Calcula-se que durante a quarentena Covid morrêrom cerca de 35.000 residentes nos centros geriátricos, isoladas, esquecidas polo sistema, sem receber a atençom médica e humana. Aumentam os protestos por um modelo diferente de atençom geriátrica: associações de residentes, familiares e trabalhadoras do setor proponhem mudanças no modelo de cuidados, rejeitam as condições de atençom das “macro-residências”, exigem o cumprimento dos requisitos de cuidados para pessoas idosas e pretendem melhorias nas condições do pessoal especializado, altamente feminizado, precarizado e sobrecarregado de trabalho.
Juntamente com os protestos, ganham mais força e atençom social propostas alternativas que há tempo estám nas agendas feministas, como a co-habitaçom num contexto de envelhecimento ativo e de comunidade, baseado na possibilidade de escolher onde, como e com quem viver e ligado ao direito a fazer um caminho digno e satisfatório na velhice.
Estes som só alguns dos conceitos que aparecem na página web do projeto LarLilás, umha associaçom sem fins lucrativos que – reportando quanto aparece na página web – “tem como objetivo desenvolver um projeto de criaçom dumha comunidade ampla de pessoas de idade com um modelo de atençom integral e cuidados centrado nas pessoas, que poda garantir um final da vida em condições de dignidade, num contexto social aberto, próximo e afetivamente enriquecedor”.
A LarLilás é um projeto de co-habitaçom que prevê a construçom de bungalows ou apartamentos confortáveis e independentes para assegurar umha vida autónoma (cada pessoa mora na própria casa), juntamente com instalações desportivas (ginásio, piscina coberta, minigolfe, etc.) e para o lazer e convívio (salas de reuniom, biblioteca, cafetaria, jardins, etc.). Além disso, garante-se um cuidado integral a quem venha a ser completamente dependente.
Este artigo recolhe as reflexões do Cafezinho Revirado “Velhice ou Barbárie” que decorreu num encontro on-line a 8 de julho 2022. Encontrámo-nos e conversámos com Ana Romaní Blanco, Montserrat Sánchez Mancebo e Nieves Rodríguez Brisaboa, três das companheiras ativistas da LarLilás, e com as companheiras que participárom no debate.
Como surgiu o projeto? O retiro das Amazonas
Ana está no projeto desde os inícios: explica que LarLilás nom é um projeto de agora, criado para resolver a questom do envelhecimento, mas tem origem há muitos anos, quando todas tinham entre 30 e 40 anos e já sonhavam um projeto coletivo, auto-gerido, nom só para envelhecerem juntas, mas também para compartir, para gozar e experimentar modelos alternativos de convivência, de participaçom e de desenvolvimento – através da LarLilás – de projetos de carácter social e cultural. Insiste em que LarLilás nom é algo final, mas é umha prova dum modelo alternativo aos padrões de envelhecimentos que nos está oferecendo o sistema neste momento.
Nieves lembra que começárom a elaborar LarLilás rindo muito, divertindo-se juntas, no contexto dumha amizade na luita feminista que remonta há vinte ou trinta anos. Daquela, falavam de que tinham que organizar o retiro das amazonas: depois de tantos anos na luita feminista, na velhice iam ter o direito a descansar. O nome Retiro das Amazonas foi evoluindo até chegar a LarLilás, um nome mais suave, mas a ideia é continuar na velhice com projetos de mulheres independentes, livres, feministas e luitadoras e num ambiente muito mais adequado para a esta ideologia que as residências convencionais.
Caraterísticas do projeto e etapa em que está
«Com a passagem dos anos tínhamos a necessidade de concretizar este sonho. Um bocadinho antes da pandemia encontramo-nos com o sério propósito de definir o projeto. Chegámos portanto às definições iniciais descritas na nossa página web (www.larlilas.com), e estávamos prontas para a difusom quando chegou a pandemia e todo ficou parado. Assim que voltámos a retomá-lo depois, juntando-nos a outras pessoas interessadas no co-housing sénior, um movimento que está a ter cada vez mais impulso em todo o Estado espanhol. Somando forças, lançámos o projeto LarLilás que foi mui bem acolhido por um coletivo de pessoas de valores progressistas, interessadas em organizar umha velhice diferente.
Pedimos o preenchimento dum formulário para cumprir a Lei de Proteçom de Dados e neste momento temos umhas 45 pessoas dispostas a associar-se. Apresentamos LarLilás em diferentes eventos públicos. Em setembro 2022 associaremos formalmente estas pessoas, começaremos a recolher as quotas, a buscar terrenos, porque entendemos que, ainda que seria bom termos já umhas cento cinquenta ou duas centos sócias, temos que começar já e desenvolver o projeto nas sucessivas fases. Estamos num ponto super emocionante!»
Potenciais sócias: quem som?
«Umha parte das pessoas procedem do núcleo inicial da LarLilás (aquele que se chamava Retiro das Amazonas), ou seja, do ativismo feminista e muitas trabalham no ensino ou já estám reformadas. O outro grupo tem diferentes procedências: 6-7 eram velhes amigues com quem compartilhamos o desejo de envelhecermos juntes. Depois, há gente de diferentes procedências que se achegou ao projeto graças às apresentações publicas que figemos, por exemplo, na Agrupaçom cultural Alexandre Bóveda na Corunha.
Com respeito ao nível social e económico, trata-se de classe media, trabalhadorxs do ensino, médicxs, de ámbito administrativo, que trabalham na administraçom central, mas a maior parte é docente. O nível económico de que se precisa para entrar na LarLilás é mais baixo que noutra experiência de co-housing sénior porque estamos a pedir umha contribuiçom de entre 40 e 60.000 mil euros – frente aos 150.000-200.000 euros doutros projetos de co-housing sénior – e um compromisso de pagamento mensal que está por volta de 700 euros, para incluir todos os cuidados que se podam necessitar. O conceito base é que este dinheiro seja como um seguro: pagam-se 700 euros por mês e haverá anos em que nom se precisará de nenhum cuidado. Mas se um dia aparece umha dependência mais ou menos grave, que requeira atençom – por exemplo, que te ajudem a tomar duche, a mover-te – pois, nom haverá que pagar mais, continuarás a pagar a mesma quantidade».
Base ideologia do projeto
«O projeto tem ainda muitos elementos a definir, mas duas cousas nom vam mudar: o ideário progressista, feminista, contrario a qualquer discriminaçom, sem fins lucrativos, respeitoso em temas importantes como a morte digna. E também o facto que quem viva na LarLilás pode ter garantia de que ainda que desenvolva umha dependência, nom terá que mudar de habitaçom ou mudar-se a um geriátrico convencional.
Esta é umha aspiraçom na medida em que podamos cumpri-la, porque nesta primeira fase – com só as quarenta pessoas iniciais – nom podemos manter os cuidados para umha pessoa que sofra, por exemplo, dumha forma agressiva de Alzheimer, porque nom temos os meios económicos e nom queremos subir a quota de 700 euros. Quando formos mais sócias, sim poderemos, mas inicialmente nom».
Partimos da ideia que a velhice nom é o estado final, mas um processo. A partir dos 30-40 anos podemos pensar: «Vou fazer um pagamento mensal dumha quantidade para quando tiver 60 poder entrar na LarLilás».
Aceitaçom do ideário entre as sócias.
«Até o momento nom houvo problemas na aceitaçom do nosso ideário feminista, laico, progressista, ecologista. Neste sentido é importante remarcar que nom é um projeto isolado, mas procura o contacto com o contexto social.
O envelhecimento nom é umha doença, é umha etapa, em que deixamos de cuidar e recebemos cuidado. E ao mesmo tempo precisamos de atividade, de ativismo no contexto em que vamos viver: este ativismo faz que o processo de envelhecimento ativo seja mais frutífero e que nos torne mais felizes. Em particular, colaborar com o ambiente onde imos viver significa nom só ocupar um espaço onde fazer cousas, mas também encontrar-se com as pessoas que vivem lá e ser ativistas nesta zona.
LarLilás vai posicionar-se a favor de todas as reivindicações do contexto social no qual vai estar: estaremos juntas com a vizinhança para proteger e melhorar o entorno social e físico em que vamos ficar. Imos contratar pessoal aí onde estivermos: oferecemos ao concelho a criaçom de postos de trabalho direto e também de serviços. Teremos umha piscina coberta climatizada onde a determinadas horas poderá aceder o povo, pagando umha pequena entrada, que será para nós também fonte de rendimentos económicos. Como teremos que cuidar de sócias com dependência, imos abrir um centro de dia e umha residência. Estes oferecerám vagas também para a vizinhança. Desta maneira teremos mais rendimentos. Todo isso significa que no lugar onde nos estabelecemos haverá um centro de dia, umha piscina, até umha biblioteca aberta ao público, porque todas somos leitoras e temos muitos livros que nom imos levar à tumba! Mesmo umha companheira propunha alugar um baixo para abrir umha padaria-pastelaria para nós e depois para vendermos para fora! Imos ter um bar, umha cafetaria, um restaurante…
Nom é umha granja de pessoas idosas metidas dentro dumhas muralhas. Vai ser um espaço aberto, em interaçom económica e social com o ambiente».
Contactos com outros projetos ativistas similares
«Estamos em contacto com outros grupos de co-housing sénior que partilham connosco talvez nom tanto o ideário feminista, mas sim o ideário progressista. Por exemplo, Trabensol é provavelmente o co-housing sénior mais consolidado do Estado espanhol. Compartem connosco a ideia de interaçom com o ambiente, até o ponto que na vila onde estám – perto de Madrid, em Torremocha de Jarama – há dous concelheiros que vivem em Trabensol. Partilhamos com eles a importáncia da participaçom política no desenvolvimento da contorna e temos como modelo de referência o movimento do co-housing – ou seja, vivendas colaborativas, de envelhecimento ativo – mas também o modelo de feministas na França e na Inglaterra, porque procuramos modelos alternativos de velhice e a continuidade do ativismo feminista em que nos empenhamos durante tantos anos».
Quem toma as decisões na LarLilás?
Ana, a atual presidenta, comenta que os cargos som umha imposiçom estatutária, porque o projeto é auto-gerido, baseado no consenso da Assembleia, portanto as decisões som tomadas polas sócias e haverá umha Comissom Executiva para desenvolver as decisões da Assembleia. Por outra parte, nom deixa de ser umha preocupaçom para elas a acessibilidade económica ao projeto: a precariedade na que vive umha imensa maioria social dificulta para muitas a participaçom na LarLilás. Por isso, o objetivo é chegarem a umha base de 150-200 pessoas sócias que sejam solidarias. As achegas económicas das sócias nom som só para elas mesmas, mas para viabilizar mais alternativas para distintos tipos de economias, como a opçom de aluguer, em caso de pessoas que nom disponham da quantidade de dinheiro necessária para o forte desembolso inicial.
Obstáculos encontrados até agora e potenciais ameaças
«As dificuldades encontradas até agora tenhem sobretudo a ver com a burocracia, as autorizações que se precisam para dar vida a um modelo de habitaçom diferente. O projeto tem um espaço físico mui concreto: nom se trata só encontrar um terreno adequado, mas também de analisar as leis que se estám aprovando e que nos podem ser de ajuda. É um processo longo, que envelhece connosco.
Além disso, há que considerar as preferências pessoais de cada umha. Nós vimos da Corunha, de Compostela e de Ponte Vedra. Todas as pessoas agora mesmo no projeto estarám dispostas a viver, seja em Corunha, seja em Compostela, seja em Ponte Vedra? Nom fica claro. Quando for o momento de concretizar, vai haver pessoas que digam: «Eu aí nom vivo!» Se tivéssemos um terreno fantástico, na primeira linha da praia, por exemplo, talvez seja mais fácil, mas isso talvez nom corresponda às nossas possibilidades.
Quando se falou deste tema com as potenciais sócias, houvo reações diferentes: «Na Corunha sim, se nom é na Corunha nom». Ou: «Se se vê o mar, vale-me qualquer lugar». Outras sócias querem estar perto dum hospital ou dum aeroporto. Quando se fala em teoria, é falar por falar. O que haverá é concretizar: ver terrenos e escolher. Mas a escolha depende de mais fatores, um destes que o governo municipal e a oposiçom ao governo municipal concordem em facilitarem o estabelecimento do projeto no território.
Comprar terreno para construir umha habitaçom familiar é umha opçom já legislada e nom depende do governo municipal, mas um projeto deste tipo é complexo. Segundo os nossos cálculos precisaremos provavelmente dum terreno de 20.000m2: já é difícil encontrar na Galiza terrenos tam grandes – a maior parte dos terrenos estám fracionados em partes mais pequenas – e para um deste tipo – ou seja, nom urbano – há que fazer um plano parcial que tem que ser aprovado pola Xunta e polo Concelho, sem ter em conta as variações eleitorais, tanto na Xunta como nos Concelhos. Tem que ser, portanto, um projeto muito consensualizado. Já visitamos uns terrenos, mas ainda estamos no princípio. Há que avançar em diferentes direções ao mesmo tempo: há que analisar terrenos que estejam em lugares adequados, falar com as autoridades para saber que interesse podem ter em facilitar-nos as cousas dentro do seu território. Ao mesmo tempo, há que entrar em contacto com potenciais novas sócias que contribuam economicamente e assim sabermos de quanto dinheiro estamos a falar realmente».
Idade e Saúde: requisitos de entrada
O projeto pode acolher desde o início pessoas com necessidades específicas de cuidado?
«Nós queremos ser solidárias, abertas a ajudar as pessoas, mas o projeto tem que ser realista e viável. Um requisito geral de entrada em todos os jubilares (cohousing sénior) é ser menor dumha certa idade – normalmente 70 anos – e estar em boa saúde. Este requisito é importante porque nos baseamos no cálculo dumha contribuiçom económica de 700 euros de todas as pessoas que vivem lá.
O que nom vale é pensar: «Eu vivo na minha casa e nom tenho que pagar 700 euros, porque estou bem, mas agora que tenho 82 e começo a sofrer dum Alzheimer vou a um jubilar e por 700 euros ao mês consigo que cuidem de mim e é mais barato que em qualquer residência». Isso tornaria inviável o projeto, sem considerar que nom seria um comportamento solidário. Ainda que agora o projeto nom seja completamente definido, imos estabelecer umhas limitações. Haverá, portanto, um limite de idade e agora estamos a pedir às pessoas que se associem que nom tenham dependências ou doenças. Consideramos que até que vivamos lá, sendo otimistas, vam passar polo menos 7 anos».
Perguntas, dúvidas e reflexões das assistentes
Luz López está em representaçom dum grupo amplo de famílias, e em particular dum coletivo muito específico, o das mulheres com crianças com diversidade funcional. Fala de mulheres porque a realidade atual é esmagadora: estatisticamente falando, filhes com diversidade funcional estám vinculades à vida da nai, por esperança de vida e por arquétipos culturais, sociológicos, etc. Ouvindo as companheiras da LarLilás entende que estas crianças ficariam fora deste projeto: nom som pessoas de 65-70 anos, tenhem umhas inquietudes determinadas, que correspondem às suas idades cronológicas e que hoje em dia ainda nom tenhem resposta da parte da administraçom. Estas crianças tenhem um alto capital social: embora dependentes, nom som cidadania de segunda, nem de terceira. Ela mesma, entom, poderia entrar na LarLilás, mas o seu filho? Ele já tem umha dependência.
Outra dúvida de Luz é onde estám representadas as mulheres rurais dentro de LarLilás? Nom é o mesmo umha mulher de 30 anos do rural ou do mundo urbano, assim como som diferentes mulheres urbanas e rurais de 65 anos. Mais que de questões económicas, Luz fala de maneiras de viver: umha mulher do ámbito rural pode ter umha boa posiçom económica para entrar no projeto, mas as suas referências culturais podem diferir e, por exemplo, preferir ter horta e jardim e nom praticar ioga!
A seguir, Luz fala de financiamento. Na sua opiniom é muito boa a proposta de “exportar” aos concelhos determinados serviços, como elementos de conexom com o povo e também como medida de financiamento. Contudo, aconselha entrar em contacto nom só com a administraçom local, mas também com as autoridades administrativas centrais. Há um capital intelectual, experiencial, vital e social mui importante, tanto para o contexto social, como para as participantes. Há estudos que demonstram como o ativismo das pessoas de idade favorece umha melhora na sua qualidade de vida e de saúde. Umha pessoa ativa intelectualmente consume menos recursos sanitários e sociais e isso há que evidenciá-lo.
LarLilás: «Tens razom, insistimos também neste aspecto nom tanto para pedir dinheiro ou subvençom à administraçom central, quanto para evitar obstáculos administrativos e burocráticos.
Estamos a oferecer soluções: somos a geraçom do baby-boom, imos saturar todos os serviços sociais que existem agora para pessoas idosas. Através do envelhecimento ativo eliminamos muitas dependências e problemas de saúde, porque resolvemos o grande problema da velhice: a soidade.
Quanto às mulheres rurais, LarLilás é um projeto em desenvolvimento: se há mulheres do rural que quiserem participar, vam fazê-lo. Às vezes mulheres urbanas e mulheres que vivem em ámbito rural movem-se culturalmente em coordenadas diferentes, de praxe e experiência de vida diferente. Mas isso nom implica que LarLilás seja um projeto que vete a entrada de mulheres com experiências de vida, exigências e necessidades diversas. Nom vamos construir LarLilás numha cidade, queremos estar num entorno peri-urbano, perto de hospitais, de serviços e mais. Que é o que pode acontecer? Que as mulheres rurais da nossa idade tenham claro que o cuidado delas seja responsabilidade des filhes e que sejam elas mesmas a nom ter interesse em projetos como o nosso. Contra disso nom podemos fazer nada e nom estamos a fazer nada específico para a incorporaçom das pessoas do ámbito rural, mas horta e jardim vamos ter! E mesmo animais para quem quiser. E ioga também para quem quiser!
O que sim figemos é que as limitações económicas para entrar na LarLilás sejam as menores possíveis. Noutros co-housing as despesas de desenvolvimento dividem-se entre as pessoas participantes e cada umha tem de pagar 150.000-200.000 euros para participar e xs filhxs podem herdar esta parte. De facto, cerca de 150.000 euros foi a quantidade que há 15 anos aportou cada residente na Travensol, que é proprietária desta partiçom do capital social e que xs filhxs herdam. Para reduzir estas despesas o nosso sistema é como um aluguer: todas vivem em aluguer, mas pedimos que cada umha pague só 40.000-60.000 euros iniciais para facilitar a criaçom do projeto. Mas este dinheiro nom dá algum direito de herdança; é em troca de pagar um aluguer. As sócias só terám que pagar a quota de 700 euros para os serviços porque entregárom a quota inicial.
Fernanda Pardo tem a impressom de que se trate dum projeto para umha “elite” cultural e económica, já que todas as sócias disponhem dum capital e procedem dum contexto cultural determinado. Além de dinheiro para residir lá, há, portanto, outros elementos a considerar para umha boa convivência na LarLilás, e um destes é a bagagem cultural comum que pode fazer sentir inseguras as pessoas que nom a tenhem. Contudo, parece-lhe um projeto maravilhoso, a melhor maneira de envelhecer! Hoje em dia nom existem geriátricos onde as pessoas, independentemente de quanto pagam, vivem como gostariam de viver: nom existe a possibilidade de escolher como queremos viver na velhice. As trabalhadoras nas residências poderiam mudar as cousas, mas nom as deixam e as pessoas que vivem nos geriátricos estám lá metidas até que morrem.
Deseja que se encontrem alternativas para quem nom pode permitir-se entrar em projetos como a LarLilás, porque há muitíssimas mulheres que recebem pensões nom contributivas e que tenhem como única alternativa económica viver nas residências convencionais por falta de recursos.
A mesma Fernanda organizou um projeto de co-habitaçom porque recebe umha pensom nom contributiva, que nom dá para alugar um apartamento para ela sozinha. Compartilha casa com umha senhora de cerca de 90 anos, que tampouco quer estar numha residência, quer viver como quer!
LarLilás: «Viver numha residência hoje em dia é viver num regime quarteleiro. Nom é estranho que as pessoas nom queiram viver nos geriátricos, se som autónomas. Por isso um projeto como o nosso – onde cada umha vive em comunidade, mas no seu apartamento – é umha soluçom fenomenal e que será cada vez mais frequente. É efetivamente um projeto elitista do ponto de vista económico: os serviços custam dinheiro, porque nom contamos com subvenções públicas. A LarLilás nom é um projeto de residências “clássicas”, nem respeita as dimensões das habitações familiares, nem dos espaços comuns dumha residência. Portanto, já teremos boa sorte se – mesmo tendo o dinheiro necessário – a burocracia nom nos impede de avançar porque o projeto nom encaixa nas características dos geriátricos “puros”. Imaginem só o que aconteceria se pedíssemos subvenções para sócias que nom poidam pagar as quantidades mínimas necessárias! Imos tentar conseguir 150-200 pessoas sócias e servirmos de modelo. E pedir ao estado que as residências que agora existem mudem de modelo».
Verónica Ramilo Grañas é trabalhadora social, estivo a trabalhar durante 20 anos no sector geriátrico, em residências, com pessoas com diversidade funcional. Viveu 18 anos na Catalunha e nos dous últimos anos trabalhou numha cooperativa que se chama Per viure que fai acompanhamento a projetos de co-habitaçom. Especializou-se precisamente em projetos de habitaçom para pessoas idosas e para pessoas com diversidade funcional e intelectual. Investigou este tema e analisou projetos em Madrid, Cuenca e Málaga: na Catalunha há abertura a projetos de co-habitaçom para pessoas com diversidade física ou intelectual. Refere que na página da Per viure há vários guias que elaborárom para quem queira iniciar este tipo de projetos. Desde a sua experiência neste ámbito concorda com a Fernanda sobre o caráter elitista destes projetos. Som elitistas porque, enquanto nom forem financiados pola administraçom pública ou por outras entidades, será impossível a participaçom de quem nom tem os recursos económicos. Na Catalunha há projetos de crowfunding para reservar e subvencionar vagas em projetos de co-habitaçom para pessoas sem recursos. Neste caso nom se trata de projetos sénior (para pessoas idosas), mas de projetos intergeracionais: nos projetos sénior há mais despesas e seria mais difícil pagá-las de maneira solidária. Haverá que buscar, entre todas, referências doutros projetos ou mecanismos para incluirmos estas pessoas. Além disso, quanto à colaboraçom com as entidades locais ou centrais, a Xunta da Galiza queria incluir na carteira dos Serviços Sociais os projetos de co-habitaçom sénior. Verónica acha fundamental que a LarLilás esteja incluída neste portfólio precisamente por questões económicas, para as sócias terem direito a ajudas e nom ficarem excluídas polo facto de participar num projeto nom reconhecido polos Serviços Sociais. No caso de nom reconhecimento, perder-se-ia o direito a umha vaga num centro geriátrico convencional e para a LarLilás é importante que haja algumha vaga em residência ligadas ao projeto.
Verónica luita desde há três anos para que a co-habitaçom seja reconhecida dalgum modo: em Cuenca no projeto de co-habitaçom Convivir conseguírom-no e também que nom seja a Administraçom a decidir que pessoal sanitário enviar ao projeto para cuidar das residentes. É a própria cooperativa que contrata pessoal. Além disso, através dum convénio com a Administraçom conseguem vagas em residências para pessoas dos projetos e mesmo vagas cobertas por pessoas com grande dependência.
Verónica levanta ainda a questom da perda da capacidade para decidir. Que acontece com as sócias que perdem esta capacidade?
Na Convivir conseguírom que a própria cooperativa seja entidade tutelar. Importa muito que todas nós deixemos por escrito quem decidirá polo nosso futuro, quem nos tutelará. Porque talvez aconteça que os familiares diretos levam a pessoa para umha residência quando ela luitou durante tantos anos para estar aí, mas já nom pode decidir.
«Na LarLilás estamos a trabalhar nestes temas. A Xunta de Galiza quer reconhecer o co-housing como um tipo de centro de cuidado de pessoas idosas. Mas este reconhecimento destina-se às grandes corporações – antes chamadas “residências” e agora “co-housing” – ou seja, aos mesmos negócios de sempre. A LarLilás participou com a REAS (Red de Economía Alternativa y Solidaria de Galicia) para apresentar alegações a este projeto, entre as quais a possibilidade de incluir o co-housing criado de baixo para acima, ou seja, a partir das criadoras e nom do capital que presta um serviço. Para nós, o testamento vital e o direito à morte digna fôrom sempre umha preocupaçom. Até agora na LarLilás pensamos em que umha residente poda ceder a outra residente a tutela, mas consideramos excelente a ideia de que a própria associaçom seja centro tutelar».
Mariola Mourelo apresenta duas questões. A primeira é o desafio de gerir as diferentes opiniões dentro da própria organizaçom nesta fase da LarLilás, e a segunda a honestidade do projeto, dentro das limitações do mesmo, que nom vai ser inclusivo a 100%, porque estamos num contexto em que se este projeto avança, já é um ganho e depois deste podem surgir outras experiências. Pergunta sobre a tomada de decisões das pessoas que se vam integrando no projeto, como se está a desenvolver, se já se estám a encontrar dificuldades e como se estám a resolver.
Montse: «É um processo apaixonante e há que ter muita energia. Já passárom anos desde os inícios, eu vivim sempre o projeto como umhas das cousas mais emocionantes da vida. Trata-se de materializar experiências e ativismo que se acumulam ao longo da vida e, ao mesmo tempo, chegar a pontos de conciliaçom, de tentar ajustar necessidades diferentes a um projeto que se afasta do modelo assistencial em vigor nas residências. Tudo isso é um absoluto desafio: todas as achegas de hoje fôrom mui importantes, fam-nos pensar e repensar constantemente o projeto para que seja o mais inclusivo e honesto possível».
Verónica: «Estou mui agradecida de que fagades este projeto porque me vejo aí. Tenho 44 anos, mas nom tardarei em juntar-me. Tendo trabalhado dentro desse monstro que som as residências, nom imagino o meu futuro aí. Vivim em comunidade e apesar das dificuldades, acredito nos projetos coletivos e agradeço-vos de verdade porque sei que os projetos pioneiros som os mais difíceis de realizar, porque está tudo por fazer. Para mim, é crucial a facilitaçom de grupos para a sustentabilidade do projeto. É importante prestar atençom a este ponto, fazer formaçom: muitos projetos nom se levam a cabo nom por questões económicas, mas por problemas no grupo. Sodes muito valentes por estar aí».
As companheiras da LarLilás farám novas apresentações a partir de setembro 2022: aprofundarám nos pormenores do projeto e convidam a escrever para o seu e-mail olarlilas@gmail.com, visitar a página web https://www.larlilas.com/ e o Facebook LarLilianas de LarLilás https://m.facebook.com/LarliLando/?locale2=es_LA
* Artigo publicado originalmente na Revirada, Revista feminista. Giada Maria Barcellona. É ativista feminista e forma parte da equipa editorial da Revirada.