Coordenador Nacional das Escolas Semente, docente no ensino público e colaborador habitual na secçom de educaçom deste portal, Santiago Quiroga tem vivido activamente, e de muito perto, a evoluçom deste projecto de ensino galego nascido da entranha do movimento popular. Com ele falamos da evoluçom desta rede de centros educativos, e das perspectivas de avanço do idioma, nomeadamente nos contextos mais árduos e hostis.

Poderias gizar um pequeno contexto daquele momento histórico em que nasce o projeto da Semente?

A primeira Semente nasce em 2011, a iniciativa da Gentalha do Pichel, o conhecido centro social compostelano. Corriam os tempos do mal chamado Decreto do Plurilingüismo e da eliminaçom das Galescolas. Estas foram umha experiência muito interessante de imersom linguística dos 0 aos 3 anos, pois permitia que o alunado que tinha o castelhano como língua inicial pudesse desenvolver a competência lingüística em galego, ao mesmo tempo que as crianças galego-falantes mantinham o seu idioma, sem serem desgaleguizadas como está a acontecer na atualidade. Neste sentido, o Mapa Sociolingüístico Escolar de Ames (RAG, 2011) sinala que de cada três crianças que entram no sistema educativo falando galego, so umha continua a falá-lo no ensino secundário.

Além disto, a aprovaçom do Decreto acarretou a diminuiçom da presença do galego no Ensino Infantil. Segundo um estudo da Mesa pola Normalizaçom Linguística do ano 2017, 76% dos centros de educaçom infantil realizavam o primeiro ensino maioritária ou exclusivamente em castelhano, frente ao 19% que manifestava tentar equiparar o uso de ambas as línguas. Já no Ensino Primário e Secundário reduziu-se a presença do galego do 50 % ao 33% nos centros “plurilingües” e exerceu-se umha grande violência simbólica contra o galego, ao banir-se das áreas científicas e tecnológicas. Recordemos neste ponto que um dos elementos centrais de toda normalizaçom é aumentar o estatus da língua minorizada, algo impensável sem a sua presença na ciência e na técnica.

Chegades entom à conclusom de que cumpre dar o passo…

Si, na altura formulou-se esta análise: os movimentos sociais tenhem que construir umha alternativa popular para o exercício dos direitos humanos -linguísticos, culturais e educativos- que nos pertencem como povo e, para isso, é fulcral a implicaçom direta da sociedade na construçom da escola nacional galega. Que ademais das Escolas de Ensino Galego Semente cumpriria termos instituiçons educativas públicas que caminhassem neste sentido? Com certeza, mas sempre tivemos claro que umha instituiçom nom é pública apenas em funçom da sua titularidade, senom da sua verdadeira vocaçom social. Portanto, se as instituiçons que conhecemos nom garantem a sobrevivência da nossa língua, temos a responsabilidade cívica e moral de construir nós essa alternativa no âmbito popular, ademais de articular contra-poderes no espaço do ensino público.

Qual é a evoluçom do projecto?

Em Compostela, a Semente encetou a sua caminhada com apenas 3 crianças e chegamos a 150 no passado ano; neste ano académico, devido a umha queda nos índices de natalidade, andamos polas 130 crianças. A tendência nestes doze anos sempre foi positiva, e em termos nacionais, sempre fôrom aparecendo novos grupos promotores e centros sociais interessados em espalhar a iniciativa. Com feitos como estes, com todo o construído até o presente, demonstra-se que o mito de que o nosso povo nom se importa com a língua é falso. Cada dia som mais as famílias e ativistas que chamam à porta para matricularem as suas crianças e para ajudarem com o que puderem: pintar e limpar a escola, organizar um jantar para conseguir fundos, planificar um concerto solidário, etc. No fondo de todo este trabalho subjaz umha convicçom colectiva: o futuro do galego depende de nós e, como dizia Novoneyra, a força do nosso amor nom pode ser inútil.

Quais som os vossos reptos no curto e médio prazo?

Agora mesmo andamos embarcados na abertura dum novo centro em Seixalvo, ao sul da cidade de Ourense, o que demonstra a importáncia de criar vínculos e redes com outros colectivos. Neste caso foi a associaçom de vizinhas de Seixalvo a que nos brindou o seu local. A importáncia do passo que damos é grande, pois todas sabemos que é precisamente nos grandes espaços urbanos e periurbanos onde o processo de desgaleguizaçom é mais intenso, eis a necessidade premente de ter umha Semente numha cidade como Ourense.

De resto, precisamos estabilidade económica, pois a nossa capacidade de expansom relaciona-se directamente com os recursos que puidermos mover e com a implicaçom da sociedade na fundaçom de novos centros. É por isso que estamos a planificar a criaçom dumha loja online, continuamos a editar material lúdico e didático, organizamos eventos e festas populares para angariar recursos, além de alargar progressivamente o número de pessoas associadas. Esta implicaçom popular amplia-se às instituiçons, no sentido mais extenso do termo, pois achamos que na defesa dumha educaçom científica, laica, inovadora e galega pode encontrar-se umha maioria social, e com ela queremos trabalhar.

No plano internacional, temos tecida umha aliança estratégica com as Ikastolas e colaborado em diversas ocasions com as Escolas Bressola, da Catalunha Norte. No passado mês de junho assinamos um Galeusca educativo no Museu do Povo Galego, reafirmando o nosso compromisso com a defesa da soberania educativa plena para as nossas naçons com o objetivo de garantirmos o exercício do direito universal a umha educaçom própria, situando as nossas línguas e culturas no centro do processo educativo.

Finalmente, queremos alargar a nossa oferta educativa. Atualmente temos a etapa de ensino infantil em todos os centros e a de ensino primário só em Trasancos e Compostela. Neste sentido, seria desejável contar com o ensino primário em todos os centros para garantir a continuidade do alunado no processo de escolarizaçom e, no futuro, poder ofertar ademais a etapa de ensino secundário.

Os últimos dados sobre usos do idioma, recolhidos polo chamado Instituto Nacional de Estatística, semelhavam ratificar o debalo do galego. Na vossa opiniom, estes dados actuam como um revulsivo para a acçom pro-língua, ou ao contrário desmobilizam.

Os dados incidirám dum modo ou doutro em funçom do discurso que lançarmos à sociedade e da capacidade organizativa que tivermos para criar alternativas políticas e sociais perante o vigoroso processo de substituiçom linguística. Na Semente apelamos sempre à esperança e à responsabilidade coletiva que temos como sociedade na hora de proteger o património imaterial coletivo mais importante que atesouramos: o nosso idioma.

O informe do INE mostra que 30% da mocidade menor de 20 anos tem mesmo dificuldade para se exprimir em galego, quer oralmente, quer por escrito. E se bem sabemos que este inquérito nom é tam rigoroso como alguns anteriores, elaborados por instituiçons galegas, aponta a umha tendência claramente negativa. No entanto, cumpre esclarecer que estas cifras nom som apenas o produto dumha última década nefasta para o galego no ensino, é antes bem o resultado de quarenta anos de institucionalizaçom dum sistema autonómico de representaçom política, cultural e linguística que aceita, legitima e reproduz a subalternidade.

A informaçom que temos na atualidade, dada a gravidade da situaçom, deveria convocar a todos os agentes sociais, políticos e sindicais do País na articulaçom duma estratégia coletiva que permita avançar na recuperaçom social do galego. Para atingir este objetivo, seria preciso melhorar a capacidade organizativa a nível social para a defesa da língua, avançar na necessária coordenaçom ortográfica do galego com o resto de variedades de português no mundo, desenvolver a Lei Paz Andrade e fortalecer o nacionalismo galego na administraçom de dispositivos de poder institucional que permitam desenvolver umha política linguística integral que eleve o status e o poder simbólico do idioma próprio do País.

Além de activista na Semente, tu mesmo es docente de primária no ensino público. Que se pode fazer pola língua nesta frente?

Precisamente falámos disto numhas jornadas organizadas pola Mesa em Alhariz recentemente, “Medrar em galego”. Dispomos de estudos recentes, como os realizados por Ana Iglesias, que confirmam que em contornos urbanos e periurbanos, a política lingüística familiar mantedora do galego fracassa porque a socializaçom idiomática das crianças noutros âmbitos dá-se em castelhano, por exemplo: na escola, nas atividades extraescolares, na vizinhança, nas redes virtuais… enfim, num contexto plural e complexo. Nesta situaçom, em que o alunado galego-falante é minoria, é necessário construir ecosistemas linguísticos seguros que permitam às crianças poder desenvolver-se com naturalidade, sem padecer o sinalamento e assédio linguístico que tem estudado para a nossa realidade Miguel R. Carnota no seu livro “Língua, poder e adolescência” e que cumpriria travar mediante protocolos específicos.

Na escola pública, precisam-se construir alianças entre o professorado pro-galego e maes e pais, fortalecer as ANPAS, promover iniciativas galeguizadoras através dos conselhos escolares e dos claustros e, em definitivo, construir contra-poderes que limitem os efectos desgaleguizadores da instituiçom educativa, como o sindicalismo soberanista e os movimentos de renovaçom pedagógica como Nova Escola Galega ou a AS-PG. Apesar destes esforços, devemos ser realistas e levar em conta que em contextos urbanos e periurbanos, sem garantir um contexto educativo imersivo em galego, as crianças galego-falantes demorarám pouco tempo em mudarem para o castelhano devido à importante influência dos pares -que possuem o castelhano como língua inicial- na construçom da sua identidade etno-linguística.

Nesta situaçom, em que todos os esforços som necessários, o ensino popular e público deveriam caminhar de maos dadas fortalecendo-se e nutrindo-se mutuamente. No entanto, quando se qualifica de resistencialista ao projeto da Semente, respondemos que é um dos poucos espaços educativos que garantem o mantimento e avanço da nossa língua na infância. Por este motivo, consideramos que a Semente pode ser um exemplo para o desenho das políticas públicas em matéria educativa e linguística no futuro. Modestamente, demonstramos que é possível desenvolver um plurilinguismo inclusivo através dum modelo que tem o galego como centro de gravidade, garantindo a aprendizagem de segundos e terceiros idiomas como o inglês ou o castelhano, para além do achegamento ecológico à realidade plurilinguística e pluricultural do Estado e do Planeta.