Por José Manuel Lopes /

2017 está a ser importante para a nossa memória de luita; no passado Inverno cumprírom-se 45 anos desde que os obreiros Amador Rei e Daniel Niebla caírom baixo as balas da polícia espanhola nas ruas de Ferrol. Na sua lembrança, e de toda a vaga mobilizadora vivida na altura, celebra-se o Dia da Classe Obreira Galega cada 10 de Março. Resulta menos conhecido entre o grande público, porém, que as grandes mobilizaçons obreiras tivérom a sua continuidade em Vigo em Setembro, e que ainda em Outubro parte dos militantes envolvidos sentavam no banco da acusaçom. Feitos, todos eles, com grande releváncia para o movimento nacional.

Em Ferrol, Bazán livrava umha batalha sostida polo convénio naqueles estertores do franquismo. O convénio dos estaleiros era partilhado com as factorias de Cádiz e Cartaxena; quando à Galiza chega a notícia de que nestas cidades espanholas se assinou um convénio à baixa sem recolher as demadas autóctones, os obreiros ferrolaos decidem um feche indefinido. Trás um desaloxo violento o dia 8, tenta-se um segundo; a impossibilidade de consumá-lo leva à manifestaçom conhecida, apoiada por outras empresas da cidade. A morte de Amador e Daniel, os centos de feridos, os 160 despedidos tam só em Bazán…comoveriam a Galiza.

Crónicas da mentira.

Assim manipulava a polícia espanhola os feitos, num estilo narrativo que ainda emprega na violência dos nossos dias: ‘já desdobrada a força da orde (…) umha enxurrada de três mil indivíduos num área duns 450 metros e aos berros de ‘linchá-los’, ‘a polos assassinos filhos da puta’ lançárom-se sobre a Força guindando grande cantidade de pedras, objectos metálicos, e manexando barras de ferro, paus e armas brancas. (…) Persistindo a multidom no seu ataque com os meios já indicados, produzindo-se vários feridos nas forças, continuou-se o repregamento e disparos de intimidaçom ao ar’. (Informe da 7ª Companhia da Polícia Armada).

ABC, por seu turno, noticia assim as mortes: ‘Trás violência e danos, grupos subversivos enfrentárom-se com força pública. Dous manifestantes resultárom mortos. Dous oficiais e vinte números da polícia armada, feridos’. E justificava assim os assassinatos: ‘um grupo subversivo, ao abeiro dumhas reivindicaçons laborais que sempre tenhem os seus canles muito definidos e de todos conhecidos, para a negociaçom, irrompeu com violência deliberada violando toda norma e fazendo inevitável a atuaçom das forças da orde em defesa da paz dos cidadaos que se sentírom ameaçados’. (ABC, 11-3-1972)

De Ferrol a Vigo.
A solidariedade extendeu-se como umha mancha de azeite e foi enorme em Vigo; Barreras pararia em solidariedade no mês de Maio, aproveitando para colocar as suas próprias demandas laborais. A tensom medrou até Setembro, quando o conjunto das grandes factorias viguesas (Álvarez, Vulcano, Citroen, Freire…) se implicam no paro. Numha medida sem precedentes, Citroen chegaria a fechar em solidariedade com cinco despedidos. As fontes falam de 10000 obreiros e obreiras mobilizadas num Vigo tomado pola garda civil e a polícia armada, e com um papel decisivo de Organizaçom Obreira, secundada pola UPG ou colectivos como ‘Galicia Socialista’. As CCOO e o reformismo espanhol, embora participando, perdem hegemonia nos sectores obreiros.

Fôrom até 6000 as pessoas expedientadas num processo repressivo que leva ao esmorecimento da mobilizaçom arredor do dia 20.

Consequências penais.
Em 27 de Outubro, a magistratura de trabalho viguesa saturaria-se com o macro-processo derivado do despedimento massivo de obreiros. Até 289 pessoas foram despedidas, e 28 eram processadas por ‘desordes públicas e manifestaçom nom pacífica’.

Ainda em 1975, os feitos de Março-Setembro deixavam-se sentir. O dia 1 de Julho sentavam no TOP (actual Audiência Nacional). Baixo os cargos de ‘associaçom ilícita, manifestaçom nom pacífica e terrorismo’, vinte e umha pessoas enfrentavam penas de prisom. Onze delas som condenadas, nalguns casos com penas de até sete anos de cadeia.

A classe obreira na causa galega.
A experiência deixaria um pouso fundo no movimento nacional. O idioma galego começa a ser utilizado com normalidade na luita obreira a partir de entom. Pouco depois dum ano daqueles feitos, José Ramom Reboiras Noia redige o ‘Borrador provisório para discutir sobre das bases dumha organizaçom dos trabalhadores assalariados a nível sindical’. Som os alicerces do SOG, nascido dous anos depois. A sem razom do Estado também determina parte do nacionalismo a optar pola intervençom armada, no que seria o primeiro ciclo insurreccional do independentismo nos últimos 45 anos. O movimento galego, historicamente dirigido pola pequena burguesia inteletual, pareceu decantar-se nestes anos por umha linha mais popular e combativa, antes de ser gorada por umha estratégia reformista baixo os cantos de sereia da ‘democracia’.