A resoluçom do tribunal internacional de justiça da Haia sobre o genocídio israeli em Gaza, divulgada na sexta feira (19 de janeiro) está a ser objecto de diferentes interpretaçons.
O mesmo dia os palestinianos de Gaza exprimiam em Al Jazeera a sua amargura e desespero porque o tribunal nom chamou ao cessar fogo imediato que eles precisam para sobreviver e que pedia a reclamaçom da África do Sul.
“Israel pode seguir a bombardear, mas, isso si, a procurar que a guerra contra a populaçom de Gaza nom vire um genocídio”, resumia Junge Welt, um dos poucos jornais alemáns decentes, escandalizado pola declaraçom do tribunal.
“Umha parte do genocídio já se tem produzido, do que se tratava era de evitar o seu progresso e consumaçom, e isso é mesmamente o que o tribunal nom fijo”, lê-se num meio dissidente dos Estados Unidos.
Os mais dos meios de comunicaçom imperiais que dedicaram algumha manipulada atençom ao evento da Haia -por exemplo, quase nem mentando a formidável apresentaçom dos advogados da África do Sul, e informando polo miúdo da grotesca e desvergonhada “defesa” israeli durante a vista – pugérom em destaque que “o tribunal rejeita ordenar um cessar fogo em Gaza”, como rezava no sábado o cabeçalho da capa do The Wall Street Journal, sugerindo umha vitória do seu protegido.
Na verdade, a resoluçom da Haia reventou por completo o argumentário israeli. Estabeleceu que si é “plausível” a acusaçom sudafricana de que “Israel cometeu, está a cometer e corre o risco de seguir a cometer actos genocidas contra o povo palestiniano em Gaza” e, portanto, aprovou a maioria das medidas cautelares apresentadas pola África do Sul e ditaminou que Israel deve “tomar todas as medidas” para evitar actos de genocídio em Gaza.
Que um tribunal historicamente desenhado polo hegemonismo ocidental após a Segunda Guerra Mundial, que nunca se atreveu a investigar e condenar as falcatruadas ocidentais no mundo, presidido por umha ex alta funcionária do Departamento de Estado americano, e cujos juízes apenas chegam ao cargo após demonstrarem compreensom e submissom cara a paródia da justiça universal da que fam parte, resolvera algumha cousa assi, é sensacional e explosivo para a reputaçom dos genocidas e dos seus cúmplices, independentemente das consequências jurídicas práticas que vaia ter.
Recordemos que tanto Israel, como Estados Unidos, Paris e Berlim, já declararam que haviam ignorar qualquer possível sentença contra Israel.
A realidade é que, apesar do dito, a resoluçom da Haia foi perfeitamente compreendida polo genocida e os seus cúmplices nos Estados Unidos e a Uniom Europeia.
As autoridades israelis, as suas embaixadas e aqueles encarregados de lhe lavarem a cara estám fora de si. Acusam o tribunal de antisemitismo. O ministro de defesa, Yoav Gallant, dixo que o tribunal se extralimitou ao dar curso à “denúncia antisemita da África do Sul”. O ministro do interior, Itamar Ben Gvir, acrescentou ainda “a decisom do tribunal antisemita da Haia demonstra o que já sabíamos: que este tribunal nom procura a justiça, mas a perseguiçom do povo judeu”. O mesmo Wall Street Journal que publicava aquele acougante cabeçalho na sua capa, arremetia no seu interior com um editorial intitulado “A guerra da ONU contra Israel.”
Para contra-restar a derrota informativa e vingar-se polo atrevimento da ONU, da que o tribunal é o braço judicial, na mesma sexta feira as autoridades israelis revelavam a sua “denúncia” de que umha dúzia dos 13000 empregados da Agência da ONU para os Refugiados Palestinianos (UNRWA) participárom nas violências que seguírom à fenda aberta no cerco do “grande campo de concentraçom” de Gaza (a definiçom é de Giora Eiland, um alto funcionário da segurança de Israel em março de 2004, muito antes do bloqueio do território). A acusaçom fundamenta-se nos interrogatórios dos serviços de segurança israelis aos milhares de palestinianos maltratados e torturados depois do 7 de outubro.
O plano israeli para botar ao UNRWA de Gza, onde sostém as necessidades mais elementais a dous milhons de seres humanos, para fazer ainda mais insuportável a sobrevivência no território, já era conhecido desde dezembro, quando a televisom israeli filtrou um informe do Ministério de Exteriores. A primeira fase do plano era “estabelecer a cooperaçom do UNRWA com Hamas”, dizia. A segunda era “reduzir as operaçons de educaçom e assistência” da agência, e a terceira “transferir” a sua funçom a novos organismos (como podemos ler neste link). Imediatamente, dez países suspenderam o seu financiamento ao UNRWA.
Trata-se de: Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, Canadá, Holanda, Itália, França, Suíça, Austrália e Finlándia. No total, representam por volta do 60% do financiamento da agência.
Isto é: horas depois de a Haia ordenasse a Israel “adoptar medidas imediatas para permitir o fornecimento de serviços básicos e de assistência humanitária essencial frente as adversas condiçons de vida dos palestinianos de Gaza”, e quando segundo a ONU mais de 750000 gazaties enfrentam “umha fome catastrófica” e um risco de doenças e infecçons monstroso, todos esses países cúmplices do “direito de Israel a se defender” suspendem o financiamento do principal organismo assistencial e incrementam os efeitos do massacre que baniu mais do 1% da populaçom e feriu mais do 2% nos últimos três meses. Que é isso senom umha vingança do genocida e os seus cúmplices ante a resoluçom judicial?
Depois de que pola vez primeira na história um país do Sul se atrevesse a sentar no banco dos acusados o ocidente colonial, exigindo o fim do massacre contra a martirizada populaçom autóctone da Palestina, a resoluçom da Haia convoca a solidariedade internacional. Por enquanto, apenas os hutis do Iemen respondem aos massacradores e os seus cúmplices de jeito digno e consequente, interrompindo selectivamente o tránsito marítimo no Mar Vermelho.
*Publicado originalmente no blogue do autor e no digital CTXT. Traduçom do Galiza Livre.