Publicamos na íntegra o alegato final do imputado Ugio Caamanho polo seu interesse e por amor à liberdade de expressom que nom se pode exercer na Audiência Nacional e quase em nengum lugar do que hoje se chama Espanha.

Bom dia.

Nom quero estender-me nem prolongar ainda mais este juízo, mas tenho que discutir as acusaçons que se nos imputam e hai quatro pontos que quero aclarar. Vou cingir-me exclusivamente aos feitos que se julgam.

1. A SOLIDARIEDADE.

Neste juízo o que está baixo acusaçom é o direito dos galegos a participar em política, e também a solidarizar-se com os perseguidos políticos. Sobre a primeira parte já falárom os companheiros de Causa Galiza e nom vou acrescentar nada. Sobre a solidariedade, o fiscal e a guarda civil mentírom e manipulárom quanto quigérom, mas em ocasions digérom a verdade, e em particular quando descrevêrom a atividade de Ceivar como “solidariedade integral”, insistindo em que a nossa organizaçom promove que os presos recebam felicitaçons de cumpreanos, cartas, visitas, etc. O mero facto de apresentar essas mostras de carinho como se fossem actos de cumplicidade com operaçons violentas deveria causar a vergonha do fiscal e dos guardas civis. Pois bem, nós reivindicamos essas atividades e seguiremos a promovê-las no futuro, porque com efeito fam parte da nossa ideia de solidariedade. E qual é esta ideia?

É difícil explicar a um inquisidor em que consiste a solidariedade com os seus perseguidos sem que a ele lhe pareça umha forma de cumplicidade com os delitos que lhes imputa, mas eu vou-no tentar.

A solidariedade, senhores, é assim, incondicional, unilateral, que dá sem pedir, que se sustenta na pura e inconfiscável dignidade humana das pessoas perseguidas. E é umha das formas mais puras deamor que praticárom os oprimidos entre si em toda terra e em todo tempo. “A solidariedade é a ternura dos povos”, expressou o solidário internacionalista Ernesto Guevara numha ocasiom. Mas para escolher palavras mais compreensíveis hoje, lembrarei melhor aquelas que dim:

“Benaventurados os perseguidos pola justiça, porque deles será o reino dos ceus” (Mateo, capítulo 5, versículo 10). Para insistir no carácter universal e intemporal deste carinho polos presos, quero ainda mencionar: “Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com eles, e dos maltratados, como sendo-o vós mesmos também no corpo.” Hebreus, 13:3. Os três autores destas reflexons fôrom fusilados, crucificados e decapitados, porque os Estados, se som suficientemente tiránicos, nom admitem declaraçons como estas.

Creio que eu som o único desta sala que conhece a prisom. O fiscal e os juízes tenhem enviado a centos de seres humanos ao cárcere por um número de anos incalculável, mas nom fazedes ideia da terápia que estades a aplicar a essas pessoas. Eu sim, e podo falar do que significa a solidariedade quando se vive entre barrotes. Esse carinho, senhores, é o mínimo de calor humano que permite que a vida, a dignidade e a cordura subsista num entorno que polo demais é absolutamente hostil.

Conhecim centos de presos que careciam por completo dele, que nom tinham visitas nunca, nem cartas, nem ninguém a quem chamar; sobre eles é que a prisom se converte numha trituradora de carne humana, porque um homem só, umha mulher soa, é incapaz de manter-se inteira num ambiente tam despiadado.

A pretensom do fiscal de suprimir essas felicitaçons de cumpreanos e essas cartas de ánimos é tam monstruosa, tam diabólica, que me surpreende que poda ser formulada em voz alta sem causar a sua vergonha e demissom imediata. Em todo caso, ilustra bem às claras a natureza deste regime e deste juízo.

2. O APOIO JURÍDICO E SOCIAL.

Os membros de Ceivar que somos julgados aqui estamos baixo a acusaçom de brindar apoio a pessoas que sofrem perseguiçom política, policíaca, mediática e judicial. Pois bem, essa acusaçom é certa. Eu entendo, senhores, que essa solidariedade seja molesta para o regime. Ao menos, nós tratamos de que seja molesta. Tratamos de que sirva para fazer valer os direitos de pessoas que, mesmo acusadas de delitos graves, mesmo condenadas, som sujeitos de direitos humanos, civis e políticos. O governo espanhol, que se considera a si mesmo o governo mais progressista da história, e a fiscalia que polo visto depende dele, querem proscrever a solidariedade com as pessoas perseguidas para assim podê-las perseguir sem que ninguém vele polos seus direitos, sem queninguém critique ou difunda publicamente as vulneraçons a que som submetidas. Polo mesmo motivo, senhores, exactamente polo mesmo motivo poderia privá-los de advogados e de direito à defensa. Se a defesa dos direitos dos acusados ou dos condenados por pertença a organizaçom armada é umha forma de apoio da luita armada, entom todos deveríamos deixar via livre ao fiscal e à guarda civil para que se ensanhem com as pessoas acusadas sem medida nem escrutínio. Esse desejo de poder ilimitado e descontrolado sobre os opositores políticos revela claramente que esta fiscalia, este regime em realidade, tenhem a alma negra da tirania e do fascismo.

3. O CPIG.

O fiscal e os peritos da guarda civil tenhem tentado atribuir ao CPIG umha entidade de organizaçom terrorista. Pois bem quero fazer umha reivindicaçom pessoal, nom no nome de Ceivar, da legitimidade do Colectivo.

1. Como se tem mencionado neste juízo, eu som um dos fundadores do CPIG, no 2008. Nem eu, nem os outros dous companheiros que o fundámos, fomos nunca já nom condenados, senom nem

sequera acusados de pertença a umha organizaçom armada.

2. As pessoas presas conservam intactos os seus direitos civis, e mui especialmente o direito de associaçom. Nós fundamos umha associaçom de presos independentistas, com todo o direito do mundo, e só umha mentalidade fascista pode encontrar algo reprochável nisso. De resto, nom existe nengumha pessoa imputada por pertença ao CPIG, nem nengumha iniciativa judicial para ilegalizar essa associaçom.

3. O objectivo do Colectivo de Presos Independentistas é óbvio e aliás está demostrado documentalmente de forma exaustiva: defender os direitos dos independentistas privados de liberdade. A sua tabela reivindicativa, publicada mensalmente nos cartazes que convocam as suas mobilizaçons, consiste nos seguintes pontos: 1) Reconhecimento do carácter de presos políticos, 2)Fim da dispersom, 3) Fim do internamento em centros de menores, 4) Melhora geral das condiçons de vida.

4. O CPIG é umha associaçom que acolhe pessoas que voluntariamente desejem associar-se e que estejam presas por motivaçons políticas independentistas. Nom existe tal requisito de ter participado em acçons de sabotagens, e a prova disso é que nós mesmos, se somos condenados, seremos membros do CPIG.

4. CRÍTICA ÀS SENTENÇAS.

A fiscalia acusa-nos de legitimar as acçons polas que fôrom acusados e, nalguns casos, condenados alguns independentistas galegos, polo facto de criticarmos as reformas do Código Penal e as sentenças judiciais derivadas delas. Pois bem, senhores, nós criticamos todas estas reformas da legislaçom penal espanhola, porque criticamos o achicamento do espaço do expressável e o ensanchamento do espaço do punível que segue a legislaçom espanhola desde hai vinte ou trinta anos e que tem convertido em delictivas umha imensa variedade de expressons políticas que consideramos legítimas. Vostedes sabem que o que digo é certo: cada vez mais atividades passam de ser toleradas a encontrar espaço num novo artigo do Código Penal e portanto nas salas deste tribunal de excepçom. O regime espanhol foi proscrevendo tantas formas de participaçom política ou de expressom de opinions, que este mesmo tribunal se encontra nos últimos anos saturado de pessoas acusadas de fazer chistes, de componher cançons, de representar obras de teatro. Este tribunal tem umha trajectória mui longa, de décadas, e jamais antes se encontrara julgando estas atividades. Pois bem, nós, Ceivar, denunciamos essa escalada repressiva legislativa, e portanto as sentenças derivadas dela.

Especificamente, criticamos o uso expansivo da categoria de terrorismo por parte do regime espanhol e em concreto pola Audiência Nacional. Na nossa opiniom o terrorismo é umha estratégia utilizada num conflito político, mediante a qual umha das partes sementa o terror na povoaçom civil que sustenta à outra parte, com o propósito de doblegar as suas aspiraçons políticas. Isso é o que significa o “terrorismo” para nós, que por acaso coincide com a definiçom da ONU e de praticamente todos os países. Para o Reino de Espanha, no entanto, nom significa o mesmo e maisbem viria a aludir a qualquer delito que tenha motivaçons políticas. Permita-se-nos discrepar, sem que essa discrepáncia seja à sua vez um acto terrorista. Estas mesmas consideraçons, por certo fôrom formuladas polo magistrado da AN Ramón Sáez Valcárcel numha sentença contra militantes galegos, em que incidia em que “nom todo delito com finalidade política é terrorismo” e em que o independentismo galego nom encaixa na categoria de terrorismo.

Tenho que reconhecer, sem embargo, que é verdade que na Galiza o terrorismo sim é umha prática real. “Sementar o terror por medio de ataques a um sector da povoaçom civil para doblegar os seus objectivos políticos” é umha prática que sim acontece, e conhecemos casos nos que, por exemplo, dezenas de encapuchados armados com ametralhadoras irrompem em domicílios familiares, roubam as pertenças e o dinheiro que encontram, e mantenhem baixo ameaça durante anos a todos os membros de partidos políticos ou associaçons solidárias, com o único propósito de sementar o terror entre as pessoas atacadas ou as que poderiam unir-se aos seus projectos políticos. Esta estratégia tem-se empregado contra as organizaçons juvenis Briga, em 2004, AMI, em 2005, Causa Galiza, em 2015, e Ceivar em 2017. Nengumha destas operaçons pretendia perseguir delitos a todas luzes inexistentes (as duas primeiras arquivárom-se) senom amedrentar todo um sector da povoaçom galega, a que deseja a independência nacional. E já para acabar, gostaria de saber quem condena o terrorismo e quem o promove e o enaltece, por certo.