Na rolda de imprensa que deu o presidente da Junta a semana passada para anunciar que convocava as eleiçons ao Parlamento Galego, declarava textualmente que “o maior risco que temos agora mesmo na Galiza é a chegada de turistas que espero que sejam muitos este verao”.

Por outra banda, na semana passada o governo espanhol proibia a circulaçom entre as províncias galegas, também entre os concelhos limítrofes, enquanto ontem anunciava que desde o vindouro 1 de julho permitirá-se a entrada de turistas estrangeiros, até de países com altas taxas de infecçom, sem necessidade de cumprir nenhuma quarentena.

A atitude tanto do governo da Junta como do governo espanhol evidenciam que para o poder político a economia está, mais umha vez, por arriba de qualquer outro assunto, mesmo sobre a saúde. Também demonstra que os turistas tenhem mais direitos que a populaçom local.

As expectativas

A decisom de facilitar a chegada de turistas tem como objetivo intentar salvar o setor turístico, um dos principais setores econômicos do estado espanhol. A Uniom Europeia assignou-lhe a Espanha o papel de pátio de recreio e ócio das classes médias europeias, para o qual foi desmantelada a sua indústria e precarizaçada a sua economia. A Galiza, numha situaçom de dependência dentro do próprio estado recolhe as migalhas dum modelo socialmente ruinoso.

Durante o ano 2019 chegárom à Galiza mais de 5,1 milhons de turistas e um total de 347.538 pessoas peregrinárom até Santiago de Compostela, batendo um novo registro. O sector já representava o 10,4 % do PIB galego e ocupava o 11 % dos assalariados. Todo eram boas novas para o cluster turístico galego, mas o surto do vírus COVID-19 tirou por terra as expectativas que havia para o ano 2020. Também pujo em questom os planos da Junta para o Jacobeu 2021.

As consequências da turistificaçom

Se Galiza escapou durante muito tempo ao castigo do turismo massivo foi em grande medida graças ao clima e às deficientes comunicaçons que uniam Galiza com a meseta, mas a partir da década dos 90 e com o boom do ‘Caminho de Santiago’ também começou a sofrer as bondades do sector.

A administraçom optou por liquidar o sector primário e o sector industrial potenciando a terciarizaçom da economia. Trata-se dum modelo económico cum impacto ambiental especialmente negativo: degradaçom das costas e áreas naturais devido ao excesso da presença humana (poluiçom de recursos naturais, geraçom de resíduos, urbanizaçom intensiva…). Além dos problemas ambientais, o sector também é responsável da exploraçom e da precarizaçom da classe trabalhadora com jornadas intermináveis e baixos salários.

A inflaçom dos preços em áreas turísticas é outra das consequências. Todo se encarece, desde o lazer até o transporte, mas onde afecta especialmente é à vivenda, a qual atinge preços insuportáveis para a populaçom local, devido ao aparecimento maciço de apartamentos de uso turístico. A gentrificaçom selvagem de determinados bairros, que expulsa os habitantes e o comércio tradicional junto com a expropriaçom de espaços públicos invadidos por enxurradas de turistas tornam irreconhecíveis muitas das vilas e cidades galegas em apenas duas décadas.

Em definitiva, a turistificaçom da Galiza significou umha desestruturaçom económica, que alterou as redes sociais tradicionais, forjadas sobre umha base de relaçons económicas endógenas, produto dos recursos, cultura e história própria, e supujo um grande impacto sobre o hábitat sócio-cultural galego. Tivo, portanto, umhas evidentes conotaçons coloniais.

Outro perigo mais

Além de todas as desvantagens já mencionadas, nesta situaçom excepcional há que somar umha nova ameaça: pom em perigo a vida das galegas. A chegada maciça de turistas ameaça a saúde dumha populaçom especialmente avelhentada e que padece uns serviços sanitários baixo mínimos.

Enfim, as medidas levadas a cabo para salvar a economia acabarám por matar-nos. Isto exemplifica o problema que , segundo Karl Polanyi, tinha o capitalismo. O capitalismo, além de fundamentar-se sobre a exploraçom de classe e ser ecologicamente insustentável, é incompatível com os dispositivos antropológicos mais elementares que dispom o ser humano para gerar umha sociedade. Esta pandemia está a pôr de manifesto a essência inumana do capitalismo.