Para este Domingo Cultural presentamos a série de poemas Ardora, que reflexionam sobre a vida das vilas à beira do mar. A sua autor é Iris Carro González, colaboradora do portal, vezinha de Ames, integradora social e poeta. Tem um livro publicado, com o título de “Antártida”, e resultou premiada en certames literarios como o Francisco Anhom (accésit 2019) e no Díaz Jácome (no 2014 e no 2017).


Ardora

1

Navegantes sem porto

sentam na proa do navio

aguardando que se agoche o sol

na imensidade

semelham peons imersos no xadrez existencial

que esqueceu as praias virgens

os peiraos antigos

a calma desses tempos que uliam a mar

o sesseio e tradiçom

a memória viva

a redes enchoupadas de língua salgada

a rapazes sonhando com ir à bateia

e progressar em vilas varadas no tempo

2

Arribarei com a minha gamela herdada

no peirao no que me refugio

da chuvascada próxima

só ali pode ler-se nitidamente na barca

“utopia”

a praticidade afogou o idealismo.

sentencia um velho marinheiro que sonhava cum Gram Sol

que o guiasse mais ala do porto

e o levasse até terras do interior

cheias de carvalhos e castinheiros

a ele que nunca gostou de navegar

3

O navio fusiona-se com as ondas de salitre

num seram em tons alaranjados

no que as horas desvaidas

desprendem-se do tic tac do relógio

fica entom imperturbável a quietude

um tempo sem fim

para abraçar a alegria

de coexistir na beleza

dos nossos dias

4

As que vam

na procura do tesouro marinho

sorteiam a força das ondas

com a dificuldade de enfrontar-se

às inclemências do bravo mar

queixaram-se logo na praça do mercado

de que caro vai

mentres vem desde o sofá na TVG

como arriscam a vida as percebeiras

cavilando quanto subirá o preço no Nadal

5

A nossa singradura

recorrerá cada um dos oceanos

afondará no mar aberto

retornará com as garrafas sem mensagem

com as línguas forâneas de algumha tribo

volverá logo de visitar terras remotas

amando os vales afundidos

as rias com nome

as terras com marcos e espantalhos

a fermosa língua mãe

apertaremos a fala da terra da água

na que chove, chuvisca e arroia.

Na que contra todo prognóstico

sempre sai o sol