O sujeito da história nom pode ser senom o vivo produzindo-se a si próprio, tornando-se senhor e possuidor do seu mundo que é a história, e existindo como consciência do seu jogo.

Guy Debord.

Os atos que havia argalhados arredor dos 103 anos da I assembleia nacionalista animárom-me a passar todo o fim-de-semana em Lugo. A ideia de poder olhar a centos de galegos e de galegas de maos dadas, dando-se umha aperta quilométrica para arrodear a muralha, era um reclamo imbatível.

Cheguei o 19 de novembro, à notinha, e ainda que nom me desse tempo a fazer grande cousa, sim pudem tirar de enriba certa idealizaçom que levava comigo ao respeito da cidade. Achava que era um fortim para a língua, mas a primeira impressom que levei, quando saim a conhecer um chisco da sua vida noturna, tirou-me o véu de cima. Lá, dentro da muralha, ou quando menos nos dous terraços nos que sentei, pouco galego ouvim. De feito, acho que, nessas primeiras horas em Lugo, o único que me amostrou um chisco do sotaque local foi o taxista que me levou até a hospedagem.

O sábado acordei tarde. O ato de Via galega era às 11:30, e quando saim à rua as campas da igreja da Magdalena tocavam já as 11:00 da manhã. Subim ao passeio da muralha, pola sua Porta Nova, e a primeira imagem que tivem, desde aló em riba, foi a do Júlio Cesar fitando para mim. Umha imensa obra, a do grafite de Diego As, que colhera umha sona bem merecida. Mas que também amostra os níveis de dependência a partir dos quais construímos o nosso próprio relato. Porque de terem sido fieis à crónica da cidade, quem deveria estar aí debuxado, como mínimo, seria esse tal Augusti que saia no seu nome.

Atopei a Rua da Rainha graças ao som dumhas gaitas. A sua musica guiou-me até o hotel onde a I Assembleia Nacionalista se nomeara “desde hoje para sempre nacionalistas galegos já que a verba regionalismo nom recolhe todas as aspiraçons, nem encerra a intensidade dos nossos problemas”. À frente do hotel, fazendo um aceno coa mao, estava Castelao. Ao seu carom todo estava disposto: o atril, o equipo de som, a bandeira da pátria, a oferenda floral… O publico assistente ocupava o seu sitio, aquele recuncho da rua peonil pertencia-lhe. As três ringlas de cadeiras estavam cheias e o seu redor amoreava-se o resto da gente, que ficara de pé. Os Airinhos do Fiouco deixarom de tocar e tomárom a palavra às duas pessoas encarregadas de por-lhe voz a lembrança. Enxergárom o labor das Irmandades da Fala, lérom o que for o primeiro manifesto e logo voltou a música. Os participantes achegarom-se até a fachada do hotel, tirárom-se as fotos de oficio e depois de deixar a oferenda floral começou a soar o Hino, que deu por rematada a comemoraçom.

Pola tarde a cita foi com Estreleira.gal, no Centro Social Mádia Leva! A palestra trataria a situaçom da língua e da cultura galega em dous territórios que, a pesar de ficar de fora dos lindes institucionais, continuam a estar fortemente jungidos a nossa terra. Carlos Aenlhe, que apresentou o seu dicionário do galego de Astúrias, foi o encarregado de trazer a voz galega da comarca do Eu-Návia. No entanto que o sotaque galego da comarca d’O Berço o trouço Xabier Lago Mestre, quem apresentou o seu libro “El Bierzo provincial”. Ambos falárom do contido das suas obras, dos seus porquês e das travas que tiverom que enfrentar. Mas também nos pugérom ao dia da realidade que atravessam estas duas comarcas. Elas sozinhas tenhem que lidar com as investidas que tentam borrar a impronta galaica que abrolha na Galiza estremeira. Umha briga que fazem pola sua conta, com os seus próprios médios, porque as políticas e as relaçons formais com a nossa naçom som paupérrimas.

O domingo acordou frio. A brêtema era a grande protagonista, tingia-o todo de cinzento. Cheguei à muralha contra as dez da manha e no ponto de encontro, endiante da Catedral, estava todo quase listo. Um alto da praça faria de cenário improvisado. A decoraçom deste palco estava disposta: umha estreleira e umha bandeira sueva, penduradas de dous mastros, junto à outra estreleira que, em posiçom horizontal, acompanhava a faixa do ato. O seu lema, a mensagem da muralha humana: Adiante Galiza! Somos umha naçom.

Enquanto os músicos começavam a ensaiar, a afazerem-se com o equipo, algumhas das pessoas voluntárias foçavam na mesa de mesclas para deixar o som listo e na cima da fortaleça, sobre a Porta de Santiago, o resto do pessoal da organizaçom começava a espareger-se ao longo do percorrido: cada 110 m., 21 tramos, 2.260 m.

O som daquela cuncha deu por iniciado o ato. As forças de Lugus acudirom a sua chamada, a cumprir com o seu compromisso. O ponto de venda transformou-se, de súpeto, num ponto de informaçom e o ambiente mudo por completo. Do sossego da incerteza anterior passou-se ao bulir e ao balburdio descontrolado dos primeiros momentos. Passados esses retrincos iniciais de descontrolo a paisagem mudou, acalmou-se! A brêtema foi-se dissipando e o sol caiu sobre a meda popular que se distribuía ao longo da muralha. As vistas dos primeiros treitos da cadeia eram bem lindas. Os sentidos desfrutavam. Um murmúrio diverso enchia essa parte do monumento. A ideia da cadeia humana convertera-se num feito. Mas no tramo 12 esse aturujo batia de fronte com o silencio do bacio. Nesses 940 m. restantes a cadeia só estava representada polas equipas voluntarias. Essa foi a distancia que nos faltou para fechar a aperta, para termos convertido o desejo em realidade.

Baixei a olhar as quatro bandeiras gigantes, que se despregaram como umha miúda mostra do rico património simbólico que possuímos, e para quando voltei ao ponto zero o ato de encerramento já começara. Ante a catedral, testemunha fiel da historia desta anterga cidade, a gente desfrutava da atuaçom. A voz de Mero, junto a musica das suas acompanhantes, ecoava solenemente na praça. Despois tocou-lhe o turno à regueifa e por ultimo leu-se um comunicado que foi o sinal para que a gente se fora desfarelando, até que na praça só ficárom as pessoas encarregadas de recolher.

A viagem de volta até Vigo acalmou as emoçons e aparecérom as friagens da analise. Umha sensaçom agridoce. Por umha banda o doce das imagens vividas e, pola outra, a azeda impotência de nom ter atingido o objetivo. A impressom de ser vencidos pola realidade da quantidade. Mas é-nos preferível fugir dessas ideias produtivistas, sob as quais o êxito só depende do numero e tem-se que atingir à primeira intentona, porque nom somos dados nem números. Estes nom recolhem toda a amplitude da nossa narraçom.

Por isso é que prefiro ficar com o denodo que embebeu a convocatória. Com a confiança que pujo o projeto nas suas capacidades para construírem umha açom em positivo, animando-nos a reagir como sujeitos ativos da comemoraçom. Interpelando-nos a fugir da apatia e da liquidez dos tempos presentes, a criar novos acontecimentos cos que colhermos o relevo do passado. A sementar no porvir. Porque o do domingo nom foi umha simples comemoraçom passiva, ou a lembrança pontual dum ato passado. Foi a historia consciente fazendo-se pratica, autoconstruindo-se!

Sim! Faltárom-nos 9 tramos —6 estirando os cálculos— para completarmos o desafio. Embora esses tramos nom som a pegada dumha derrota, senom, mais bem, umha meta a bater. Nas nossas maos fica a possibilidade de fecharmos esta aperta. De convertermos à muralha de estreleiras num novo fasto histórico a relembrar.