Lembro que quando era criança me mandaram mercar um atlas para a escola. Para mim, aquele livro era pesado, enorme, um livro para gente maior, e tinha que utilizá-lo para fazer um trabalho de geografia. Um sábado, depois da sobremesa, pugem-me a fazer o trabalho na mesa da cozinha quando meu pai ainda estava com o café. Viu que estava a mirar mapas e interessou-se polo que fazia.
–A ver esse mapa. Esse é o golfo de Leão! Os piores temporais da minha vida fôrom nesse golfo.
–E esse é o canal de Suez! Quantas vezes tenho passado por aí…, pensou em voz alta. Sentei à sua beira e começou a passar as folhas. Botamos horas a mirar para aquele atlas. E em cada mapa havia alguma história. Chegamos à conclusão de meu pai ter estado em quase todos os países do mundo com costa. E daquela ele não chegava aos quarenta e cinco anos.
Tenho pensado várias vezes naquela tarde. Quando era criança para mim era incrível que o meu próprio pai fosse como Willy Fog. Parecia-me uma sorte. Mas com o passo dos anos compreendi que o que viram os meus olhos inocentes como uma fortuna, para ele fora uma lousa. Tantas e tantas milhas no meio do oceano, tantos e tantos dias de solidão longe da casa. E como ele, os seus irmãos, os meus tios, também foram marinheiros. Pola parte de minha mãe o mesmo conto. O meu padrinho, na pesca do bacalhau primeiro, e depois em barcos petroquímicos alemães botou também meia vida longe da Terra. E antes do que eles, os meus avós também emigraram: um a Venezuela e o outro de marinheiro.
Poucos anos mais tarde daquela tarde de sábado, antes de meu pai deixar de navegar, o meu irmão mais velho marchou para Lanzarote. Estivo treze anos emigrado. Nesse período, o meu segundo irmão seguiu os seus passos e puxo rumo também para as ilhas. Agora, o meu irmão pequeno está em Djibuti.
Merda de atlas.