Por Jorge Paços /

A saúde pública tem-se situado como um dos problemas gritantes das sociedades industrializadas, que nas últimas décadas reparam com pavor nos efeitos contra-produtivos do mundo moderno: poluiçom, doenças degenerativas, desequilíbrio mental, intoxicaçons alimentares. Poucos lembram, porém, que há justo cincuenta anos a Galiza se situava como centro dum dos capítulos mais sinistros da procura de lucro sem escrúpulo. Em 1967 sentavam no banco dos acusados os principais responsáveis do “caso do metílico”.

A Galiza enveredava polos primeiros passos dumha industrializaçom dependente, e a ditadura afrontava a sua decadência. Na Audiência Provincial de Ourense, conhecidos capitalistas de Vigo e da própria cidade das Burgas enfrentavam graves petiçons fiscais.

A fatídica primavera de 1963.
Uns anos antes, dúzias de falecimentos atraziam o protagonismo mediático; também o faziam casos de pessoas que perdiam a vista de súpeto sem causa aparente. Registárom-se oficialmente 53 pessoas mortas naquela estaçom, nomeadamente na Galiza e nas Canárias; na realidade, pensa-se que os e as falecidas puidérom ser milhares, embora nom se registárom.

O Carvalhinho foi o lugar galego onde a morte se cebou com especial virulência na altura, o que motivou crescentes suspeitas. Aginha se descobriu que certo álcol adulterado -até se converter em veleno- causava a desfeita; sem embargo, ainda que as partidas foram blocadas polo Estado, parte da distribuiçom estava feita, com o álcol a servir-se com normalidade nas tabernas.

Casa Lago e Hijos: lucrar-se com a morte.
Foi a profissionalidade dumha boticária canária, María Elisa Álvarez Obaya, a que descbriu que todos os seus clientes falecidos tinham bebido álcol adulterado, dando a voz da alarma e chegando à fonte da intoxicaçom. Tratava-se de auga-ardente procedente de Vigo; comercializava-a casa Lago e Hijos.

Namentres esta empresa sem escrúpulos espalhava o veleno, os casos das mortes ocupavam espaço na imprensa empresarial, e a lenda urbana adjudicava os falecimentos a um andaço de meningite. O Carvalhinho chegou a acumular 13 mortes seguidas, e a desgraça no demorou em chegar às rias ou a Costa da Morte.

Os feitos.
A pesquisa provou que os industriais vigueses decidiram a mestura de álcol metílico com álcol etílico para abaratarem os preços de produçom de rum, licor café ou auga-ardente. O metílico é um produto industrial com o que se fabricam vernizes, disolventes, plásticos ou explosivos.

O juízo.
Quatro anos depois dos factos, e após umha das instruçons mais volumosas da história jurídica galega, onze pessoas sentárom no banco dos acusados de Ourense, todos e todas elas acusadas de “delito contra a saúde pública” com distintos graus de gravidade. Rogelio Aguiar, adegueiro ourensano, foi considerado dos principais responsáveis da trama, junto com os vigueses Lago-Álvarez e Lago-Cabral. As penas, extraordinariamente duras para o franquismo, considerando que julgava os seus apoiantes no mundo empresarial, chegárom aos 19 e 17 anos de cadeia para os principais responsáveis.

Posteriores indultos conseguírom que os culpáveis da vaga de mortes nom cumpriram nem seis anos de encerro; umha estória familiar, quando som representantes do capital quem se sentam no banco dos acusados.

Valedores, herdeiros, vítimas.
Ninguém tem culpa da sua filiaçom familiar nem do nome e atitude dos seus devanceiros; nom sendo, obviamente, que se decida a vindicá-los como pessoas honoráveis, apesar da sua manifesta culpabilidade em delitos horríveis. Assim o fijo Gloria Lago, hoje representante do supremacismo espanhol e descendente dos empresários que enchêrom a Galiza e as Canárias de morte; na sua obra “El reloj de Cuco”, Lago pretendia restituir o honor da família e denunciava o “juízo irregular” ao que foram submetidos.

O feito, longe da anedota, demonstra algumha das constantes da Galiza franquista e neofranquista: a impunidade ou grande margem de acçom dos delinquentes, se estes procedem das classes proprietárias; a discreçom dos grandes meios galego-espanhóis na hora de abordar os assuntos sujos dos seus grandes valedores (caso de Gloria Lago); e o direito das elites a defenderem, sem serem caluniadas nem judicializadas, os comportamentos mais aberrantes.

Porque face as elites, está o relato das classes populares: o das famílias das vítimas, que nom recebêrom indemnizaçom duns culpáveis que supostamente eram “insolventes”; o das herdeiras, que quigérom reabrir o caso em 2013 e vírom como a sua petiçom fora rejeitada; ou o das valedoras da memória dos vencidos que, também neste caso, pretendêrom lançar iniciativas de recordo das vítimas, que tampouco puidérom materializar-se.