Aquela manhá saíra tarde do lar. Davam já as onze, e eu ainda começava a subir pola Avenida de Madrid. Polo que, com sorte, ia chegar à mobilizaçom que convocara a CIG, o passado 15 de dezembro, quando esta estivera a piques de rematar. Mas, ao final, tivem boa fada. Atopara um oco para estacionar perto do concelho e, graças a isso, dei chegado com tempo davondo para ajejar o ambiente. Isso sim, voltei dela sem dar tirado aquele ruge ruge dos meus miolos. Bom, melhor dito, sem atopar o porquê daquela convocatória que semelhava feita com certa lacha. Se até alguns dos representantes, aos que com tanta insistência convocaram, estavam alô sem saber mói bem a que foram. «Eu vim cavilando que era umha assembleia nossa, pro mira-se que nom… Suponho que será pola crise», dixera-me um deles.

Desde as ruas colindantes nom havia nem rasto da concentraçom. Eu baixara pola Rua do Castro e só se ouviam os seus coros e bruidos: “contra o paro, luita obreira!”, ”na nossa terra, trabalho digno!”, ”queremos trabalhar, e nom emigrar!”, “sem trabalho, nom há futuro!”… Nom a mirei até ter baixado um dos treitos das escaleiras da praça. Lá embaixo, às portas do concelho, estavam os e as representantes da CIG com todo o seu afeite: duas faixas à frente e as bandeirolas ao ar. Ainda eram umha multitude jeitosa. A olho rondariam a centena de pessoas congregadas naquele buraco.

Sim, pronto. Conseguiram ajuntar mais gente da que trouxera acô a CUT, quando figera a concentraçom “contra o confinamento dos serviços públicos”. Nom era para menos. Tampouco aguardava outra cousa. Já que estamos a falar do sindicato que noutrora vinha marcando o passo nas ruas do país. Por isso, precisamente por isso, por estarmos a falar do que se gaba de ser o sindicato maioritário da Galiza, do que tem fama, ou quando menos tinha-a, de guerrilheiro e de cumpridor, polo que esta convocatória ainda se me fazia mais rara: numha praça afastada do trânsito, longe de miradas indiscretas, perante um consistório que nada pode fazer para amanhar o devir das nossas realidades; e que, ainda por riba, e coma se for cousa de meigalho, estava deserto. Nem rasto das ringleiras que decotio aguardavam às suas portas… Para isto ficou a CIG? Porque tanto interesse em assinalar que era para representantes? Era umha maneira de obriga-los a vir? Havia medo de que, de fazê-la “aberta”, fosse um fiasco? Nom há miséria de avondo para fazermos umha greve geral?, aquele runrum outra vez… Por um intre, cavilei que poderia ser pola situaçom atual. Por mor do becho. Que assim tentavam evitar-se problemas, críticas e má-imprensa. Embora, descartei-no rapidamente. Se o que querem é botar-lhe merda, nom precisam nengumha desculpa. Amais, há medidas de “seguridade” e sobram os exemplos de como fazer manifestaçons nesta nova-normalidade. Bem saberá a CIG destas cousas, digo eu! Porque se vai aguardar a que escorrente todo isto para batalhar, coa que esta a cair, imos aviados!

Continuei baixando pô-las escaleiras, até situarem-me ao seu rente. Aí estava a CIG, o sindicato maioritário, como relembrava o alto-falante, agochada naquele foxo. A sua situaçom naquela praça, o lugar no que ficavam aquelas pessoas, era bem ilustrativo da atualidade do vindicalismo galego. Da realidade dumha classe encerelhada numhas dinâmicas que ficavam bem simbolizadas nos pontos cardinais que a flanqueiam.

À sua frente, na lomba do monte d’O Castro, a Cruz franquista. Espreitando dende as alturas. Lembrando-nos os tempos da hostilidade sem caroutas. Da violência que enxergam os peixes gordos quando vem perigar a sua empresa, quando o povo reclama a sua muinhada. Avisando-nos do confronto que está porvir. Da necessidade de sair-lhes ao passo. De nom deixarmos espaço para às políticas do odeio que, agora que as sociedades capitalistas se afundem nas suas misérias intrínsecas, emporcam o país com a sua voxta. Umha força de choque que tem todo o aparelho do estado ao seu prol. Que aproveitará as incongruências, o boismo e as comodidades nas que caírom os sindicatos combativos para fazerem-se fortes no meio laboral. Nom se andassem com “mixiricadas”, falassem com contundência e lançassem as suas frechas à caça de bruxas entre a nossa classe. Pelejassem e nos ajustiçassem sem nenhum tipo de restriçons legais ou morais.

À direita, agachando o sossego da Ria, com a sua cor formigada, a panificadora. Umhas ruínas, como as de tantas outras empresas caídas na bancarrota, por mor da avareza e do desleixo, que aguardam a que a especulaçom lhes atope novos usos. Conformando um quadro urbano que nos relembra as consequências de deixarem-se ir, de caminharmos coa cabeça baixa, entrementes quatro avarentos extraem toda a riqueza da nossa terra e dos nossos corpos. Umha visom evocadora que amostra a situaçom de aniquilamento na que se atopa a loita popular, depois de décadas de repressom e incúria. As ruínas, isso é o que fica! Topamo-nos submersos nelas. Imos a deriva, à mercê dumha concentraçom vertical contínua. Dum empobrecimento ativo, que faz que lembremos cum degoiro magoento a estabilidade e os salários daquelas lúgubres carreiras laborais.

Às suas costas, vigiante e com a sua burocracia preparada, o ajuntamento da cidade. Encarnando a urda da institucionalizaçom na que se encerelha à luita sindical. Tentando nom desbordar às calejas oficiais. Que a situaçom atual nom vire numha crise social que quebre a comodidade do sistema. Convertendo-o, ao sindicalismo revolucionário, que deveria atuar coma a ponta de lança que artilha-se tudo o mal-estar gerado polos conflitos (laborais), que florescem por todas partes e acotio, num sindicalismo de concessons (mutuas, serviços mínimos, reconversons, empresas de emprego temporal, etc.) e bem acomodado nos tempos e dinâmicas de palácio. Mais preocupado polo numero que pola qualidade e a contundência do movimento. Umha saca sem filtro no que entra e val todo, incluso desclassados e espanholistas; descuidando a rua e o uso da nossa língua. Todo com tal de atingir, ou seguir ostentando, o titulo do “sindicato maioritário” da Galiza. Atacando assim a sua própria linha de flotaçom, a sua força; à idiossincrasia que o diferenciava das demais empresinhas sindicais, que venhem prefeitas desde cotas e latitudes alheias.

A sua esquerda, e já fechando esta rosa dos ventos, que apresa à briga popular, uns dos julgados de Vigo. Representante da mesma justiça espanhola que foi, e é a encarregada de reprimir e de amansar com toda a força da lei, em conjunçom com o resto do aparelho repressivo, à raiva e o orgulho popular que em tempos passados canalizava este sindicato. Convertendo-o numha caricatura do que for. Calando aquele espírito que nom duvidava em abrir os caminhos que figesse falha. Fazendo que hoje já nom fique nada daquelas demonstraçons de força. No melhor dos casos, se algum conflito consegue encher as ruas, assa carragem é calada pô-las faixas, apagada por umha boa-fé exasperante. Como se avondasse com fazer grandes procissons, com chorar bem forte e com fazer fermosos vídeos para resolvê-los. Assim, olhamos como, no entanto os achaques sociais continuam a amoreiar-se, este conforma-se com resguardar-se num recanto. Tentando limitar a desonra e a apatia gerada sem incomodar aos capatazes, sem alterar a ordem. Aferrando-se aos pequenos conflitos, aos pequenos logros conquistados graças à resistência, ao metabolismo e às contas correntes dos trabalhadores. Chegando ao ponto, tristemente, e como umha mostra mais do desleixo no que fica a rebeldia, de parabenizarem-se quando essa mesma justiça, que o ajustiçou, é a que leva algo de ledícia e sossego aos conflitos.

Secassim, esse julgado também se atopa ao carom dumha escola. E som, precisamente, as liçons e os escarmentos aprendidos no pátio de jogos os que guardam o segredo para sairmos desta sindemia, cum chisco de decência: pelejar, brigar… A luita de classes! O motor da historia! Umha historia que viu surgir os sindicatos como umha forma de solidariedade entre a gente do comum. Como umha ferramenta coa que suprirem as carências do sistema, um arma coa que afortalezar-se.

Organizaçons às que já lhes vai tocando despreguiçar-se. Recuperarem a radicalidade e o denodo de antano, se nom querem rematar sendo engolidas polas próprias dinâmicas evolutivas da luita social. Porque o povo nom aguarda. Quando as necessidades e as penúrias despertam a sua consciência nom há medo que o detenha. Arrasara todo o que nom lhe seja de utilidade, todo o que tente limita-lo. Sobram os exemplos. É umha lei ecológica simples. Umha hipótese1 singela, a da rainha vermelha, que fica bem resumida num conhecido livro para crianças de Lewis Carroll: «Aqui, como vês, compre correr todo canto umha poda, para permanecer no mesmo sitio. Se se quer chegar a outra parte há que correr polo menos duas vezes mais rápido».

1 https://www.lemiaunoir.com/hipotesis-de-la-reina-roja/