Na passada semana, a entrega da medalha Castelao a Camilo Nogueira trouxo à tona umha corrente de simpatia com o político nacionalista que sobarda com muito as instituiçons. Nela há muito de coincidência ideológica, mas também (e nisto nom se repara tanto) umha espécie de identificaçom anímica. Nogueira fai parte dumha minoria no nosso país, os que consideramos que somos umha naçom e estamos dispostos, dum modo ou outro, a ensamblar as nossas vidas individuais com a causa colectiva; e a um tempo, o viguês foi durante boa parte da sua biografia a minoria dentro da minoria. As suas teses resultavam impopulares no nacionalismo, e por tal cousa foi vilipendiado. Dentro desta dupla minorizaçom, Nogueira mantivo-se sereno e em certo modo confiante. A passagem do tempo fijo amplamente secundadas aquelas ideias, e com as ideias, chegou a aceitaçom e também o aplauso da figura que as sostivo. Da mesma maneira que as formulaçons de Murguia e os seus regionalistas fôrom, um século depois, as ideias oficiais da Galiza autonómica (com bandeira, hino e parlamento incluídos), as ideias desprezadas daquele galeguismo moderado dos 80 virárom as ideias fortes do actual nacionalismo eleitoral.
Para além das muitas e fundas diferenças que o independentismo mantém com essa linha galeguista, sobranceia umha curiosa coincidência: ambos os ideários nascem como ‘minorias da minoria’. É saudável que um movimento nom se engane, e reconheça com naturalidade a sua dimensom numérica. Mas para além de saber que se é umha minoria, resulta chave decidir de que maneira se vivencia essa situaçom. Precisamente para deixar de ser minoria ou, quanto menos, para evitar que a minoria se transforme em marginalidade.
Somos seres gregários que precisamos umha certa paz de grupo para viver existências minimamente apacíveis, e frequentemente, as pessoas que aderem a ideários e identidades diferentes das hegemónicas, ocultam as suas querências para harmonizar nos grupos de iguais. Esta medida de autodefesa arraiza normalmente em traumas históricos e em episódios de perseguiçom, mas posteriormente, num gesto automatizado como sequela, transforma-se numha autocensura limitante, que obedece mais a medos irracionais do que a realidades objectivas de agressom e acoso. A fachenda e desenvoltura com a que a extrema direita loze os seus símbolos e discursos no nosso País, frente à cautela e vacilaçom exibida por milhares de nacionalistas à hora de manifestar a sua identidade, dá ideia dumha vivência acomplexada e impotente da própria condiçom. O auto-ocultamento fai-nos, numericamente, mais pequenos do que somos; e qualitativamente, mais covardes e inseguras do que devemos ser.
O processo contrário também existe, e todas as formas de contracultura tenhem incorrido, como reacçom a um excesso de timidez, a afirmaçons estridentes. Confirmar e amossar orgulhosamente a nossa trajectória é virtuoso, mas exercer a permanente comparaçom com os adversários é patológico e frustrante. O independentismo foi, como é sabido, perseguido com sanha polo Estado, lixado polos meios obedientes, deslocado às margens polo nacionalismo eleitoral e secundado apenas por umha porçom mui exígua da populaçom galega. Como cimento de grupo ante tanta adversidade, utilizou reiteradamente o autoenxalçamento, o moralismo e a acusaçom furiosa contra os considerados passivos ou cúmplices; como reacçom psicológica, é compreensível, e nela nom há nem rasto de malícia; mas como atitude política, é desastrosa. Representa a fase adolescente dum movimento social, aquela na que o apoio nom se procura no talento, na solvência e na resoluçom, senom na exibiçom de agressividade, empregada como um pobre substitutório da força real, que é sempre discreta e calma.
Finalmente, certa identidade minoritária pode ser abandeirada por sectores intermédios dumha sociedade, que habitam longe das zonas mais desfavorecidas, e que combinam umha certa opulência económica com a dissidência cultural. Desde a segunda posguerra mundial, a esquerda foi-se deslocando progressivamente da classe trabalhadora e do proletariado industrial, para se fazer forte nas chamadas ‘classes médias’, profissons qualificadas e funcionariado; expressons malintencionadas, mas ao cabo certas, como ‘gauche divine’ ou ‘esquerda caviar’ fam alusom a umha identidade política nom demasiado interessada em espalhar-se na populaçom, senom em ser utilizada como distinçom por parte de pessoas híperqualificadas, e mui satisfeitas de conhecer os problemas do mundo frente umha populaçom passiva e alienada. Parte do ódio popular a certa esquerda, mui bem explorada polo novo direitismo, bebe desta distáncia cultural e de classe, que as classes médias afundárom muitas vezes com discursos exquisitos e um contínuo afá diferenciador.
Por razons históricas bem conhecidas, razons estruturais e de mui longa duraçom, o independentismo parece abocado por um tempo a viver em minoria; porém, nenhum condicionamento o obriga a ser marginal: ninguém nos força autosilenciar-nos, nem a comparar-nos permanentemente em rivalidades tribais e de clam; a nossa composiçom de classe popular, fai absurdo que estabeleçamos qualquer distinçom com quem como nós sofrem e padecem para chegar a fim de mês, enfrentam carência de serviços públicos ou vem o seu entorno destroçado por depredadores ambientais. Qualquer condena a vegetar nas margens será ao cabo vontade nossa; qualquer avanço da causa será produto de sabermos o potencial imenso que atesouram as nossas -por agora- pequenas fileiras.