Markos Gamboa é natural de Gasteiz mas residente atualmente em Dènia, no País Valenciano. Trabalhador agrário e desenhador de sistemas agroalimentários agroecológicos, viviu de perto a desfeita meteorológica que sacodiu a zona, com as suas enormes consequências políticas e sociais. Com ele falamos de mudança climática, gestom do território e possibilidades de enfrentar ameaças crescentes.
Para quem olhamos todo de longe, através dos meios, que ambiente se está a viver no País Valenciano hoje?
Vive-se umha mestura de raiva, de tristura, de impotência, de enfado, e em muitos casos também de ódio. E um medo que paira sobre o ambiente, pensemos que ainda há entre 1500 e 2000 pessoas desaparecidas. Que foi de toda esta gente? E medo polo futuro, toda essa gente que ficou sem morada e sem trabalho, que vai ser dela…o medo parece-me mui determinante, e como sabemos, do medo derivam atitudes distintas. Pode dar num abatimento, numha depressom, e pode dar também em ira.
Essa parte da conca mediterránea está historicamente afeita a fenómenos extremos como estes, mas nesta ocasiom, até que ponto está intensificado pola mudança climática?
Quem emprestar atençom a vozes críticas, daria-se de conta que certos setores, como o decrescentismo, levam tempo a advertir de cenários assim. Claro que há precedentes disto, mas acontece que agora fenómenos como estes som mais frequentes e mais virulentos. Cousas que antes aconteciam, sei lá, cada 500 anos, agora podem dar-se cada 50 anos, e com umha magnitude maior. Olho que é um problema de todo o Mediterráneo, com umha temperatura por cima da média dos últimos séculos, e que virou numha autêntica pota a pressom. Cousas como estas passárom-se em Itália, passárom-se em Líbia… Dizia-o Antonio Turiel há uns dias, reparemos em que estamos ante umha DANA que tinha 200 kilómetros de extensom: que medidas defensivas tomas ante isto?
Estamos num cenário equivalente a umha posguerra, há vilas pequenas nas que ainda nom chegou a ajuda, com velhinhas e velhinhos que nem se puidérom deslocar a apanhar produtos básicos. Tal tensom emocional nom sabemos em que vai dar. Gostava de assinalar, porém, que há umha imensa rede solidária, além das ideologias, de gente que se une e que ajuda.
Em qualquer caso, ante cousas gigantescas assi, cumpre ser muito previsor. Da mudança climática e os seus efeitos perigosos aqui mesmo falou o jornalista Juan Bordera, e deputados de Compromís. Umha semana antes da DANA apresentou um informe sobre o que vinha aí, com resposta institucional nula! É gravíssimo, temos umha extrema direita negacionista, e logo um PSOE, que fora de pintar de verde certas declaraçons, nom move ficha. E repara em que falamos de questons técnicas, de escuitar os especialistas para salvar vidas, nom de questons ideológicas, mas nem assi.
Trabalhas no setor agrário e na gestom sostível do território. Em que medida se relaciona a desfeita com um certo modelo produtivo e urbanístico?
Vivemos numha zona que leva desde tempos da ditadura padecendo umha urbanizaçom selvagem em favor do setor turístico, intensificada nos 90. Zonas imensas foram deflorestadas, terrenos inudáveis construídos, e todo isto complementado com umha agricultura que é monocultura industrial, que nom regenera o solo; paradoxalmente, o volume total de água cada vez é menor; onde eu vivo, passou-se de 700 litros anuais a 300, por exemplo; a seca, em terrenos que em boa parte tenhem alta composiçom de arxila, fai com que o solo vire como betom, e quando vem a chuva torrencial, esta nom se filtra nos aquíferos, senom que marcha a grande velocidade, com enxurradas de até dous metros de altura. Como freas isto? Eu trabalho na comarca de Marina Alta, numha finca e com umha horta, e estamos a apenas 30 kilómetros da zona mais atingida, numha zona cha, perto da praia, se chega a tocar aqui, levaria todo por diante.
Cousas que antes aconteciam, sei lá, cada 500 anos, agora podem dar-se cada 50 anos, e com umha magnitude maior. Olho que é um problema de todo o Mediterráneo, com umha temperatura por cima da média dos últimos séculos, e que virou numha autêntica pota a pressom. Cousas como estas passárom-se em Itália, passárom-se em Líbia…
E qual seria a resposta preventiva possível?
No longo prazo, e eu tento trabalhar um bocado nessa direçom nas minhas achegas, haveria que dar muito forte com a gestom da água, começando por zonas altas, vendo de poupá-la e de mitigar as escorrentias; logo cumpririam outros planos urbanísticos e outro modelo agrícola. Mas todo isto requer enormes somas de dinheiro, recursos e tempo, enquanto o PP continuar, isto nom vai ser possível, fora de planos parciais. Eu agora mesmo trabalho numha equipa que desenha um plano de auto-suficiência alimentar comarcal, de ámbito local…para que isto tiver outra dimensom, cumpriria umha mudança de fundo.
Que papel tenhem a meteorologia e as respostas mais técnicas na evitaçom de desastres?
Penso que a AEMET jogou um papel importante, a meteorologia em geral. O seu papel é advertir, e claro, advertiram. Acontece que a meteorologia nom é umha ciência exata, entom, os informes podem dizer que a situaçom é de perigo, mas nom podem antecipar que vam cair 50 litros aqui, 80 alô. Por isso é miserável a crítica que lhe fam Feijoo ou Mazón, esse tipo de políticos que procuram descarregar responsabilidades e utilizar as vítimas para os seus próprios interesses.
Existe um risco de que este grande shock seja capitalizado pola extrema direita?
Existe, e há essa tentativa. Na semana passada, a ira popular estoupou contra o rei, contra Mazón e contra Pedro Sánchez, mas suponho que vistes as imagens do monarca movendo a mao, e a polícia fazendo um corredor para deixar passar a dous mocinhos que resultaram ser dous membros das juventudes de Vox, um deles com suadoiro da Divisom Azul. Essa imagem di-o todo. Ora, como vai desembocar isto, eu nom o sei. Estamos num cenário equivalente a umha posguerra, há vilas pequenas nas que ainda nom chegou a ajuda, com velhinhas e velhinhos que nem se puidérom deslocar a apanhar produtos básicos. Tal tensom emocional nom sabemos em que vai dar. Gostava de assinalar, porém, que há umha imensa rede solidária, além das ideologias, de gente que se une e que ajuda. E também um fastio, nomeadamente juvenil, com tantas décadas do PP no governo valenciano, e tantos casos de corrupçom e impunidade. Num caso de negligência como este, dum alegado servidor público, que vela polo bem da cidania, Mazón, que se nega a tomar decisons ante todos os avisos, vam-se exigir responsabilidades, e eu acho que mesmo responsabilidades penais.