Por Beatriz Gimeno (traduçom do galizalivre) /
Que é o que nos perturba de homes cooperantes em Haiti terem contratado prostitutas? Essa pregunta convida-nos a debater com mais tranquilidade e complexidade sobre a prostituçom como privilégio masculino
Este é um artigo difícil de escrever e que duvidei até o fim em publicar. Há assuntos sobre os que aínda nom somos quem de debater com serenidade. Este é um deles. Mencionei-no o outro dia num dos meus cursos e puidem assim discuti-lo com as estudantes, que me ajudam muitas vezes a focar as cousas e que me oferecem sempre perspectivas interesantes. O que estivemos a debater é o escándalo sexual em Oxfam e a subseguinte sequência de escándalos em outras ONG que, por outra parte, nom som novos e som de há tempo conhecidos. Que sentimos como feministas ante o comportamento dos cooperante de Oxfam, que parece que é habitual noutras organizaçons? Pois aparentemente, parece que houvo unanimidade na condena, assim como também em que nom falamos de maçás podres, senom de que o machismo está profundamente arreigado nos membros masculinos de ditas organizaçons.
E é aqui onde quero abrir o debate. Lim com muita atençom o que se passava em Haiti e nom é doado tê-lo absolutamente claro porque as informaçons nom o esclarecem. “Escándalo, abusos sexuais, orgias”… nom permitem fazer-se umha exacta composiçom de lugar. Mas polo que puidem entender, e ao menos em Haití, as mulheres nom forom violadas e nom eram menores: eram prostitutas. E é aqui onde na minha aula xurdiu o debate: Nom tenhem direito as haitianas a ser prostitutas? Som os cooperantes mais machistas que os demais homes ou, simplesmente, som os mesmos homes fazendo o mesmo aqui que alô? Que é o que nos parece mal? Que os homes fagam nos países nos que houvo um terremoto o mesmo que fam aqui ou noutros países igualmente pobres mas sem catástrofes? Ou é o feito de serem cooperantes, que se supom que vam ajudar? Nom se pode ajudar e ser putanheiro? Que fasquias do eterno debate sobre a prostituçom quedam ao descuberto com estas perguntas?
O que estes homes fixérom em Haití, livres seguramente dos condicionamentos que todas e todos temos quando estamos mergulhados na vida quotidiano (família, amigos, trabalho, etc.) foi o que fam milhons de homes em todo o mundo: contratar putas. E a um sector do feminismo isso nom lhe parece mal; e é esse sector o que opina que nom há que estigmatizar ao cliente (lembremos as reacçons ao vídeo de Towanda Rebels) Por que entom cumpre que estigmatizar estes putanheiros em concreto? Em que se diferenciam dos executivos, obreiros, médicos… que vam trabalhar a um país pobre (ou aqui mesmo) e contratam putas nos seus tempos livres depois de um duro dia de trabalho solidário ou simplesmente remunerado?
De acordo cos argumentos que adoitam utilizar quem nom acham nada mau nesses comportamentos, estas mulheres fixérom umha escolha racional dada a situaçom na que estavam, com o dinheiro ganhado alimentárom aos seus filhos e filhas, arranjárom as suas moradas, mercárom roupa ou puidérom pagar um médico para um parente. Elas tivérom essa opçom e aproveitarom-na. Em certo sentido, quem sabe, forom umhas privilegiadas que puidérom ganhar um dinheiro que outras nom puidérom, aínda que o precisavam da mesma maneira.
De feito, nom sabemos se estas mulheres eram prostitutas já antes do terremoto, que nos fai pensar que nom é assim? Falamos com elas? Em todo caso, o que é muito possível é que nom foram especialmente mal tratadas: seguramente os cooperantes tivérom tino em nom zoscar-lhe nem matá-las, um cuidado que nom tenhem muitos putanheiros no mundo. Entom, que é o que nos parece mal, o que nos parece machista… é que ditas mulheres eram especialmente vulneráveis? A nossa opiniom sobre o uso das mulheres por parte dos homes na prostituiçom depende únicamente da vulnerabilidade destas? Porque a vulnerabilidade das mulheres é umha característica da prostituiçom. No Estado Espanhol há mulheres em prostituiçom vidas de zonas de conflito, refugiadas que pagárom com múltiplas violaçons (ainda em muitos casos também “consentidas”) a sua chegada aqui; há mulheres chegadas de zonas de fome e, em todo caso, todas elas precisam esse dinheiro. Por que aqui nom parece machista contratá-las?
Que fai diferente contratar umha prostituta em Haiti ou em Camboia? Que houvo um terremoto? O uso da prostituçom parece-nos mal depois de umha catástrofe mas nom se tal catástrofe nom acontece? Depois de umha guerra si, mas sem guerra nom? E se é umha crise económica? E se é um país estructuralmente pobre? Entom, os consumidores que viajam às zonas mais pobres do planeta no que se chama turismo sexual, parece-nos bem ou mal? Para que o uso prostitucional das mulheres nos pareça nom machista, tem que exercer-se em situaçons nas que exista um mínimo de bem-estar? Fazemos um exame de vulnerabilidade às mulheres antes de julgarmos se o acto em si é ou nom machista? Quiçá tem a ver com que nos parece que os cooperantes nom deveriam ser machistas e deveriam ser homes igualitários com um certo estándar ético superior aos demais homes. Entom, estamos a assumir que os homes que utilizam a prostituiçom som machistas? Que há algumha cousa que nom é ética na sua utilizaçom? Que há algumha cousa intrinsecamente machista na utilizaçom da prostituiçom? E se isto é assím… porque razom nom deveríamos as feministas assinalá-lo?
Já sei que existem mais fasquias, como que poderiam ser –algumhas delas- menores (aínda que parece que no caso de Haiti nom o eram). Estaríamos esquecendo nesse caso que os homes viajam a países pobres, cada vez em maior número, na procura, precisamente, de nenas e moças menores; e estaríamos esquecendo que aquí mesmo há muitas menores em prostituiçom, cada vez mais, como denunciárom reiteradamente as organizaçons que trabalham sobre o terreno, e isso nom nos escandaliza e tampouco nos fai apupar os putanheiros (volvo lembrar o vídeo de Towanda). Em definitiva, mais bem parece que os cooperantes de Haiti eram homes normais e correntes, putanheiros como milhons, que fixérom alô o que fam nos seus países. E parece também que as mulheres de alô e as que som prostitutas noutros lugares também som parecidas, pobres, vulneráveis e com as opçons que o patriarcado deixa às mulheres pobres: a prostituiçom sobre todas elas. Que é exactamente o que nos perturba entom deste caso? É a prostituiçom, som os cooperantes, é que eram muito pobres, é que houvo um terremoto?
Creio que a única diferencia é que neste caso vê-se muito claro o que é verdadeiramente a prostituiçom, o que é sempre, mas o que amiúde nos costa ver porque se nos apresenta agochada por trás de múltiples ecrás ateigadas de argumentos publicitários; neste caso vê-se de umha maneira gritante a diferença de poder que é consubstancial a dita instituiçom, a diferença de estatus, o racismo implícito, e sobre todo, o machismo que é indissociável da transacçom. Independentemente da maneira em que cada umha de nós opinar acerca de qual é a maneira ajeitada para mudar este estado de cousas, independentemente de se ver como um mal absoluto ou um mal menor transitório… temos algo que ganhar como feministas na defesa ou naturalizaçom deste privilégio masculino? Ajuda ou prejudica o feminismo e à igualdade que todos os homes do mundo independentemente da sua raça, origem, nível económico ou estatus, saibam dende o momento em que adquirem conciência pôr preço ao corpo das mulheres? É feminista ou ajuda à igualdade nom combater essa realidade, essa ideia? Seguimos sem questionar esse privilegio masculino? Podemos assinalar aos que fam uso do mesmo ou nom podemos? Deixamos de umha vez de pensar em termos de práticas individuais e começamos a pensar em estruturas sociais, em instituiçons… como, por certo, somos capazes de fazer com qualquer outra instituçom patriarcal agás com esta? Essas som cousas que creio que temos que debater com mais tranquilidade da que empregamos normalmente. E som cousas que temos que enxergar, cada umha de nós, despojando-nos de prezuízos e ideias construídas ou mal construídas; que há muitos interesses por trás, interesses económicos e interesses de género.
*Publicado em Píkara.