Antelo pegou na habitual garrafa que utilizava e foi caminhando aos poucos cara a fonte de augas termais que se atopava na vila do lado. Sabia que era um bom método para as manchas que tinha na pele, melhor que muitas pílulas que tinha tomado e que as cremas industriais que lhe agasalharam.

Nom queria limpar apenas a pele, porque no fundo sentia-se sujo por outros motivos. Sem acreditar em superstiçons, si gostava pensar em que algo mágico havia naquela fonte que a evadia de diversas realidades, e imiscuiam-se os seus pensamentos na fluidez da sua corrente, numha espécie de fusom que vinha a ser também a forma de fugir do que nom sabia enfrontar.

Na quotidianidade dalgumhas pessoas solitárias, os pequenos elementos da natureza medram até imiscuir-se no mais fundo da sua realidade: umha livélula pode atrair a ideia dumha grande empresa e umha folha de carvalho caindo a certidume dumha perda inevitável. Antelo nom sabe o que dizer no trabalho para explicar a sua cara gris hoje, Antelo quigera pôr umha máscara para ser um bom recepcionista.

Porque ele mesmo sente-se manchado, espido na cumplicidade do que intui umha realidade sem volta atrás: a normalidade de guerras permanentes e genocídios que já nom é somentes televisada. Antelo vem de deixar o telemovel na fonte, mas foi esquecido com aleivossia? Pudera ser, mas foi apenas um despiste mais no seu dia a dia. Nom pensa em parar na taberna hoje, porque nom quer falar de mais notícias despiadadas e sensacionalistas que, irremediavelmente, partem dumha realidade bem crua. Sabe Antelo que nada é novo nestes universos humanos: de sangue e mais sangue estám construidas as mercadorias que nos arrodeiam, e pouco há que fazer-lhe.

Mira Antelo pola janela e lembra os abraços do seu pai, morto já há uns anos. Que pequenos refúgios existem para enfrontar um mundo verdadeiramente violento, e à vez verdadeiramente naif. Quigera também Antelo hoje ser hoje um pouco mais alcoolico, para sentir-se bem na normalidade.