Há uns dias o meu pequecho de 7 anos quijo conversar sobre a nossa classe social. Suponho, que trás ver em mim um rosto constante de preocupaçom cada vez que umha atividade ou procura na nossa vida requeria sacar o peto. O caso é que, sem saber ele que estávamos a começar umha pequena classe de sociais, mesmo de filosofia e, o mais importante, de consciência social, começou;
—Mamã… Nós nom somos nem ricos nem pobres. Nom o somos porque nom temos muitos quartos, mas tampouco temos nenhuns… Verdade?!
A mim encolhéu-se-me o coraçom. Caiu-me todo o peso dos valores que inscrevim ao meu/seu redor para brindar-lhes segurança emocional e física na infância. O certo é que tenho que explicar-lhes acotio às minhas filhas que nom podemos mercar o que desejam. Que o consumismo é produto dumha sociedade enferma que procura obter felicidade por meio de cousas, namentres para isso destruímos a nossa contorna e às pessoas. Que os quartos que eu ganho som precisos para garantir umhas condiçons mínimas de bem-estar no fogar.
Mas o que me geou o corpo coa breve dissertaçom do meu filho foi trazer a esse momento a própria experiência vital da que devenho. Um nicho familiar com dificuldades económicas e onde a comparaçom coas minhas supostas iguais era inevitável. Também aquela vergonha constante por pequenos detalhes como convidar às amigas à minha casa e por de merendar “cremes RenyPicó” de brick que nom havia no mercado e que promocionava a Cruz Vermelha.
Lembro sentir vergonha toda a minha infância e mocidade. Também muita mágoa pola minha nai e o seu talante sempre esgotado e preocupado. Sorria poucas vezes e estava estresada a maioria delas. Entrementes eu, esmerava-me por ocultar essa realidade entre o meu grupo de “iguais”. Cuido que ainda arrasto na minha pessoalidade moitas destas vivências. Como quem leva um sinal dum grande golpe ao que sobreviveu. Depois duns segundos tendo todo isto na minha memoria, traguei saliva, mirei-no aos olhos, e contestei-lhe;
—Amor! O que acontece é que estás a medir quem somos em base aos quartos que temos ou a ter cousas acumuladas. E fas tal porque estás a aprender fora da casa que isso é o mais importante, o que nos caracteriza. Ainda que a maioria che assinale tal, é um erro dar tanto valor a isto. Podemos falar de riqueza e pobreza em base ao tempo disponível para viver. A como e onde o empregamos e a/ou quem. Como nos sentimos de felizes ou plenas dento de nós mesmas e entre nós. Acho que nós nom somos pobres de nada disto e que estamos cheias de tempo juntas e de planos que nom custam quartos, mas que nom som menos importantes. Medir quem és polo que tens é um erro, e é a trampa disso do que me ouves falar a miúdo, o capitalismo.
O meu rapaz ficou calado. Nom dixo nada e continuou jogando ao seu. Seguro que marchou certamente desconforme porque esperava obter umha resposta concreta de si tínhamos quartos coma a meia social ou se éramos pobres. Mas eu, um pouco por covardia e proteçom, e também polos meus desejos de amostrar-lhe a viver doutro jeito, preferim dar-lhe essa volta para garantir onde deveria por o foco da sua vida.
Sempre digo que as minhas crianças som grandes mestras e, obviamente, este episódio nom ficou no meu interno sem mais, senom que deu passo a um processo de medo e de dúvidas posteriores que tornárom em dor e bágoas. O certo é que, de algum jeito, penso que dulcifiquei a nossa realidade e fum algo percussora da romantizaçom da pobreza e de todos os malditos discursos positivistas que nos invadem socialmente. Ainda que cuido que nom fixem mal aos olhos do meu pícaro, sei que isto nom pode ir ilhado de negar-lhe a realidade progressiva das classes sociais, do capitalismo e do patriarcado que golpeia a umhas mais que a outras.
Animo a sair do armário a aquelas pessoas que, coma mim, vivem dentro do armário da pobreza. Deixo escrito para elas e, sobretodo, para as minhas nenas, que podemos ser pobres mas que temos que empenhar-nos em luitar por abolir a lacra da diferença das classes sociais. Eu nascim pobre. Tivem momentos na minha mocidade e na idade adulta de desenvolver-me no engano da procura capitalista da acumulaçom material a cambio do meu tempo. De achegar-me ao que os ianques chamam “o sonho americano” mas à espanhola. Voltei à pobreza aos poucos de esgotar baixas, subsídios por maternidade e após verme na obriga de eleger entre trabalhar 10 h e pagar-lhe a metade do meu soldo a outra mulher coma mim ou mais precária, ou trabalhar 5h e ficar com os mesmos quartos acompanhando eu mesma as minhas crianças. Som moitas as vezes que sentim que se me julgava por nom artilhar outra soluçom. Por nom assumir trabalhar a jornada completa e substituir-me a mim mesma do meu papel de nai e cuidadora, ainda que isso supugesse uns ganhos/gastos de conciliaçom que originassem o mesmo resultado.
Sentim e sinto culpa pola minha eleiçom vital. Por ser esta umha atividade que nom me “realiza” segundo umha parte do feminismo hegemônico e liberal e que nom resulta desejável nem umha opçom para os homens, que som os que mais poder acumulam. E é que isso que nom tem valor financeiro, nom tem importância. Desgraçadamente, tal é coma já está integrando o meu filho de sete anos. O capitalismo ademais de patriarcal é especialmente agressivo coas mulheres, revitimiza às mesmas fazendo-as sentir culpáveis da sua pobreza. Levo anos sacudindo-me estes juízos externos e mesmo internos. Mas também levo anos interiorizando a certeza da minha eleiçom como correta, ainda que me siga a parecer injusta.
Injusta porque o capitalismo é ainda mais macabro se és mulher. Injusta porque umha grande quantidade de mulheres, as de classe mais baixa, tenhem que escolher entre sumir-se mais na pobreza ou abandonar es filhes nas maos que podem pagar ou nas das avós que já fôrom oprimidas tempo atrás. Todo isto enquanto continuam a ser pobres e com o risco pertinente de que es sues filhes se perdam no caminho ou empiorem a sua árvore familiar por falta de guia.
Injusta porque segue a perpetrar-se à classe social baixa enquanto nos vendem a ideia de que somos culpáveis de ser pobres. Injusta porque este nosso sistema cuida que resolve estas desigualdades a golpe de costear, com os quartos de todas, insultantes permissos retribuídos aos pais. Quando a realidade é que a pobreza e a necessidade de conciliaçom nom som imediatas se nom acumulativas e chegam igualmente e depois dumha baixa de 4 meses.
Injusta porque ainda sendo vítimas de esse capitalismo patriarcal sentimo-nos culpáveis e fracassadas. Injusta porque sentes que és demasiado pequena para luitar contra tal monstro e porque seguiremos a ser pobres por muito que pelejemos se o fazemos soas.
Este verão explicava-lhe a umha amiga, dessas que quero bem, quanto de mal me fazia sentir o feito de ter que solicitar umha ajuda institucional pese a precisar esses quartos. Que mesmo sentia desejos de nom fazê-lo. Que queria ver-me soberana da minha própria subsistência e que de nom ser possível, seguro reacionária cara outro lugar no que nom me permitia estar por sentir-me de certo jeito acomodada. Agora mesmo acho-me nesse lugar e dou-me conta que estava daquelas a reproduzir o nojento discurso da meritocracia. Ganhei dende entom realidade e perspectiva e dou-me conta de que o que me paralisa a solicitar ajudas é assumir o papel que tivo a minha nai.
Aceitar que estou a repetir de certo jeito os passos dela porque som umha mulher que, a dia de hoje, nom podo garantir-me pagar-lhe os estudos superiores às minhas filhas. Sem capacidade de aforro, nem de chegar a fim de mês dende há uns quantos meses. Nem quem de mudar o nosso paradigma social. Assumir que devo solicitar caridade quando tinham que ser direitos de mínimos para todas, onde se cobrisse umha vivenda digna, a alimentaçom, as subministraçons e o desenvolvimento físico e emocional. Aceitar a classe social à que pertenço e à que o sistema me obriga a pertencer para, assim, suster os privilégios e luxos das que estám na cúspide da pirâmide. Assumir que a humanidade nom está disposta a soltar tais privilégios e que isso de “ninguém ficara atrás” nom é mais que propaganda.
Assumir que me toca empreender o vergonhoso e maltratante processo de solicitar ajudas, lidar coa minha própria fenda tecnológica, os juízos do sistema ao que lhe tes que demostrar que a tua pobreza está suficientemente à altura do arraste, chamadas intermináveis, o tempo que me resta da meia jornada de trabalho que tenho pom-se em risco cada vez que falho para estar presente neste tipo de tramites inesgotáveis. Aceitar que me toca sair do armário da pobreza e assumir que som digna de mágoa, de colocar-me no lugar de “pobrinha” que tam incómodo nos resulta às pessoas com dificuldades económicas.
Depois de enraivar e chorar nesta costa de janeiro, armo-me de valor para sair deste armário e convidar ao resto a fazê-lo com orgulho. Porque a nossa posiçom deve ser afrontada coa honra da nossa luita, que dê por resultado a vergonha no lugar correto, o das classes mais altas e dominantes.
Igual que fai o feminismo com o machismo, as neurodivergentes e diversas de mobilidade contra o capacitismo, a loita da comunidade LGBTIQ+, antirracista e antirrepressiva contra o fascismo. É preciso amossar publicamente que isso “do todo bem” somente se pode verbalizar se és a dona do privilegio. Algo que resulta insultante para as que sabemos que a nossa ansiedade, estrés e/ou depressom som resultado de estar na contínua vigilância pola supervivência.
Som pobre. Nom som culpável disso, se nom que o som como resultado da herança dum sistema de classes que nos organiza de tal jeito.
Mas também som abolicionista do capitalismo patriarcal e aguardo a que as minhas crianças jamais sentam vergonha de quem somos. Gente cheia de vida, que luita por pô-la no centro e abolir as relaçons de poder.