Originário de Ferrol mas viguês de adopçom, Sime Gavira é músico de Keltoi! e um dos participantes em “Oliveira dos Cem Anos”, o hino celtista em língua galega que volveu a pôr de relevo a relaçom entre a equipa celeste e a consciência nacional. Participante da bancada mais conscienciada de Balaídos desde a sua infáncia, ex-membro das Xuventudes Celestes e de Celtarras, co-fundador de Siareiras Galegas, e da AMI em Vigo, conversamos com ele do impacto da “Oliveira” e das relaçons entre o futebol e o movimento popular na grande cidade do sul.

Milhares de galegas e galegos escuitárom nos passados meses “Oliveira dos Cen Anos” e exprimírom nas redes, mormente, o seu entusiasmo. Mas nom tanta gente conhece a sua origem. Podias falar-nos disto?

Todo isto xurdiu, ao que parece, dum inquérito da Cadena Ser com motivo do centenário do Celta. No Twitter da radio perguntava que artista ou artistas seriam os idóneos para ser autores do hino, que se Siniestro Total, Carlos Núñez…e outros nomes de sona. Na rede social, Antón Álvarez (¨Pucho”), C.Tangana, interviu dizendo algo assim como “podo tentá-lo”. Isto criou umha grande expectaçom, nomeadamente na rádio local, que se fijo eco do que de partida quase era umha brincadeira. O tema ganhou entidade, madurou, e virou todo um ruxe-ruxe popular. Até que com efeito foi oferecida a C.Tangana a opçom de elaborar o hino.

Como vivestes este processo em Keltoi!?

Nós de partida deixamos a nossa posiçom muito clara, era muito firme. Nom como ‘haters’, olho, que também os havia, dizendo que nom podia fazer o hino umha pessoa alcumada ‘El Madrileño’ e críticas deste teor. Nom, nós simplesmente, antes de se decidir o artista que faria o hino, dixemos que nom concebemos a música como umha competiçom, nom participamos de concursos (nunca fomos, por exemplo, a eventos como o Martín Códax), e que os nossos temas saem sempre do coraçom, nom se fam por encargo. Logo, por umha série de acasos, e de reflexons, a minha posiçom matizou-se um bocado.

Que aconteceu?

Com a passagem do tempo, foi ganhando enteiros a possibilidade de que C.Tangana fixesse o hino. Ficava claro que para o departamento de marketing do Celta isso era um caramelinho. Nós seguíamos polo nosso rego, com o nosso critério. Por acaso, um dia topei-me com o gestor dos actos do centenário do Celta em Balaídos e ali, no próprio estádio, está Antón Álvarez; apresentam-mo e falamos um bocado. Dali a um tempo, o responsável do Celta liga para mim dizendo que Álvarez quer falar com Keltoi! polo tema do hino. Ele viveu em Vigo, tinha contactos com pessoas de Tropas de Breogám, a quem eu conheço, e havia interesse em estabelecer contacto. Entom passamos a falar o tema no grupo.

Que foi o que marcou a tua decisom de participar?

De partida na banda havia receios, eu pessoalmente tinha-os. Musicalmente, estava mui arredado de nós, mas nom apenas musicalmente, também no que diz respeito às mulheres, polo que víamos na sua obra. Entom, no grupo havia diferença de opinions: pessoas que nom queriam participar de nenhum modo, pessoas que se abstinham, e outras que me animaron a polo menos escoitar a proposta, que estávamos abertas ao que poderia xurdir. Quando falo com Tangana, deixa-me claros quatro pressupostos: que a peça ia ser em galego (obviamente, se nom fosse assi nom poderia fazer parte do projecto); que ele próprio nom ia cantar nem ser o protagonista; que nom ia ser reggaeton nem estilos semelhantes; e que ia haver muita participaçom da música tradicional galega, e nomeadamente o protagonismo ía ser de mulheres do país. Estes pontos de partida fixérom-me mudar de opiniom. Propugem ao grupo que se queria ir umha pessoa no canto de mim, perfeito, que eu nom procurava protagonismo. Mas finalmente nom houvo voluntários e alô fum.

Como valoras o resultado final?

Muito bom, quer polo produto musical, quer pola acolhida. É umha peça que calou muitas bocas, começando pola minha. Pucho é um rapaz inteligente e soubo profundizar na música tradicional; nom foi ao doado, à fórmula de sempre, deu um papel central às mulheres, ampliou o campo da percussom, recorrendo ao sacho, à lata de pimentom…a acolhida, socialmente, tivo grande entidade; obviamente que há críticas, sempre as há, mas em termos gerais foi um sucesso.

Algum comentarista comparou o fenómeno da “Oliveira” com as Tanxugueiras, no sentido de ser mais umha prova da adesom social que merecem a nossa língua e cultura. Concordas?

Poida que haja um paralelismo, se bem a dimensom nom foi a mesma (neste caso um pouco menor). E como anedota, direi-che que muita gente pensou que as pandeireteiras da “Oliveira” eram as Tanxugueiras, e nom as Lagharteiras, ignorando também de passagem que no nosso país há dúzias e dúzias de grupos de pandeireteiras de qualidade.

Logo, no idiomático, Volvemos a ver este fenómeno paradoxal: ninguém concebia em Vigo que o hino fosse noutra língua que o galego e, porém, há um abismo entre esta atitude e os usos sociais do idioma.

Também se dá um um paradoxo político. Porque numha das cidades mais espanholizadas do País, a consciência nacional galega parece ter boa saúde, nom achas?

Sem dúvida. Eu falaria dumha consciência nacional galega relativamente alta em Vigo onde, a diferença de outra das nossas cidades, nom vês um nacionalismo espanhol agressivo. Isto em Vigo nom está bem visto, mesmo em ambientes juvenis que podemos considerar “pijos”. Quiçá tantos anos de sindicalismo galego de classe deixárom o seu pouso e isto tem as suas expressons. Umha outra, por exemplo, a concorrência a manifestaçons como o 8 de março ou o 1 de maio, proporcionalmente à populaçom da cidade.

Como pessoa que te formache politicamente de muito nova, e que acompanhache este processo com a assistência ao futebol, que papel dirias que jogárom as bancadas na conscienciaçom da mocidade?

Muito importante. Levo 30 anos indo ao futebol, e participando activamente das bancadas, desde o 1985, quando tinha doze anos. Lembro que na altura, um verán, moços celtistas retirarom a bandeira espanhola do palco de Balaídos, e desde entom, ninguém a volveu colocar. Fôrom décadas de normalizaçom da estreleira e da nossa simbologia no estádio do Celta, hoje podemos ver dúzias delas, e em todas as bancadas, agás tribuna. O futebol foi um grande activador da consciência nacional na juventude, sobretodo nos anos 90, na jeira de Siareiras Galegas.

Em 30 anos, o futebol mudou enormemente. Suponho que também o faria a bancada mais politizada.

Mudou, certamente. De partida, no estético. Antes havia muitos vencelhos com as tribos urbanas, era um mundo esteticamente muito desafiante, muito rupturista. Mais recentemente, começou a dominar um movimento chamado casual, que defende nom significar-se esteticamente.

No terreno nacional, por fortuna, a vindicaçom galega segue igual de viva: e falemos de Tropas de Breogám, do Colectivo Nós, de Celta Vigo Hooligans, todos adoptárom a estreleira como própria. O movimento ampliou-se, fijo-se mais grande, a ao ampliar-se, acho que perdeu radicalidade. Recordo quando nos 90 éramos muitos da AMI, ou participávamos de outros colectivos sociais. Hoje nom há umha associaçom tam directa entre siareiros e participaçom política. Podemos dizer que se baixou umha marcha.