentalmente o Povo. Desde jornalistas intoxicadores colaboradores ou agentes do CESID, aos narcotraficantes e empresários exploradores sem escrúpulos.” (IO, n.º 16)
O tom com o nacionalismo institucional é tremendamente duro, e esse movimento sempre é qualificado de ‘nacional-autonomismo.’ Porém, evitando o ambiente de liortas e degradaçom pessoal que soi acompanhar todos os conflitos internos na esquerda, IO tencionava manter umha certa elegáncia na controvérsia ideológica:
“Nunca utilizamos, nem utilizaremos, nomes e apelidos dos responsáveis directos e executores materiais (que havê-los hai-nos), de muitas renúncias políticas e purgas, que determinárom a queda do MLNG no nacional-autonomismo (…) Muito menos ainda (nunca) desacreditaremos pessoalmente nenhum irmao/irmá em concreto, por muito que discrepemos politicamente.” (IO, nº16)
Veterania e mocidade
IO tivo entre os seus principais focos de interesse a mocidade. Com efeito, juvenil era a base social do movimento da insubmissom, que iria acaparar a actualidade durante o derradeiro lustro do século XX. Os colectivos reintegracionistas de base tinham umha componhente moça muito importante. Nas ruas e na universidade, AMI e Estudantes Independentistas faziam-se ouvir, com preocupaçom do Ministério de Interior.
IO incidia umha e outra vez na necessidade de formaçom política e ideológica, e analisava a importáncia do diálogo entre geraçons de arredistas:
“umha das características mais decisivas e influintes na actual conjuntura do MLN é a do relevo geracional que coincide com um replantejamento geral da estratégia e métodos de luita. Moços, ‘menos moços’ e camaradas de idades superiores aos 45 anos concidimos no processo de re-organizaçom do IR nuns momentos complicados.
A Mocidade debe aproveitar ao máximo nível a experiência dos velhos militantes. Estes devem estar dispostos a transmitir às novas camadas independentistas tudo o que aprendêrom na prática. Tanto o que supujo avançar como os erros e contradiçons. Nom aproveitar esta experiência seria umha enorme equivocaçom.” Porém, também esclarecem “Nunca aferrolhar-se no passado ou em dogmatismos mecánicos mesmo se som, ou fórom no seu tempo, úteis noutras situaçons. A melhor forma de avançar é construir, organizar, pôr todas as faculdades físicas e psicológicas para intuir, imaginar, idear, analisar, aprender.” (IO n.º 13)
IO também quijo marcar linha política com toda claridade em dous ámbitos mui relacionados com a mocidade. No que diz respeito o antimilitarismo, e ante a profusom de filosofias diversas, afirmavam os redactores:
“A insubmissom militar só se converte num acto revolucionário quando o insubmisso milita nas fileiras do ‘exército’ do Povo. Quando deixa claro que as razons da sua insubmissom nom som as mesmas que as da ‘insubmissom’ dos espanhóis, nem dos pacifistas, nem dos ‘sinfronteras’, nem dos místicos-metafísicos nem dos antimilitaristas a secas e dos estúpidos pequeno burgueses que dim nom ter mais pátria que o mundo.” (IO n.º 21)
Também no problema da droga o discurso e talhante, sem nenhuma concessom às atitudes liberais que começavam a popularizar-se nos ambientes politizados dos 90:
“Se queremos que as nossas futuras mocidades nom tenham o problema da actual, temos de actuar de forma radicalmente distinta. Nom só atacando nas suas mesmas raízes os interesses do narcotráfico, senom, também, criando no Povo umha atitude clara, a saber: as drogas fam parte dos produtos introduzidos polos mesmos agentes imperialistas para colonizar, espanholizar e explorar o Povo Trabalhador Galego. (…) Dependendo das drogas os trabalhadores/as colonizados super-alienam-se ainda mais da sua consciência de classe.”
O contributo
Por trás do Informaçom Obreira há um ingente trabalho de documentaçom, estudo, redacçom e distribuiçom, que serviu para tecer vencelhos humanos e criar camaradagem num arredismo disperso, com comunicaçons muito mais lentas que as de hoje. A proposta de reorganizaçom política que foi formulada polos redactores nom chegou a concretizar-se naquelas datas, mas a ideia, ainda com outros formatos, prendeu, e foi para a frente uns anos depois.
IO deixou de publicar-se em 1999, às portas do novo século. Cobriu com muita utilidade e dignidade umha parêntese entre duas geraçons políticas, mais duas geraçons das que levam erguendo desde há mais dum século a bandeira da independência.