Em 2015 o executivo espanhol do Partido Popular, encabeçado por Mariano Rajoy, aprovava a Ley Orgánica de Protección de la Seguridad Ciudadana, conhecida popularmente como “Lei Mordaça” por supor um avanço na repressom das mobilizaçons sociais e um retrocesso nos direitos e liberdades básicos das pessoas. Esta semana, após quase quatro anos de governo PSOE-Unidas Podemos, confirmou-se que a lei seguirá em vigor, apesar de que a sua substituiçom por umha nova lei que eliminasse os retrocessos em direitos foi um dos compromissos do governo de coligaçom.
Com o habitual encenamento da política institucional, os grupos do governo e os seus parceiros parlamentares no Congresso espanhol culpam-se os uns aos outros deste “fracasso”. De umha banda, Podemos, ERC ou EH Bildu achacam ao PSOE a sua falta de vontade para eliminar os pontos mais polémicos que ainda nom foram objeto de acordo: as multas por alegadas “faltas de respeito” e “desobediência” aos corpos repressivos, o mantimento da presunçom de veracidade dos agentes, o uso de bolas de goma pola polícia e as devoluçons em quente das pessoas migrantes nas fronteiras. Pola sua parte, do partido de Pedro Sánchez acusam os seus sócios de impedirem umha reforma que suavizaria a lei vigorante em bases a “cálculos eleitorais”, apesar de ter sido o PSOE quem se negou a continuar o debate sobre os aspectos antes mencionados, apostando polo seu habitual “ou isto ou nada”.
Do lado policial, a maioritária extrema-direita representada por Jupol expressou a sua satisfaçom polo mantimento de umha lei feita à medida dos corpos repressivos espanhóis, atribuindo este desenlace à sua pressom.
Umha lei que endureceu a repressom aos movimentos populares
A Lei Mordaça foi duramente criticada já desde antes da sua aprovaçom por organismos de defesa das liberdades e polos movimentos populares. Na Galiza, o organismo antirepressivo Ceivar denunciava já na altura o corte das liberdades de expressom, reuniom e manifestaçom; considerando-a um mecanismo para frear os protestos sociais e um exemplo de Estado policial que, aliás, se somava à reforma do Código Penal que introduzia a cadeia perpétua revisável. Destacável é também o seguimento das consequências da aplicaçom da lei feito por Esculca desde a sua aprovaçom. Por outra banda, a CIG foi umha das organizaçons que mais incidírom nestes anos na exigência de derrogar a Lei Mordaça, consciente de que o controlo do ativismo sindical de rua é um dos objetivos do Estado espanhol.
A nível estatal e internacional a Lei de Segurança Cidadá também foi denunciada e combatida. Criticada até por meios como o The New York Times, a ONU ou Amnistia Internacional reclamárom a sua derrogaçom. No Estado espanhol, entidades em defesa dos direitos civis, sindicatos de jornalistas, movimentos em defesa do direito à vivenda ou associaçons de advogadas pressionárom em favor de umha nova lei que fosse além das limitadas mudanças propostas polo PSOE.
Nom é casualidade que entre os detratores da Lei Mordaça encontremos sindicatos ou coletivos polo direito à vivenda, entre outros movimentos sociais e políticos, dado que é o contexto de crise económica e política o que explica o endurecimento repressivo do Estado e a sua resposta autoritária contra os setores da sociedade que desenvolvem luitas reivindicativas ou procuram a superaçom do regime.
O importante incremento no número sançons a raiz da aprovaçom da lei dá conta do objetivo buscado. Segundo dados oficiais, só entre 2015 e 2020 fôrom impostas 1.358.659 sançons em todo o Estado; das 87.872 de 2015 a tendência foi ao crescimento até as 244.313 de 2019. Em 2020, ano das restriçons ao movimento impostas no contexto da COVID-19 polo Estado de Alarma (logo declarado inconstitucional), houvo um salto no número de sançons até chegar às 375.930, acentuando-se o emprego desta legislaçom como meio de controlo e disciplinamento sociais.
Outro aspecto a destacar da lei é a aposta por umha repressom “de baixa intensidade”, mais económica do que penal e dependente da arbitrariedade policial. Um modelo de “burorrepressom” em base a multas económicas impostas pola polícia, menos chamativo e que procuraria o desgaste do activismo e da militáncia sem provocar grande alarma social.
Um governo que incrementa a repressom
Com este resultado final do processo parlamentar que em teoria procurava a substituiçom da Lei de Segurança Cidadá, confirma-se que o bipartido PSOE-UP, longe de legislar em favor dos direitos básicos das pessoas e do rebaixamento da repressom cara os movimentos sociais, é um governo que endurece ainda mais a legislaçom nestes aspectos.
E é que, para além da continuidade da Lei Mordaça, cumpre lembrarmos o resultado do recente debate em relaçom com a reforma do delito de sediçom. No meio do bulício mediático sobre “concessons ao independentismo catalám”, a reforma do Código Penal finalmente aprovada incluiu penas de prisom por formas de protesto empregadas polos movimentos populares de maneira habitual como a realizaçom de cortes nas vias públicas ou a ocupaçom de oficinas e sedes, quando estas acçons comportarem uns vagos e nom definidos “actos de violência ou intimidaçom”. Neste caso, aliás, a reforma contou com o apoio de formaçons como ERC e EH Bildu.
Do mesmo jeito que sucede com outras reformas lesivas para o povo como as relacionadas com o ámbito laboral ou as das pensons, as regressons em direitos vam-se acumulando aos poucos e os retrocessos, sejam aprovados por gabinetes de direitas ou progressistas, vam ficando apesar das promessas eleitorais. Em questons como estas e apesar das apariências e do teatro parlamentar, partidos do regime como PSOE e PP vam de maos dadas. O incremento da repressom e o disciplinamento social som umha necessidade do regime, e essa seria a razom de fundo para que o PSOE figesse fracassar a derrogaçom da Lei Mordaça. A impotência, ou colaboraçom, da esquerda reformista também fica, mais umha vez, retratada. Para os movimentos sociais, sindicatos e militáncia independentista e revolucionária, ficará o trabalho de sobrepor-se à repressom, à arbitrariedade policial e ao afogamento económico.