Houvo um tempo, é certo, no que a espanholidade no nosso país era a forma que definia apenas as elites e quem desejavam parecer-se a elas, mas por desgraça esse tempo passou. Hoje as formas de viver, de identificar-se e de expressar-se da maioria clara das novas geraçons de galegas e galegos, é nitidamente espanhola. O nosso conflito já nom é facilmente categorizável baixo o modelo dum país que se enfrenta a outro, mas em alguns aspetos começa a parecer-se notavelmente a certos conflitos étnicos encalhados no coraçom das metrópoles modernas. Na medida em que perdeu sentido inspirar-se na FLN argelina, ganhou-no fazê-lo nos Black Panthers.
Cada vez mais, somos imigrantes no nosso próprio país: como aos nossos antepassados na América, corresponde-nos juntar-nos, ajudar-nos, construir as ferramentas que permitam conservar a nossa identidade num entorno hostil. Como ao resto de seres humanos sem carta de cidadania, toca-nos enfrentar o Poder, ocupar os nossos espaços, defendé-los, e tecer desde eles a nossa própria institucionalidade.
Estas palavras formam parte do texto “O nosso caminho” publicado no ano 2012 no primeiro número de O Golpe, Revista Galega de Pensamento Arredista. Estas palavras explicam com claridade o significado e o objetivo de numerosos projetos de construçom nacional que vírom a luz nos últimos anos polo País adiante, muitos deles da mão do movimento arredista. Como simples mostra estám os centros sociais autogeridos, as escolas da Semente e outros projetos de ensino colaborativo, a liga Gallaecia de futebol gaélico, a agrupaçom de Montanha Águas Limpas, as Olimpíadas Populares Galegas, médios de informaçom populares como Novas da Galiza ou Galiza Contrainfo, as redes de apoio mútuo, os grupos de consumo, sistemas de aforro e finanças éticas, moedas sociais, o organismo anti-repressivo Ceivar, a Plaforma Que voltem para a casa, e um cento de iniciativas mais. Nom todas tivérom o mesmo sucesso e algumas delas ficárom no caminho, mas muitas delas agromárom e estám a dar bons resultados. Em qualquer caso, as pessoas que estám por trás de todas estas iniciativas fórom conscientes da necessidade de criar espaços próprios sem aguardar pola política institucional.
Esta ideia de criar os nossos próprios espaços e desde eles, tecer a nossa própria institucionalidade já fora pensada polo nacionalismo galego de pré-guerra e tivo na proposta do médico e militante galeguista Ramom Ovelha, a sua definiçom teórica mais sólida. A proposta de Ramom Ovelha foi presentada na III Assembleia Nacional do Partido Galeguista em 1934, pretendendo alargar a auto-organizaçom do povo galego a todos os espaços sociais, até construir um potencial “novo Estado Galego” e foi aprovada por aclamaçom, e como tal recolhida nas atas da Assembleia. A esta estratégia de ir configurando nas sombras um novo Estado Galego que pudera sair à luz quando as condiçons o permitissem chamou-lhe “Autodeterminaçom funcional” da Galiza.
O público e o privado
Muitos projetos dos arriba mencionados som criticados desde posiçons progressistas por serem catalogados como “privados”, um conceito radicalmente oposto à ideia do Estado como responsável último de garantir a igualdade, a liberdade, a diversidade. Esta crítica só é entendível desde umha perspectiva institucional da política e desde a posiçom de privilégio de quem nom é diretamente beneficiada ou agravada pela ausência de acçom institucional.
Além do mais, existe umha falsa dicotomia publico-privado que nom se pode aplicar neste tipo de iniciativas. Nom se deve identificar o público única e exclusivamente com aquilo que é propriedade do Estado, assim como tampouco se pode identificar como privado todo o que nom é propriedade estatal. A separaçom entre o publico e o privado estabelece-a principalmente o ânimo de lucro das pessoas promotoras do projeto. Se nom há ânimo de lucro, é publico; se o há, é privado.
Por questons óbvias, qualquer iniciativa que vise fazer fronte ao Estado, mesmo aqueles empreendimentos revolucionários, se som avaliados baixo o primeiro critério (titularidade estatal-nom estatal) serám projetos privados, o qual é absurdo. Com esta lógica, o exército guerrilheiro EGPGC ou o monte comunal seriam considerados privados. Na verdade, o que faz que algo se defina como público é que o seu objetivo ultrapasse o interesse individual e aponte cara a um horizonte melhor para a comunidade da que forma parte.