Ourensao de 1975, Tiago Peres Gonçalves leva toda a sua vida adulta ligado à luita pola língua, à que aderiu através do seu inicial compromisso juvenil independentista. Autor dumha “Breve história do reintegracionismo” (Através 2014) e sócio de AGAL, recentemente vindicou num artigo de opiniom as posiçons lingüísticas precursoras de Antonio de la Iglesia. Com ele conversamos de teoria e açom num momento crítico para o idioma, logo de enormes mudanças sociais que reconfiguraram as noçons de movimento e militáncia.

Podes comentar-nos, para começar, como nasceu o teu compromisso com a Galiza?

A minha trajetória parece-se muito com a de muitos moços e moças dos 90. Procedo dumha família numerosa da classe obreira, com raízes rurais, e ao estudar no liceu dam-se duas coincidências. Primeiro que tenho professores galeguistas e reintegracionistas, como tanta rapaziada daquela, e também que dous amigos meus da altura, Xavi e Marcos, participam da fundaçom da AMI, à que logo me incorporo. Somos daquela geraçom que se forma com publicaçons como a “História da língua em banda desenhada”, e que entra em contato com o reintegracionismo de base. Existia a AGAL, mas nós viamo-la como umha instituiçom um bocado elitista, inteletual, entom damos o passo e integramo-nos no Grupo Meendinho, muito ativo em Ourense, e mais adiante no MDL.

Como recordas aquela dinámica ativista?

Muito boa, muito intensa. Viramos militantes de 24 horas, muito apegados à rua: organizávamos os maios, púnhamos faixas na rua chamando a festejar em galego, aginha começamos a editar o boletim Gralha, que nasceu como boletim linguístico, e logo vira numha espécie de vozeiro do incipiente movimento de libertaçom nacional, ligado com a auge da AMI. Lembro também positivamente o carácter plural de Meendinho, ali conheço pessoas como José Manuel Aldea, Beti Árias, Carlos Garrido…

Viramos militantes de 24 horas, muito apegados à rua: organizávamos os maios, púnhamos faixas na rua chamando a festejar em galego, aginha começamos a editar o boletim Gralha, que nasceu como boletim linguístico, e logo vira numha espécie de vozeiro do incipiente movimento de libertaçom nacional.

Também fas os teus contributos teóricos ou inteletuais, certo?

Bom, eu nom me considero nem de longe um especialista. Mas fago incursons, eu ao primeiro começo a estudar Direito, mas logo escolho História, o que me leva à minha profissom atual, som docente. A minha formaçom e o meu conhecimento do movimento leva-me a redigir a “Breve história do reintegracionismo” e a umha pesquisa sobre a direita galeguista em Ourense ainda inédita.

Recentemente líamos no PGL um artigo teu sobre Antonio de la Iglesia que revelava posiçons nom muito conhecidas sobre o autor, mesmo no galeguismo…

Si, é umha figura injustamente ensombrecida por outros autores mais famosos, como Rosalia ou Curros. É um homem que pertence à segunda geraçom do Liceo de la Juventud, e é dos plenamente volcados a construir um repertório inteletual para construir a naçom galega. Foi um dos organizadores dos primeiros Jogos Florais na Corunha em 1961. A achega central deste homem é a sua vindicaçom da literatura medieval, nomeadamente os textos de Afonso X O Sábio. O seu é um chamado a voltar às raiganhas do idioma. No século XIX, o século das naçons e do nacionalismo, também do galego e do espanhol, a descoberta das cantigas é um fito para começar a a afirmar que o galego e português som duas polas do mesmo tronco.

Imagem: Tiago Peres numha bancada de material do MDL em Portugal a finais dos
anos 90. Imagem: Tiago Peres

Parece haver um certo reintegracionismo declarativo no século XIX que nom tivo plasmaçom ortográfica, concordas com esta ideia?

Concordo. É um reintegracionismo retórico, com o objectivo central de prestigiar um idioma desconsiderado socialmente, que se pretende retornar à alta cultura. Mas fica aí, como muito chega-se a escrever em grafia etimológica, com os dígrafos “g” e “j”, mas nom é até o século XX quando damos com posiçons mais concretas e avançadas. O paradigma será o arredista Ricardo Flores, militante da Sociedade Nacionalista Pondal, que dá o passo de escrever numha norma que nos recorda muito à norma de AGAL do século XX.

Fixeche um estudo panorámico do reintegracionismo. Para umha pessoa pouco familiarizada com esta proposta, poderias-nos sintetizar as suas linhas mestras após 1936?

Tudo nasce dum ermo, o ermo que deixou 1936 no galeguismo, que leva a que, na reconstruçom do galeguismo, os interesses centrais, por razons de contexto, sejam outros. Quando Galáxia acomete a construçom dum galeguismo só cultural, no plano da concepçom da norma já se age com vontade simplificadora e popularista; quem pensam noutras chaves sobre a escrita e orientaçom do galego som apenas figuras isoladas, estou a pensar em Paz Andrade ou Guerra da Cal. Umha figura importante desta jeira de indefiniçom é o português Rodrigues Lapa. Eu puidem estudar a sua correspondência com os galeguistas, depositada na Penzol de Vigo, e vim a sua evoluçom. Nas suas cartas sempre pedia aos galeguistas textos originais dos autores históricos, para certificar que eles escreviam com lealdade à ortografia etimológica. Logo Lapa dá o passo de apostar sem ambages por umha confluência ortográfica galego-portuguesa, e isso já supom a ruptura com o pinheirismo. À margem desta controvérsia, logo vemos com que pequenos grupos isolados, sem filiaçom orgánica, chegam às mesmas conclusons sobre a unidade galego-portuguesa. Falo do grupo de Roma, os chamados irmandinhos, o grupo de galegos de Londres…som individualidades ainda sem organizar-se.

Tu já vives outra fase do movimento, plenamente orgánica, verdade?

Eu vivo, na juventude, a reaçom a umha derrota: a reaçom à aprovaçom das normas oficiais do ILG-RAG leva à necessidade de organizar-se, primeiro num ámbito mais académico, como o da AGAL ou da Associaçao de Amizade Galiza-Portugal, ou logo, como dizia, no reintegracionismo de base, que já é um pequeno movimento social logo nucleado no MDL, e que segue a lançar cabeçalhos como o Novas da Galiza.

Que permaneceu ao teu ver de aquele movimento?

É difícil a comparaçom…os tempos mudaram tanto! Vínhamos dumha militáncia de 24 horas que nom existe, umha participaçom muito física, de rua, ligada àquela famosa tríada pintada-cartaz-colante; hoje as relaçons som mormente tecnológicas. Permanecem estruturas, aí está o Novas, aí estám os meios de comunicaçom reintegracionistas, a própria AGAL. Mas si, boto em falta mais trabalho de base polo idioma.

És pessimista?

Nom, nom o som, e o pessimismo parece-me contraproduzente para avançarmos. Mas faltam ferramentas de socializaçom do reintegracionismo originais e ambiciosas, como a História da língua que falávamos, logo a História da Galiza…certo que se editou umha banda desenhada sobre Carvalho Calero, seguírom a fazer-se cousas, mas fam-se num mundo diferente, que pivota arredor de telemóveis e redes sociais, e as cousas tenhem outro impato.

Eu vivo, na juventude, a reaçom a umha derrota: a reaçom à aprovaçom das normas oficiais do ILG-RAG leva à necessidade de organizar-se, primeiro num ámbito mais académico, como o da AGAL ou da Associaçao de Amizade Galiza-Portugal, ou logo, como dizia, no reintegracionismo de base, que já é um pequeno movimento social logo nucleado no MDL

Imos com a tua realidade como docente em relaçom ao idioma. Os dados falam por si sós, e porém há quem aponte, por exemplo, que a abertura ao português em ensino médio, por parte do alunado, é maior que há décadas.

Nom concordo. A minha experiência nom é essa. Obviamente, se leccionamos português como umha língua estrangeira, a atitude é neutral, como ante qualquer outra língua. Ora, se apontamos que essa língua e a galega som a mesma, com as consequências ortográficas que se derivam, a hostilidade é manifesta. Eu dou aulas em Vigo, e a minha percepçom, nom podo dizê-lo de outro modo, é que a situaçom é dramática. Mesmo certos usos do galego ritualizados nos centros começam a desaparecer: falo dos discursos de graduaçom, a cartelaria, comunicados…aliás dá-se um fenómeno curioso, o de certos rapazes e rapazas simpatizantes com o galego que nom se passam a falá-lo, nem tam sequer com docentes galego-falantes, atitude que na nossa época seria impensável.

Estamos a falhar, como galeguismo no seu conjunto, ou som dinámicas imparáveis as que conduzem para isto?

Responder a isto é muito complexo, mas eu penso que existem dinámicas estruturais que se nos escapam, e nom temos umha base social muito ampla para as reverter.

Se leccionamos português como umha língua estrangeira, a atitude é neutral, como ante qualquer outra língua. Ora, se apontamos que essa língua e a galega som a mesma, com as consequências ortográficas que se derivam, a hostilidade é manifesta.

Porém, vemos que há milhares que se manifestam polo galego cada ano, por exemplo na mobilizaçom do 17 de maio.

Si, hai-nos, mas isto nom leva a mudanças no dia a dia, eu esta realidade nom a topo no trabalho quotidiano. Nos centros de ensino urbano, o galego é mais umha matéria para o alunado, concebida como umha língua estrangeira, e nalguns sectores aliás há rechaço aberto. Acho que a diferença com a nossa época é que nós tínhamos relaçom com a realidade galega, avôs, pais e maes galegofalantes, diglóssicos mas galegofalantes. Agora, para eles a galeguidade é algo distante.

Coincide-se na dureza dos tempos, e no entanto florescem iniciativas como a Semente, que há duas ou três décadas nem nos atrevíamos a formular…

Nesse ponto nom há dúvida. O modelo Semente é o único que garante a transmisom da língua nos espaços urbanos. Falo por experiência. Tenho um filho, com a fortuna de a minha parelha ser portuguesa, e escolarizamo-lo na Semente nos primeiros anos. Sem saber umha palavra de espanhol, às poucas semanas de emtrar no ensino dito público já se passara ao castelhano. Tenho claro que o futuro da transmisom nos espaços urbanos está nesse modelo.