De acordo com todas as estimativas, Pedro Castillo venceu o segundo turno das eleiçons presidenciais, mas sua adversária se nega a reconhecê-lo, e muitos temem um golpe, já que as tensons poderiam aumentar com o apoio da direita leal do Peru e do recém-nomeado embaixador dos Estados Unidos.
Pedro Castillo, do partido Perú Libre, já começou a receber felicitaçons de todo o mundo. Nom há dúvida de que ele ganhou as eleiçons presidenciais do dia 6 de junho. A Autoridade Eleitoral peruana (ONPE) anunciou os resultados finais: Castillo tivo 50,127% dos votos (8,84 milhons de votos), enquanto Keiko Fujimori, a sua oponente no segundo turno polo partido Fuerza Popular, tivo 49,893% (8,78 milhons de votos). Isto com 100% dos votos computados. Nitidamente, Fujimori perdeu as eleiçons.
No entanto, Fujimori negou-se a reconhecer a derrota. Inclusive contratou os melhores juristas do Peru para contestar os resultados eleitorais. Poucas horas depois da divulgaçom das contagens eleitorais, a equipe de Fujimori apresentou 134 impugnaçons dentro do prazo previsto; outras 811 estám em andamento.
Vínculos e lawfare
Qualquer um que conheça a fraternidade jurídica peruana perceberá que alguns dos nomes mais importantes estám na lista de Fujimori: Echecopar, Ghersi, Miranda & Amado, Payet, Rey, Cauvi, Pérez, Rodrigo, Elías & Medrano, Rubio Leguía Normand, Rebaza, Alcázar & De las Casas. Só em Lima, a equipe tinha mais de trinta advogados trabalhando.
A equipe fujimorista reuniu esses advogados antes da votaçom, prevendo a possibilidade de uma vitória de Castillo e a necessidade de amarrá-lo nos tribunais. O exército de advogados de colarinho branco pujo em marcha uma estratégia de lawfare racista; todo o seu jogo consistiu em invalidar os votos que constituem o núcleo da base de apoio de Castillo, ou seja, as comunidades indígenas do Peru.
Os Estados Unidos nomearam uma nova embaixadora no país. O seu nome é Lisa Kenna, ex-assessora do Secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, veterana de nove anos na Agência Central de Inteligência (CIA) e funcionária da Secretaria de Estado estadunidense no Iraque. Pouco antes das eleiçons, a embaixadora Kenna publicou um vídeo em que falava dos estreitos laços entre os Estados Unidos e o Peru e da necessidade de uma transiçom pacífica de um presidente a outro. A “transiçom presidencial é um exemplo para toda a regiom”, declarou, como se antecipasse um sério desafio. Se alguém sabe de ingerências no processo eleitoral na América Latina, som os Estados Unidos.
Mais colaboradores próximos aos EUA
Também há membros-chave dentro da equipe de Keiko Fujimori, como Fernando Rospigliosi. Ex-ministro do Interior do presidente Alejandro Toledo, Rospigliosi se uniu à equipe de Fujimori precisamente para este tipo de disputa (durante anos, havia sido muito crítico com os crimes cometidos por Alberto Fujimori, que agora cumpre pena de prisão). A colaboraçom com a embaixada dos Estados Unidos está no currículo de Rospigliosi.
Em 2005, o ex-militar de esquerda, Ollanta Humala, participou da corrida presidencial. Todos os indícios indicavam que Humala, que tentara um golpe de estado contra o pai de Keiko Fujimori em 2000, tinha um apoio massivo. Alguns inclusive pensaram que Humala seguiria tanto Hugo Chávez como Evo Morales, levando o Peru em direçom à esquerda. Nessa época, Rospigliosi foi à embaixada dos Estados Unidos para buscar apoio e evitar a vitória de Humala em 2006.
Em 18 de novembro de 2005, Rospigliosi e o ex-diretor de Defesa Nacional, Rubén Vargas, fôrom à embaixada para almoçar. Mostrárom a sua “preocupaçom pelas perspectivas de que o ultranacionalista Ollanta Humala se estabeleça como uma força política a ser considerada”. Tanto Rospigliosi como Vargas trabalhavam para uma ONG chamada Capital Humano e Social (CHS), que fora contratada pela Seçom de Aplicaçom da Lei e Assuntos de Narcóticos (NAS) do governo estadunidense. Tanto Rospigliosi como Vargas pedírom à embaixada dos EUA que instasse sua contratada de comunicaçons, a empresa Nexum, a “monitorar a cobertura de Humala e promover notícias e comentários anti-Humala nas regions cocaleiras”. Queriam que a embaixada estadunidense utilizasse os seus consideráveis recursos para miná-lo. Tratam-se de truques sujos à moda antiga.
Os Estados Unidos estavam preocupados por Humala, polas suas declaraçons contra a presença militar dos Estados Unidos no Peru e seus vínculos com Hugo Chávez. O que Rospigliosi e Vargas lhe dixérom à embaixada estadunidense agradou-lhes. Humala perdeu as eleiçons em 2006. Ganharia em 2011, vencendo Keiko Fujimori; mas em 2011 já se estabelecera como um candidato dos neoliberais, alguém que os Estados Unidos viam como inofensivo e útil. Em 19 de maio de 2011, Humala assinou um texto que o vinculava à agenda neoliberal (“Compromisso em Defesa da Democracia”). Na reuniom, ganhou a bençom do padrinho da direita peruana, o romancista Mario Vargas Llosa.
Vargas Llosa é uma figura-chave aqui, utilizando o prestígio do seu Prêmio Nobel de Literatura de 2010 como respaldo. Quando se soubo que Pedro Castillo ganhara o Peru rural, Vargas Llosa menosprezou os eleitores das zonas rurais; alertou que o Peru viraria a Venezuela e que seria uma catástrofe para o país. Submerso na bile do racismo, Vargas Llosa juntou-se a outros intelectuais da extrema-direita para menosprezar a classe trabalhadora e o campesinato peruano, esperando que tais comentários dessem cobertura suficiente ao processo golpista em curso dentro da ONPE.
Em alerta
Todo parece estar preparado: o embaixador dos EUA com credenciais da CIA, um homem de truques sujos com o costume de ir à embaixada em busca de ajuda e com um histórico de pedir aos EUA que difamem a esquerda, um idoso com alergia ao seu próprio povo, e umha candidata cujo pai foi respaldado pela oligarquia quando deu um autogolpe em 1992.
Pedro Castillo continua cuidando das ruas. As multidons reunem-se. Nom querem que as suas eleiçons sejam roubadas. Mas há medo no Peru. Forças mais sombrias amontoam-se. O povo será capaz de derrotá-las?