A rapidez dos avanços tecnológicos fai difícil avaliar os seus impactos. Também no ámbito dos direitos e liberdades, que se vem constringidos por umha malha cada vez mais mesta de sistemas de controlo telemáticos. A biometria, umha ferramenta de reconhecimento irreversível e quase inapelável, abre-se aos poucos espaço sem fiscalizaçom popular.

A biometria é um sistema de reconhecimento dos corpos humanos que, sendo irrepetíveis, permite singularizar umha pessoa através do processamento da sua imagem mesmo no interior. A sua modalidade mais popular é o reconhecimento facial. Um sistema informático localiza 16000 pontos do rosto dumha pessoa e, calculando as distáncias que mantenhem entre si, identifica-a. A sua utilizaçom está em fase inicial, e os governos e empresas priorizam-no para o controlo de fronteiras e o horário de trabalhadores.

Dos Estados Unidos ao Reino de Espanha, passando pola China

As grandes corporaçons tecnológicas estám a oferecer a biometria como ‘serviço’ aos usuários de iPhoneX ou Samsung Galaxy. Deste modo, promocionam no mercado de particulares um sistema que já se tem aplicado em aeroportos estadounidenses desde 2017, e que nom se livrou da controvérsia. O departamento Customs and Border Control, encarregado pola blindagem das fronteiras e dos voos, reconheceu que umha subcontrata fora hackeada, com o que se roubaram os rostos de mais de 150000 pessoas. Desconhece-se a utilizaçom que se dará a estes rostos roubados.

Na China, mais de dous milhons de cidadaos e cidadás som identificadas polo governo através do rosto; e no Reino de Espanha, as linhas fronteiriças de Ceuta e Melilha utilizam-na para criarem um registo de pessoas consideradas ilegais. Para o consumidor inocente, esse que afirma ‘nom ter nada que ocultar’, a biometria topa-se a disposiçom no aeroporto de Palma graças a Aena, e em vinte caixeiros automáticos de Caixa Bank, que o lançam como experiência piloto.

Ferramenta patronal

O mundo empresarial devece pola sua extensom. O registo das horas extra, a priori um logro do movimento sindical, está a ser aproveitado pola patronal para instalar sistemas de geolocalizaçom, fichagem por impressom digital, e também biometria. Especialistas em cibersegurança tenhem advertido que ferramentas como esta podem abrir na realidade caminho para um controlo exaustivo da produtividade e o comportamento das e dos trabalhadores nos seus detalhes mais nímios.

Mesmo os poderosos reconhecem a biometria como faca de dous gumes. O Regulamento Geral de Protecçom de Dados, recentemente aprovado pola UE, considera os dados biométricos como ‘umha categoria de dados especiais.’ Apesar dos protocolos legislativos, que polo seu volume e densidade passam desapercibidos para o cidadao médio, o mundo empresarial continua a extender discretamente o seu avanço. A companhia HRLOG, operante no Reino de Espanha, reconhecia no passado mês de maio que as demandas empresariais de sistemas biométricos cresceram num 70%.

Dados sem controlo e falsos positivos

Para a associaçom @DerechosDigitales, os dados biométricos pertencem a umha outra dimensom dos dados pessoais, e a sua condiçom é tam delicada que precisam de blindagem legal. A diferença de outras informaçons sobre a nossa pessoa, tais como o endereço, o telefone, ou mesmo o nome, os dados biométricos nom podem cambiar-se. Quando umha pessoa perde o registo dos seus dados biométricos, esta perda é irreversível. Poderiam ser utilizados polo Estado no que esta mora quando virar ditatorial, ou também por um Estado foráneo ao que a pessoa viajara, e que decidira perseguir por qualquer motivo o visitante. Tenhem-se registado também casos de ‘falsos positivos’. Isto é, falhos no programa em casos de investigaçom judicial que podem inculpar umha pessoa inocente por erros informáticos.

Dividendo digital e economia dos dados

A biometria é apenas umha porçom dum novo ramo do capitalismo seródio, conhecida como ‘dividendo digital’. A economia de processamento de dados, galinha dos ovos de ouro do neoliberalismo do século XXI. Fusionado com o poder político, este modelo basea-se na prediçom dos comportamentos e no controlo absoluto das populaçons. O conhecimento da identidade, da vida quotidiana e das pulsons mais íntimas das pessoas serve para facilitar as vendas, moldear identidades e conduzir adesons políticas. Vladimir Putin, o dirigente que combina à perfeiçom economia neoliberal com satrapia política, declarou com transparência: ‘quem se encontrar em disposiçom de recolher a maior cantidade de dados e processá-los, conseguirá-o todo.’

A ameaça acha-se, por isso, em toda parte: segundo estudos de marketind digital, certas empresas estám já a subir ou baixar os preços dos seus produtos em funçom do cliente, analisando os seus cookies, e portanto valorando os seus gostos e poder adquisitivo; companhias como Ditto Labs lança promoçom de produtos personalizados a partir das informaçons tiradas dos ‘selfies’ que as pessoas sobem às redes sociais. E num terreno mais político, o governo Trump anunciou que levará em conta as opinions em Facebook ou Twitter das pessoas que visitam os USA, peneirando assim as entradas no país por critérios ideológicos.

E a esquerda?

Os projectos emancipadores, muito lentamente, começam a considerar o mundo virtual como um palco central da luita polos direitos. Na rede proliferam perfis e projectos activistas que livram batalha pola privacidade e a liberdade. Nom surprende, porque mesmo vozes intelectuais toleradas polo Regime estám, no nosso contorno geográfico, a assinalar os perigos. ‘Na sociedade datificada nom há controlo, e os direitos estám em perigo’, declarou há semanas a filósofa María José Guerra. Um filósofo procedente da esquerda radical, e hoje situado nas coordenadas do ‘constitucionalismo progressista’, Santiago Alba Rico, afirma: ‘quando todo o mundo está a expor os seus segredos em público (sem necessidade de te torturarem, e com entusiasmo), acho que proteger a nossa intimidade seria o mais transgressor que podemos fazer.’