A causa militar que justificava o assassinato em 1936 de Maria Vázquez assinalava-a como ‘elemento peligrosísimo’. Com este termo os fascistas referiam-se a muitos dos seus inimigos políticos; alguns deles recorreram às armas para defender-se no golpe de Estado, mas muitos e muitas outras (como o caso que nos ocupa) nunca empunharam um fusil. E ainda, apesar do seu pacifismo praticado e declarado, para o novo regime eram, com efeito, ‘elementos peligrosísimos’. As suas ideias e as suas atitudes abanavam os privilégios de classe, nacionais e religiosos que fundavam o Estado espanhol. Imos ver hoje o desafio ao poder que sostivo Maria Vázquez, feminista, socialista e docente comprometida, injustamente esquecida.

Nasceu em 1895 na capital da Galiza, quando a Restauraçom vivia os seus momentos de consolidaçom: turnismo de partidos e engrenagem caciquil, Estado ferreamente centralista e fundas desigualdades. O socialismo estava ainda a nascer, e o anarquismo demoraria ainda três lustros em se vertebrar na CNT.

Maria Vázquez Suárez procedia dumha família relativamente abastada, pois era filha do militar e empresário Joaquín Vázquez, natural de Sober, e de Andrea Suárez, cantineira. Superando as limitaçons impostas polo papel adjudicado à mulher naquela altura, acada o título de mestra com apenas dezoito anos. Em 1918 é destinada para umha escola na Póvoa do Caraminhal; na altura, e de maneira parelha ao tortuoso acesso da mulher à vida pública, as forças populares ganham peso em todo o Estado espanhol: o movimento obreiro organiza poderosas greves no que foi chamado ‘triénio bolchevique’; o galeguismo passa a chamar-se ‘nacionalismo’ desde a assembleia de 1918, e na Catalunha, o movimento nacional e as suas demandas começa a causar sérios quebrantos ao Regime.


Em 1929 Maria Vázquez consegue a sua vaga docente em Minho, nas Marinhas; nesta comarca tam cercana à Corunha, recebe a influência de Maria Barbeito, a grande representante galega do movimento de regeneraçom pedagógica que activava a República. Maria compaginou o seu envolvimento em actividades educativas inabituais na altura, sem distinçom de classe social, e a sua implicaçom no movimento socialista. Em 1933 temo-la fazendo parte da agrupaçom do PSOE de Minho, e como filiada da secçom de ensino da UGT. Impartia palestras, fazendo gala de grandes dotes de oradora, ocupava o primeiro plano da actualidade, e predicava o ateísmo, num lustro em que a igreja católica via perder, como nunca antes, a sua hegemonia ideológica. Em 1934, ante o falecimento da sua mae, organizara umha cerimónia fúnebre alheia a qualquer rito católico. Este fora um dos feitos que os carrascos iam assinalar mais tarde para justificar a sua morte.

Nos primeiros dias do golpe de 1936, Maria Vázquez é detida na Corunha e logo deslocada à cadeia de Pontedeume, onde padece selvagem tortura, e sofre incomunicaçom completa. Com a sanha mostrada neste tipo de casos, os carrascos obrigam-na a assinar, em 14 de agosto, um documento em que é destituída como mestre. Uns dia depois decidem-se a assassiná-la numha praia de Minho, sem juízo prévio. A defesa do ‘ateísmo, o amor livre’ e a sua ideologia ‘comunista’ condenárom-na à morte, e somárom o seu nome à longa lista de professoras, sindicalistas, guerrilheiras, dirigentes agrárias ou mesmo alcaldesas que sofrêrom a ira fascista.

*Este artigo foi redigido com os dados fornecidos pola entrada ‘Maria Vázquez’ do Album das Mulheres do Conselho da Cultura Galega.