Os manchetes da imprensa de grande tiragem levam dedicado neste outono um enorme espaço à alta velocidade ferroviária espanhola, anunciando que neste Natal, depois de dezassete anos de impaciente aguarda, a nossa Terra estará ligada com Espanha pola alta velocidade. As notícias dedicadas à inauguraçom das novas linhas eram movidas por duas consignas irrebatíveis: silenciamento totala às vozes críticas com o AVE, e tratamento marginal aos enormes problemas ferroviários de boa parte da Galiza interior.

Ao que parece, o 21 de dezembro vindouro Galiza e Espanha estarám mais perto que nunca graças à alta velocidade ferroviária. O que chamamos estritamente AVE unirá Madrid com a estaçom Ourense Empalme; e as ramificaçons de alta tecnologia que saem da cidade das Burgas para a Galiza atlántica som, estritamente, alta velocidade, desde que nom cumprem com exactidom as condiçons para chamar-se AVE. Seja como for, de 6 da manhá a 9 da noite, galegas e galegos poderám embarcar cada hora e média num comboio com destino à Meseta, que voará com umha bala, com apenas duas paragens pontuais em território galego: A Gudinha e Seabra, esta última na Galiza oriental.

Obras do AVE em Seabra. Imagem: La Region

Desde outubro, o executivo espanhol leva fazendo um certo esforço propagandístico na conexom serôdia do AVE a Galiza; esforço nom enorme, dado que a Galiza nom é das suas prioridades eleitorais, mais esforço ao cabo. Na construçom do AVE joga-se parte da rivalidade nas urnas dos dous grandes partidos da direita estatal, e na sua consumaçom tenhem também a ver os esforços de Isabel Pardo de Vera, umha galego-espanhola que preside ADIF, e com certo peso específico no PSOE. Já no mês de Outubro, Pedro Sánchez visitava a nossa Terra e propagandeava a ansiada chegada da alta velocidade.

O isolamento da Galiza interior

Por acaso ou nom, na semana imediatamente posterior à oficializaçom do AVE na Galiza, fazia-se público que a cidade de Lugo, a mais antiga do país, e um dos seus centros urbanos mais importantes, perdia a conexom com Compostela. Na página web de Renfe desaparecia qualquer mençom a umha linha que, quando existia, exigia transbordo em Corunha ou Ourense.

Doravante, na Galiza da alta velocidade, a cidadá que quiger ir de Lugo à capital do país por caminho de ferro terá que armar-se de paciência. Se quiger estar de manhá na nossa capital, teria que apanhar um comboio às 8,52 e chegar a Ourense às 10,36. Ali, se a pontualidade for perfeita, teria que embarcar no trem para Compostela às 10,38. Cumpre ter em conta que este transporte nom se concebe como umha só viagem, senom como duas, com a suba de preço que isso conleva. A alternativa que lhe restaria a tal pessoa seria dirigir-se à Corunha para dirigir-se logo ao sul, a Compostela: a dupla viagem, neste caso, levaria-lhe mais de 3 horas.

Estas carências, junto à inexistência de redes de cercanias ou a falta de electrificaçom na linha Lugo-Corunha, levou em passados dias ao BNG a se manifestar na cidade das muralhas, com a legenda ‘Menos promessas e mais conexons’. De mao do tenente alcalde da cidade, Rubén Arroxo, os nacionalistas denunciavam que Lugo ‘fica à margem da modernizaçom ferroviária.’

O AVE, intocável

Dados quantitativos manejados polo ambientalismo eram concluintes, ao assinalar o AVE como altamente demandante de energia, destrutor de espaços naturais valiosos (pola necessidade de túneis e viadutos, além de traçados de via em linhas rectas), oposto ao serviço de cercanias, e ainda produtor de poluiçom electromagnética nas áreas habitadas que atravessa. Na nossa naçom, as críticas ainda se poderiam reforçar se as ampliarmos às penosas condiçons de trabalho acelerado nos dezassete anos de construçom; tais obras cobrárom-se vidas humanas e fôrom regidas por condiçons draconianas, segundo a CIG assinalou reiteradamente.

Porém, e apesar das evidências em contra destes mega-projectos, apenas o independentismo, o movimento anarquista e o ambientalismo se manifestárom contrários na primeira década deste século, face o consenso absoluto de todo o arco parlamentar.

Consumado este macro-desenho espanhol, hoje Lugo está mais perto de Madrid que da capital do país; mas nom só, porque no desenho radial espanhol, até a internacionalizaçom galega está coutada: se podemos pisar Madrid em comboio em menos de três horas, umha galega demorará em chegar a Barcelona 12 horas e 43 minutos. Apenas três horas menos do que demorava esta viagem a inícios do século XX.

Isabel Pardo de Vera, presidenta de ADIF, umha das grandes valedoras da conexom galega do AVE. Imagem: El Correo

A concepçom radial das comunicaçons espanholas é tam evidente que mesmo deu lugar a um pequeno choque diplomático entre Madrid e Lisboa: no Cúmio Hispano-Português de 2020, Ana Abrunhosa, ministra portuguesa, manifestou que a prioridade lusa era um AVE entre Porto e Vigo, antes do que entre Lisboa e a capital espanhola. Tal proposta provocou malestar na delegaçom enviada polo PSOE.