Natural de Castro Verde, artesao de longa trajectória, implicado em movimentos populares desde a mocidade, Xosé Manuel Seixas vem de elaborar a colecçom mais completa de máscaras do Entroido galego, valendo-se apenas da sua habilidade e dos seus recursos. Com grande sucesso de público, a exposiçom itinerante desta joia do património galego tem ocupado já centros sociais, centros de ensino, casas da cultura e locais de todo tipo na Galiza e Portugal. Com ele falamos das raízes ancestrais do nosso carnaval, da riqueza simbólica galega, ou da relaçom das instituiçons com o património.

Como te inicias no artesanato?

Estudei na escola de artes de Lugo, onde entrei em contacto com diferentes materiais, desde a pintura até o trabalho com volume, como barro ou os moldes. Tenho muito bom recordo daquilo, eram uns cursos que funcionavam mui bem e que me dérom umha boa base. A posteriori, fixem várias formaçons adicionais, o mais importante deles com Marcelino de Santiago, Cucas, um curso de 600 horas de marionetas, mas no que trabalhamos também especificamente a elaboraçom de máscaras. Assim foi como conseguim a minha carta de artesao. O meu mestre foi umha pessoa mui acessível e generosa, ao que lhe podias perguntar qualquer cousa mesmo depois de se realizarem os cursos. Toquei também o mundo da cestaria com Carlos Fontales, a pessoa que lançou a ideia do centro de cestaria do Rato, em Lugo, e que no seu dia tivo muita procura. Além disso, trabalhei o feltro, com Ramón Álvarez, continuei com um monográfico de talha com Óscar Aldonza, pratiquei a talha de madeira…Tivem estudos multidisciplinares em certo sentido.

Aliás disso, algumhas das máscaras fixem-nas mao com mao com as próprias pessoas de cada comarca, com ajuda das pessoas que trabalham nestes entroidos.

De onde vem o teu interesse específico polo Entroido?

Chamou-me sempre o tema estético, mas nos anos 90 começou o meu interesse mais específico, desde a primeira vez que fum a Laça; logo fum a Santiago de Arriba, em Chantada, onde tivem relaçom mais estreita com os artesaos das máscaras; chegárom a convidar-me a participar como Meco, logo como Maragato… essa proximidade também a tivem em Maceda, onde chegárom a convidar-me a vestir-me de felo. As amizades com pessoas da Sociedade Antropológica Galega, como Miguel Losada ou Rafa Quintiá, ajudárom-me a me aproximar do ponto de vista dos estudos académicos a esta celebraçom e resultárom um grande complemento.

Quais som, ao teu juízo, os elementos que fam tam singular e rico o nosso Carnaval?

Para mim representa a riqueza cultural galega mais importante, para além de ser um elemento que vincula a Europa na sua totalidade. O Entroido conecta-nos com qualquer ponto do continente, e a um tempo conecta com a própria Galiza, demonstrando a nossa variedade comarcal. A riqueza de trajes, rituais, materiais elaborados, é brutal; e curiosa estas diferenças que pode haver com os teus vizinhos, e a um tempo a cercania com latitudes afastadas.

Logo, podemos dizer que a quantidade de entroidos que tem a Galiza, particularmente Ourense, ou a zona de Samora ou Trás-os-Montes, a velha Gallaecia, nom tem paralelismo em outros Estados europeus. E a riqueza é ainda maior do que pensamos, o que acontece é que nom há gente nova que os vista, nom há relevo geracional.

Como se che ocorreu a ideia de iniciar umha coleçom tam ampla como esta?

A ideia inicial nom era fazer umha coleçom, nem umha exposiçom… eu pretendia trabalhar as máscaras, a parte mais gráfica, mais estética, e comecei a praticar com elas, sem mais intençom; para mim era a um tempo umha forma de investigar o Entroido, de aprender do seu significado. Quando reparas em detalhes concretos, sem demasiado sentido aparente, decatas-te de que sempre há um porque, além do estético. Todo isso, participando dos entroidos, podendo perguntar às pessoas implicadas, pois a gente sempre é muito colaborativa. Para mim tratou-se umha auto-aprendizagem que ainda continua hoje. Chegou um momento em que me chamárom das Jornadas de Tradiçom Oral da AELG e dixérom-se se queria participar; a partir daí começárom mais e mais chamadas de centros de ensino ou centros sociais.

Existe ou existia no País umha mostra semelhante da riqueza simbólica das nossas diferentes comarcas?

Nom conheço coleçons deste tipo, embora há gente que fai, particularmente, trabalhos para si, por gosto. O mais semelhante que podo conhecer é o Museu do Entroido de Ginço, que se está a revalorizar, com o problema de que o prédio é muito pequeno para acolher umha riqueza de tal entidade. Em Portugal quiçá exista mais afeiçom a isso, pois existe gente que as coleciona. Mas no meu caso nom é colecionismo, senom que eu próprio as elaboro. No meu caso, prefiro saber como se fai umha máscara, ainda que logo a presentee, a comprar umha máscara que eu nom fixem.

Que dificuldades topache para levar adiante o teu trabalho?

Fundamentalmente a falta de tempo, pois nom trabalho disto. Há muita gente que me pediu que a visitasse para colher dados, e trabalho de campo pendente que ainda nom dim feito… lugares onde o Entroido desapareceu, e cumpriria recolher dados para salvar as máscaras.

Logo, cada máscara é um mundo, entom os problemas técnicos aparecem por toda parte. Há algumhas que precisam de trabalhar a madeira, outras de coiro, outras de vímbio, outras de cartom… isso é o bonito, aprender a fazer umha máscara é aprender umha técnica em si. Agora cumpre-me por exemplo aprender a tornear ou a soldar para fazer certas máscaras. Isto requer um tempo grande, nom menos dum ano ou dous, antes de ter um resultado aceitável.

Que acolhida está a ter a exposiçom?

Muito boa em todos os sentidos. Em certos ámbitos, como centros sociais, um já espera identificaçom com a cultura galega, mas em outros, como nalguns liceus, o professorado dizia-me que a rapaziada mesmo parava a vê-las. Nas palestras que dou em centros de ensino comprovo que a atençom é máxima, há muitas perguntas, que soem ser curiosas e interessantes… nalguns casos até os docentes ficárom surpreendidos. Eu acho que o mundo das máscaras é tam chamativo e profundo que tem um poder de atracçom.

Pensas que iniciativas como esta precisam de apoio institucional, ou confias no potencial da pura auto-gestom?

A minha iniciativa nom precisa apoio institucional porque nom é o que procurava. O que si que acho é que as instituiçons podiam potenciar iniciativas de seu, vemos como em outras latitudes mais pobres, no que diz respeito ao Entroido, há museus, publicaçons, actividades… na Galiza, neste sentido, ainda estamos frouxos, a Junta apenas pensa num desfile de entroido que se fai cada ano em setembro. Nom penso que a subvençom geralizada seja a fórmula, mas em casos particularizados teriam o seu potencial, sobretodo no respeitante a difusom e estudos. Sempre respeitando a autonomia da festa, que corresponde a gente. O Entroido em si deve ser auto-organizado, sem presença da administraçom. Essa é a sua lógica.