“Israel resgata quatro reféns numha operaçom militar; as autoridades de Gaza dim que morreram dúzias”; cabeçalho do “New York Times” do sábado 15 de junho
Trata-se dum cabeçalho mesmo se nom se sabe nada das táticas propagandísticas que se utilizam nele. A primeira metade é mui clara, enquanto que a segunda é ininteligível e lê-se como umha adivinha estranha ou sopa de letras. O jornal mentado leva a cabo esta estranha e críptica ginástica lingüística para falar do último massacre israeli em Gaza, que no momento de escrever este artigo provocou 236 mortos.
De início podemos vera algo estranho no cabeçalho, a empregar a palavra “dúzias” para descrever o número de pessoas que, segundo os informes, morreram no massacre. O próprio artigo que citamos diz que se informou de que “mais de 200 pessoas morreram no centro de Gaza”, polo que o quantificador certo para o cabeçalho seria “centos”, nom “dúzias”. Seria como se um cabeçalho dixesse que no 11-S morreram “dúzias” de pessoas no canto de “centos”; tecnicamente ia ser correto, já que matematicamente falando, morreram muitas dúzias, mas ia dar aos leitores umha impressom errada do letal que foi o atentado.
A seguir, reparemos no súpeto cámbio a metade do cabeçalho de voz ativa, segura, a voz passiva, duvidosa. Quatro reféns israelis foram resgatados definitivamente por Israel, enquanto as autoridades de Gaza afirmam que morreram dúzias deles. Dúzias de que? Gatos? Pitas? Israelis? Mortos por que? Envelenamento por salmonela? Acidentes de tránsito? Milícias congolenhas? Nom há forma de sabê-lo polo cabeçalho.
A mídia em geral, e “The New York Times” em particular, som famosos pola sua linguagem passiva nos cabeçalhos: “um meninho palestino deixa de respirar após receber umha bala”, quando promovem os interesses informativos israelis, mas o que na verdade chama a atençom é que se passe dumha linguagem humana normal a algumha cousa que sona como umha adivinha no mesmo cabeçalho.
Na verdade, nada do que fixeram aqui os editores do jornal é tecnicamente mentira; cada palavra cuidadosamente selecionada para o seu cabeçalho é tecnicamente certa, mas está formulada de tal jeito que desvia a atençom do leitor do feito de que Israel vem de massacrar centos de seres humanos. Poderiam ter escrito com a mesma facilidade: “Israel mata centos de palestinos num ataque no centro de Gaza; 4 reféns resgatados”, e teria sido igual de certo, mas entom a atençom do público teria ido na direçom oposta. O “New York Times” endejamais atrai a atençom do público nessa direçom; o sesgo apenas vai numha direçom.”
Muita gente que se mostra cética ante os meios de comunicaçom de massas assume certamente que som serviços de propaganda do império estadounidense, mas assumem incorretamente que isto supom que mintem o tempo todo. Na realidade, a maquinária de propaganda imperial é muito mais sofisticada do que isto, e muito mais eficaz.
No canto de inventarem mentiras de todo tipo e de perderem a credibilidade toda ante a opiniom pública, a mídia basea-se geralmente em distorsons, que manipulam a percepçom sem incorrerem tecnicamente na mentira. Porám ênfase nas áreas que beneficiam o império, omitirám factos inconvenientes, utilizarám frases capciosas, informarám acriticamente sobre as afirmaçons dos funcionários governamentais favorecidos enquando afirmam que as afirmaçons dos funcionários governamentais desfavorecidos se fam sem provas; mencionarám novas convenientes umha e outra vez, e informarám de histórias inconvenientes apenas umha vez antes de deixarem que se perdam no fluxo diário de notícias.
De facto, cito abondo a mídia de massas no meu próprio trabalho, desde que muita informaçom útil e veraz sobre a criminosidade do império ocidental vem à tona através de meios de comunicaçom como o que estamos a analisar. O que acontece é que essa informaçom se esvai e arreda-se logo da atençom pública mediante os propagandistas a dirigirem esses meios, o que lhes permite dizer a verdade sem deixar de manipular a narrativa geral sobre o que acontece no mundo.
Os propagandistas que dirigem meios como este som quem de sesgar a percepçom pública a prol do império, ao entenderem que a experiência humana está dominada polos movimentos da atençom; deste jeito, se podem manipular esses movimentos da atençom, podem manipular a forma em que a gente percebe o mundo.
Umha vez conhecim umha pessoa que descreveu a atençom como “o rei sem coroa da consciência”, e recordo essas palavras amiúde pola sua extatitude. A atençom é rei sem coroa da consciência, dado que os seus movimentos ditam como imos experimentar o nosso mundo: que imos pensar, notar, ver, ouvir ou perceber de outro jeito; mas nom adoitamos dar-lhe muita importáncia nem reconhecer até que ponto a nossa vida está regida por ela.
(…)
Quando umha pessoa morre, a gente soi falar das cousas que fijo na vida -os seus logros, o seu legado, quantos filhos criou, a que se devotou -, mas na verdade o tipo de vida que viviu alguém tem menos a ver com as cousas que fijo que com a forma em que se moveu a sua atençom. Os movimentos da sua atençom ao longo da vida foram realmente a substáncia desta, já que determinaram qual foi realmente a sua experiência do seu tempo neste mundo; como de presentes estavam nele. Quanta beleza experimentaram. Quanta energia mental esbanjaram em parvadas imaginárias. O que notaram, e também o que perderam.
A nossa percepçom do mundo está dominada polos movimentos da nossa atençom, o que supom que a nossa percepçom do mundo pode mudar-se ao se manipularem tais movimentos. Os propagandistas entendem isto, polo que botam o seu tempo a nos dizer cousas, como o mau que é Vladimir Putin, enquanto que apenas ocasionalmente mentam, mitigando muito, um caso individual de crimes israelis; ou falando umha e outra vez do 7 de outubro, enquanto restam importáncia aos massacres que Israel leva perpetrando contra os palestinos em Gaza todos os dias desde aquela.
Isto fai com que a atençom pública se mova em direçons que beneficiam os interesses informativos do império e se arrede das direçons iriam prejudicar tais interesses informativos, todo isso sem ter que dizer mentiras reais. A percepçom que a gente tem do mundo é emoldurada por estes hábeis propagandistas, sem nem sequer serem cientes do que está a acontecer.
Isto é o que fai com a que a propaganda do império ocidental for muito mais eficaz que qualquer outra propaganda que tiver existido nunca em algures: os habitantes do império ocidental nom tenhem nem ideia de estarem a ser manipulados.
*Versom na íntegra deste artigo publicada em Caitlin Newsletter. Traduçom do Galiza Livre.