Venho de trabalhar durante um ano num dos arquivos dependentes da Junta da Galiza. Eu era umha bolseira em formaçom. A cousa soava bem: aprenderia cousas bem interessantes trabalhando enquanto cobrava algo parecido a um salário. De feito, se se mira desde a situaçom geral das trabalhadoras do país, a cousa está bastante bem: jornada laboral de segunda a sexta-feira, um ritmo de trabalho acessível, os feriados nom se trabalha… Isso sim, sem direito a férias nem a dias livres… mas que se lhe vai fazer, nom? O delirante é que cada vez mais nos acostumamos a estas cousas, estamos normalizando a precariedade a uns níveis cada vez mais alarmantes.
A teoria era que eu estava ali para aprender. No entanto, tinha o mesmo horário que as trabalhadoras e assinavam-se-me tarefas que cumprir do mesmo jeito que a elas. Ainda que eu trabalhava como elas, o meu salário nom chegava nem ao soldo mínimo. Tampouco tivem, como dixem, direito a férias nem a nengum dia livre em todo o ano que passei ali. Se me pugesse enfermo, os dias que nom assistisse ao trabalho por esse motivo seriam descontados do meu ínfimo “soldo”. O único suposto contemplado nas bases da bolsa de formaçom para ter algo parecido a umha baixa laboral é se tens que parar de trabalhar por mor de um embaraço. Todas as horas que as bolseiras lhe “devessem” à Junta deviam ser recuperadas.
Das bolseiras que iam a arquivos municipais, as que tinham sorte iam a destinos nos que havia umha arquiveira que atuava como a sua titora, mas noutros destinos nem sequer contavam com umha titora presente no arquivo que lhes explicasse como deviam realizar o seu trabalho (em teoria, estavam-nos formando), eram abandonadas no arquivo do concelho (muitos deles em condiçons deploráveis) e tinham que pôr-se a classificar e ordenar, muitas vezes desde zero, toda a documentaçom municipal. Quando ocorria isto último, era a bolseira a que cumpria as funçons de técnica arquiveira. A sua titora era na teoria a responsável do Sistema do Serviço de Arquivos, à que veriam duas ou três vezes de jeito presencial e um par delas mais de jeito telemático. Na prática isto convertia-se em que te arranjasses tu soa como pudesses. Nalguns casos incluso umha bolseira anterior formava a nova bolseira que entrava.
Faziam-se de vez em quando cursos desde a Junta, para que as bolseiras soubessem desempenhar o seu trabalho, mas nom os suficientes para considerá-lo umha formaçom séria. Consistiam em duas reunions telemáticas, duas presenciais e um curso que se impartia durante menos de cinco horas umha manhá, em Santiago de Compostela.
O pessoal dos arquivos municipais emprega a ferramenta Arqa. As bolseiras nestes postos chegárom a ter algumha reuniom com a titora e com o pesoal da empresa concesionária, na que fôrom as bolseiras as que lhe notificárom à empresa os erros detectados no programa.
Como mencionei antes, o sistema de eleiçom na bolsa é um concurso de méritos. Em funçom deste, constitui-se umha lista de bolsas de emprego na que se vam cobrindo as praças. Normalmente cobrem-se primeiro as dos arquivos históricos e intermédios da Junta, enquanto que as dos arquivos municipais em concelhos pequenos ficam ao final. Isto é um contrasentido em relaçom à pretendida funçom formativa das bolsas, já que nestes últimos adoita nom haver titora do próprio arquivo ao nom existir nengumha arquiveira. Como dixem, a titora é entom umha pessoa que se atopa em Santiago de Compostela e com a que quase nom tens relaçom.
O certo é que dos arquivos ofertados como destino, só 9 estám geridos pola Junta da Galiza. Os restantes som arquivos municipais, que pertencem aos concelhos, que tenhem a responsabilidade da sua gestom. Nom parece que tenha sentido logo que a Junta convoque bolsas de formaçom para mandar gente a trabalhar para os concellos, deveria ser o próprio concelho o que convocar essas bolsas.
Isto dá como resultado que as bolseiras se convirtam em mam de obra de balde para os concelhos, que tenhem sorte quando lhes som assinadas bolseiras com experiência, pois estas organizam-lhe o arquivo municipal, que na maioria dos casos está sem começar a classificaçom e catalogaçom. No caso de que as bolseiras nom tenham experiência pode ocorrer, ao estarem elas soas trabalhando sem titora, que a catalogaçom do arquivo nom seja de todo o correta que dever, o que também repercute no prexuízo da cidadania e dos seus serviços públicos de arquivos.
Nas bolsas de formaçom, tanto de arquivos como de bibliotecas, havia pessoas que já tinham umha longa experiência laboral e que se acolhiam a estas bolsas porque era um dos poucos empregos aos que podiam aceder. Assim, temos bolseiras em formaçom com 55 anos, já suficientemente formadas, e que o único que desejam é um emprego digno, difícil de atopar neste tempo do capitalismo tardio.
Também nas bibliotecas, as bolseiras desempenham tarefas que deveriam desempenhar auxiliares, ajudantes e técnicas. Faltam trabalhadoras, mas a Junta nom saca essas praças e as bolseiras fam a labor das trabalhadoras que nom há. Logo as trabalhadoras levam a maioria dos méritos do que figérom as bolseiras, que parecem nom existir na maioria de apresentaçons ou atos oficiais.
Para que as bolseiras das bibliotecas aprendam a desempenhar o seu trabalho limitam-se a dar-lhe umha palestra sobre Koha (um programa de gestom de bibliotecas) e outros aspectos sobre bibliotecas. As bolseiras dalgumha biblioteca sim que tivérom a oportunidade de realizar cursos de formaçom oficiais ao igual que o resto das trabalhadoras, mentres que outras nom, o que demonstra que nom existe umha política unificada ao respeito da formaçom das bolseiras, que em teoria é o principal objetivo da convocatória da bolsa.
De um dia para outro chamárom-nos para que acudíssemos ao Gaiás ao nosso nomeamento. Esse dia tivemos que escuitar um discurso valeiro e hipócrita do Secretário Geral de Cultura. Desde o primeiro deixou-se-nos claro que isto nom era um contrato de trabalho, mas também se nos deixou claro que tinhamos que trabalhar com o mesmo horário que as funcionárias. A responsável do Sistema de Arquivos explicou-nos todo o que devíamos fazer. A pessoa encarregada de resolver as nossas dúvidas nom parecia sentir-se cómoda ao perguntar-lhe polos pagos que recebíamos cada mês. Decatei-me depois do motivo polo que nom lhe resultava cómodo respostar estas perguntas. Muitas vezes a Junta atrasava-se nos pagos; o primeiro mês nom nos pagárom até passada umha semana do mês seguinte. Logo soubem que a pessoa à que dirigia as minhas perguntas é liberada sindical de CCOO; curiosa maneira de defender os direitos das trabalhadoras. Como digo, nom havia vacaçom nem dias livres durante um ano inteiro. Várias pessoas enfermárom e descontárom- se-lhes todos os dias que faltárom ao trabalho da nossa já ínfima retribuiçom mensual. Incluso quando as bibliotecas reduzírom a sua atividade em fevereiro por mor do coronavírus as bolseiras seguírom trabalhando o mesmo. As ordens da Junta fôrom que na biblioteca estivessem cada dia só o 50% das trabalhadoras para evitar contágios. Contudo, as bolseiras nom contavam nesse cálculo; imaginamos que somos imunes ao vírus polo feito de sermos bolseiras… Algum arquivo histórico chegou a incluir as bolseiras nestas medidas de proteçom frente o covid e recebeu ordens diretas do Secretário Geral de Cultura de nom fazê-lo, o que di muito do que lhe importa a saúde das pessoas à Junta quando nom dá réditos políticos. A bolsa tinha umha duraçom de 6 meses, prorrogáveis a outros 6. Até o penúltimo dia do ano, 30 de dezembro, nom soubemos se nos iam renovar ou nom; o que demonstra umha vez mais que para a Junta somos meras ferramentas de trabalho, nom pessoas.
Ainda por riba, as pessoas de algumha biblioteca nem sequer obtivérom um documento oficial que lhes confirmasse que foram renovadas, somente lhes dixérom o dia 30 que o dia 2 tinham que acudir a trabalhar.
Depois de um ano trabalhando e em teoria formando-te para desempenhar um trabalho, dam-che a patada e, apesar de estar cotizando 12 meses, nem tés direito a paro nem a subsídio por desemprego. Logo, para o ano, virám outras bolseiras a desempenhar os piores trabalhos e quitar-lhe carga de trabalho à Junta, que nom contrata mais trabalhadoras que fam falta por aforrar um dinheiro, e assim a roda segue girando. Há bibliotecas e arquivos da Junta da Galiza que se sostenhem a base de bolseiras. Este é o modelo que os nossos governantes querem para Galiza: a precariedade e a exploraçom laboral. De que maneira imos construir as nossas vidas as pessoas jovens com esta incerteza permanente? Como estes contratos de bolseiras quase sempre agocham que o que realmente somos é trabalhadoras com um soldo irrisório e sem direitos laborais, é complicado reclamar nada, há que demonstrar que realmente temos umha relaçom laboral encoberta. O governo espanhol, autodenominado o mais progressista da História, com umha das suas medidas estrela, que leva anunciando vários anos, a reforma laboral, pretende acabar com estes contratos mas realmente o que vai fazer é que sejam ainda mais longos e perpetuar a juventude nesta precariedade. Ante isto,
o único que nos resta é o apoio mutuo, a solidariedade de classe, organizarmo-nos e defender os direitos da classe trabalhadora. Por último gostaria dedicar umhas palavras de agradecimento às pesoas que me ajudárom a redatar este texto, pois sem os seus relatos e os seus apontamentos sobre a redaçom do artigo, nom teria sido possível.
Autora: Umha das militantes de CNT Galiza, quem prefere nom dar o seu nome polas possíveis consequências que puder ter o escrito.