Por Íria Veiga (adaptaçom ortográfica do galizalivre) /

Um enorme círculo vermelho e um H maiúsculo, seguido de um signo de exclamaçom. Essa foi a maneira na que contestaram a minha primeira solicitude de uma prova diagnóstica, o meu primeiro dia como médica residente. O pedido punha: “ Inchaçom em membro inferior esquerdo, sem evidência de traumatismo prévio. Solicito descartar fractura”. À radióloga deveu-lhe parecer tam mal aquela falta de H, que nem se incomodou em comprovar um conhecimento que, por outra parte, deveu acreditar para ocupar a sua vaga.

Depois, viriam centos de explicaçons, questionamentos e comentários, quase sempre por parte de colegas, e nom de pacientes. Respondi tantas vezes à pergunta “e tu, por que falas galego?”, que já tenho uma expressom e uma resposta automática preparada. Sempre contesto: “e por que nom?”, com sorriso imperturbável. Que a imensa maioria dos pacientes da minha área falem galego, que quase todo o pessoal o empregue como língua habitual, que me negue a empregar a língua como marca de classe que me diferencia das pessoas às que trato… todos esses nom parecem ser motivos suficientes, nem suficientemente óbvios. Tem que existir outro motivo, oculto e inconfessável, para empregar uma opçom diferente à nom marcada. Apresentar uma sessom clínica ou escrever um relatório de alta, já nom digamos um relatório judicial, em galego, também parecia ir trazer múltiplos problemas, ainda que finalmente nom passava nada.

Possivelmente, nenhuma das pessoas que fazem essas perguntas tenhem uma postura ciente em contra do galego. A radióloga que contestou aquele pedido fizo-o por pura e simples ignorância, nom por malícia. Porém, a pergunta, “por que falas galego?” cobra um significado muito concreto à luz de todos estes detalhes quotidianos. Por uma parte, por que falas galego sendo médica, tendo uma profissom de prestígio social? Quem pergunta tem uma noçom inconsciente de que a língua do conhecimento, da ciência e do prestígio nom é o galego. Por outro, por que falas galego, apesar das múltiplas, pequenas e incómodas travas que te pomos entre todos diariamente? Por que a estratégia de desalento que tam bem funciona está falhando?

Em medicina, trabalhamos analisando sintomas e signos superficiais que desvelam patologias mais profundas. Aquele círculo vermelho era o primeiro sintoma observável de um transtorno com o que todas as que falamos galego luitamos cada dia.

*XIII Premio a artigos jornalísticos normalizadores convocado polo Concelho de Carvalho em 2017.