Lara Cortizas é natural de Ourense, psicóloga e membro de Ecoar))), colectivo que trabalha, polas suas palavras, para elaborar contradiscurso, construir e coordinar alternativas de resposta social. Com ela falamos deste projecto nascido em Vigo, mas com ámbito de actuaçom global, que tenta dar umha alternativa anticapitalista e ecologista em tempos de auge autoritário e retrocesso dos direitos.

Definides-vos como umha “ferramenta independente apoiada na acçom directa, a pressom pública, a sensibilizaçom e a solidaridade” para denunciar as injustiças que provoca o capitalismo. Poderias-nos contar como nasce e como se desenvolve esta iniciativa?

O certo é que o nosso processo é dilatado no tempo, porque já a primeiros do século, durante a grande crise do Prestige, um grupo de pessoas entram em contacto, com a nota em comum de terem umha alta dedicaçom ao voluntariado e aos movimentos. Logo, em 2011, durante um momento importante, o ano do movimento das praças, das primeiras movimentaçons anticrises, este colectivo vai tomando forma, centrado na cidade de Vigo. É em 2015 quando nos definimos como umha plataforma global, e ainda com a base nesta cidade, lançamos umha intervençom além das fronteiras. Praticamos o activismo anticapitalista na França, também em África (tivemos umha companheira encarcerada no Senegal), participamos na Catalunha…em geral, numha relaçom constante entre a Europa e a América Latina, com umha participaçom intensa em contra-cúmios que ocupam a rua como protesto ante grandes encontros estatais e empresariais.

Como concebides a militáncia?

Entendemos o activismo como umha forma de vida, o certo é que lhe metemos muitas horas, para nós, por assim dizer, é umha necessidade, como comer. Nom temos um perfil concreto, podo dizer apenas que procedemos do voluntariado social, todas nós, e logo acabamos especializando-nos num campo determinando em funçom das dedicaçons; há umha companheira com umha editora, eu dedico-me mais à formaçom, e assi por diante. A nossa luita é contra as injustiças, sabemos que pode soar mui genérico, mas na realidade somos concretos: estamos contra as empresas transnacionais e os Estados que vulneram direitos, somos anticapitalistas, e este anticapitalismo nom se concebe sem o ecologismo e a luita polos direitos humanos.

Há umha percepçom geral, nos movimentos populares galegos, dum certo debalar, e dumha crise dos valores colectivos e militantes, nomeadamente após a crise do covid. Como o vivedes vós?

O certo é que nom temos essa perceçom. Consideramo-nos umha estrutura resistente, obviamente com limitaçons, e muita autocrítica que fazer, mas também com logros e trabalho sostido no tempo. Sobre a saúde dos movimentos, certo que se diz por vezes que nom há relevo geracional, mas realmente nom o comparto. Vejo a chamada geraçom Z e si, vejo que dam activistas, abraia-me o sentido crítico que tenhem, como assumírom luitas antes minoritárias, como o ecologismo, ou a saúde mental…certamente que há umha mudança de paradigma: o modelo social nom ajuda, as cidades som cada vez mais inabitáveis, a precariedade laboral está aí…entom, nom podemos estar sempre a comparar o que se fai hoje com os modelos de antes, porque som incomparáveis, estamos noutra sociedade. Agora o activismo fai-se com novos paradigmas.

Imagem: Ecoar

Outra crítica aponta a que há um esforço excessivo nas redes virtuais em detrimento da dinámica assembleária e de rua que nutriu sempre os movimentos. Partilhas esta análise?

Certamente que se trata dumha arma de doble gume. Temos acesso a muitíssima informaçom, quase como nunca antes na história, e se queremos procurá-la temos acesso a cousas interessantíssimas e materiais que podem explicar muitas cousas. Por exemplo, o nível de mobilizaçom pola Palestina nom se alcançaria sem este recurso. Ora, que acontece? Que com efeito, que ficamos expostas a um tipo de informaçom para a que já somos sensíveis, profundizar em outras cousas; e também pode dar a ideia de que estou a fazer sem fazer, simplesmente por estar presente online, o que é desmobilizador. Mas olho, nós nom temos um discurso tecnófobo, porque esta ausência dava-se antes, ainda de outro modo. Sempre houvo gente que dava pretextos para nom estar nas luitas dizendo que já dava dinheiro, que já colaborava pontualmente, etc. Isso sempre existiu.

Umha das preocupaçons que aparecem nos vossos textos e acçom é a emergência climática. Que pode achegar a vossa experiência neste campo?

No ámbito galego, por fortuna partimos dumha realidade onde historicamente há bastante tecido associativo desse grande guardachuvas que é o ecologismo, com luitas de peso históricas, caso da luita contra Ence, agora estamos num agromar de colectivos múltiplos contra a invasom eólica. Nós pensamos que isso todo se tem que engarçar de algumha maneira com a luita mais geral ante a emergência climática; nom temos campanhas próprias sobre isto, mas participamos na plataforma Galiza sem Carvom, que agora mudou o nome por Galiza sem Gás, temo-nos mobilizado em acçons na Alemanha, e estamos presentes nas contra-cimeiras que se organizam com motivo das Coop sobre a mudança climática, polo que consideramos que estamos bastante activas nisto.

Com que atrancos vos topades como Ecoar))), e em geral com que atrancos pensas que se topam os movimentos?

Falávamos antes que o modelo social, e o tipo de cidades, nom facilitam o activismo…claro que logo há um elemento central, que temos mui presente, que é a repressom, esse rearme do aparelho repressivo que se evidenciou com a Lei Mordaça, mas vinha de atrás, e a raiz do covid ainda se intensificou. Nestes anos avançou a criminalizaçom do protesto pacífico, e logo toda essa linha de extorsom económica que desmobiliza através de multas e sançons, que é mui potente.

Palestra de Carlos Taibo em Vigo. Imagem: Ecoar

E a nível interno, como vos organizades para superar este contexto adverso?

Nós vivemos isto muito, como che dizia, mas nom funcionamos com liberados; se bem se trata dumha estrutura quase profissional, abrimos um debate sobre isto, e decidimos nom ter liberadas. Pensamos que poderia intervir na tomada de decisons, isto é, que a tomada de decisons nom seria tam limpa, e ia estar influída: se o meu salário, o meu pam, vai na decisom que eu poida tomar, ficaria fora de que nós queremos. Sabemos que isto do activismo, por outra parte, pode ser um privilégio, porque como o compaginamos com os cuidados, com o trabalho precário? Há que atender estes equilíbrios. E bom, tentamos fazê-lo trabalhando em rede, por exemplo umhas pessoas participam fisicamente dumha acçom, sei lá, na Catalunha, outras dam-lhe cobertura mediática aqui…valoramos a disciplina, somos bastante disciplinadas, e isto fai com que poidamos chegar a objectivos. Dosificando também com realismo para evitarmos o desgaste.

Nestes dias de março organizastes no Café De Catro a Catro de Vigo umhas jornadas com o título “Sociedade em venda”, onde analisades as relaçons de poder em vários ámbitos, do empresarial ao mediático. Como valorades o trabalho formativo?

Muito, e de feito a nossa linha editorial, 13 Editora, vai nessa direcçom, tentamos tirar títulos com certa periodicidade; no que diz respeito às jornadas, queremos conhecer polo miúdo como funcionam as dinámicas de poder, partindo dumha realidade muito clara: dá-se umha acumulaçom de capital em menos maos, dous terzos das economias mais grandes do mundo já pertencem a empresas, agora parte delas as empresas de dados, e esta deriva vai afectar directamente os direitos humanos. Pois bem, nestas jornadas tentaremos analisar polo miúdo como funcionam estas dinámicas, para tentar superá-las. Aliás de dar informaçom, queremos que esta seja rigorosa e de qualidade.