• O Fiscal esforça-se por criar “atmosfera”, mas esta esvaece cada vez que as defesas deixam em evidência a investigaçom, que trabalha sob fontes secundárias e nem sequer é quem de debuxar a face do inimigo que persegue.

Coletivo Amanhecer | Madrid, 20 de outubro. Chove em Torrejón. O céu liso de Madrid desapareceu esta manhá. Chove seguido, pouco, quase nem molha, mas os ativistas galegos que se enfrentam a penas de cadeia baixo a acusaçom de apologia do terrorismo refugiam-se nos hotéis. Depois da vertigem do primeiro dia, hoje voltárom á Realidade. O céu cai paseninho. É noite quando se erguem para dirigir-se à Audiência, e noite quando descansárom um chisco e querem pensar noutra cousa que nom seja um futuro negado. A Realidade é o Estado em forma de ponto cego da Justiça, um tribunal de exceçom, como insistem em denunciarem sem que o seu laio se ouça em nenhures. A Realidade som meios de comunicaçom de massas espalhando o medo à dissidência, ao pensamento dissidente, a esse discurso oculto que cada vez que emerge leva um pau… os ativistas (já serám as onze da manhá, quarta-feira, para o terceiro dia do juízo, porque Salvador Gómez foi eximido de continuar no banco dos acusados em atençom ao seu estado de saúde) almoçam com um titular de imprensa demoledor: “Al banquillo por apoyar a Resistencia Galega” (Faro de Vigo). O feche mediático completo depois de que profissionais pagados com quartos públicos difundissem através dos meios públicos do país umha informaçom que intenta reviver a pantasma do terror-independentista-galego. Essa é a Realidade, e o feche mediático é como se o céu caisse.

Como explicar desde aqui abaixo que duas mulheres e dez homens, independentistas galegos, estám diante dum juiz na Audiência Nacional que escuita um relato da acusaçom fundamentado em supostas continuidades delitivas e discursos que provocam conexom que só estám na mente dos investigadores já que nom há (ainda nom se amossou) prova material de nengumha apologia (que nom seja a da solidariedade entre pessoas, mais isso de momento nom é delito) e ele, o juiz, nom pom coto ao disparate jurídico namentres se entretém em cortar qualquer interpretaçom das defesas que ponha em dúvida a capacidade das testemunhas para estabelecer fitos em base a opinions presumivelmente expertas, que é tanto como por em dúvida a legitimidade do Estado para exercer a violência, mesmo a preventiva, cada vez que se sente ameaçado pola emergência dum discurso dissidente? Essa é a Realidade, o tribunal julgou há muitos anos a causa galega e decidiu que o céu caísse sobre ela tantas vezes como seja preciso para que nom assente.

A Realidade dita que nom é relevante que a última açom que se atribui a Resistencia Galega data de 2014 -um artefato na fachada da Casa do Concelho de Baralha- porque, em opiniom da Guarda Civil, “nom se tem constância de mensagem nem comunicado nenhum de abandono de atividade”. E, por enquanto, os alegados líderes (Antón e Asunción) estám na cadeia dende há um ano e a Fiscalía Geral do Estado dá por “desarticulada, quase ao completo, esta organizaçom”.

Nengumha das três testemunhas presentadas esta terça pola acusaçom soubo amossar a “concatenaçom” entre LAR, o Exército Guerrilheiro do Povo Galego Ceive e Resistencia Galega mais alá do simples enunciado. Fontes próximas ao processo amossam a sua estranheza porque no sumário nom figure umha prova “pericial de inteligência” que descreva o mapa inteiro da suposta rede de organizaçons que sostivérom ao terrorismo independentista galego. “Fartarémo-nos de escuitar nas próximas sessons testemunhos de agentes que vigiárom um dia um ato e nom sabem dizer o que ali se dixo porque nom escoitárom, ou periciais técnicas sob detalhes mui concretos de se isto estava no andar de tal e pertence a este ou aquele… tudo como esta manhá”. O que está a construir o Fiscal é algo assim como umha “atmosfera”, umha espécie de artefato ou pano de fundo polo que assoma de quando em quando Resistencia Galega, estabelecida a sua Realidade por um falho do mesmo tribunal presidido polo mesmo juiz, como parte necessária dumha trama em que desta volta as protagonistas som outras, aquilo que na batalha contra ETA tomou o nome de “entorno”.

Assim Resistencia Galega aparece consignada como “RG” numhas notas tomadas por Afonso Fuentes, e o entorno agroma num documento incauto a ele mesmo e no que se debuxa “o aparato organizativo de Ceivar”. Como se a simples organizaçom fosse um indício de que se vai (ou se está pensando) cometer algum delito, mas cria “atmosfera”. A Realidade é que, apesar que os atos de Ceivar e de Causa Galiza -as duas organizaçons estám ameaçadas com a sua disoluçom neste processo- som públicos, legais e comunicados à Administraçom, o que sustém a equipa que emitiu o informe de inteligência é que nos seus atos produz-se apologia do terrorismo sem dizer como, quando e por quem. Simplesmente se di que isso aconteceu porque a Guarda Civil pensa que aconteceu e se encargou de comprovar, antes e depois, através das consignas associadas à publicidade dos atos e das notícias que dos atos davam os próprios participantes.

Os ativistas e as ativistas galegas acusadas que declarárom na vista oral negáro-no todas: nem houve enaltecimento de pessoas por levar a cabo atos violentos nem de ato violento nenhum em si mesmo. Mais essa é umha vivência que fica fora da Realidade.

Para criar “atmosfera”, que parece que é do que vai esta causa e toda a causa geral contra o independentismo galego que a princípios de século começou a construir a Guarda Civil, segundo sustentam os independentistas, o Fiscal nom repara em fazer o que diante de outro tribunal seria considerado ridículo. Hoje volveu demonstrar umha imagem da instalaçom de Santiago Sierra censurada em Arco, e engadiu umha galeria de imagens de nacionalistas galegos parabenizando a um preso político sem conseguir estabelecer a relaçom das organizaçons e das pessoas acusadas co ato. Para criar “atmosfera”, o Fiscal chamou a declarar a Xavier Vence e Bieito Lobeira, por se numha reuniom deles como máximos representantes do Bloque em 2013 trataram sob a questom da violência numha reuniom com Causa Galiza. Nom houve tal debate, digerom o professor (ex-porta-voz nacional do BNG) e o político, e deixárom constância de que o regeitamento à violência como via de emancipaçom nacional ficou fora do ideário do nacionalismo maioritário há tempo.

Mas a “atmosfera” nom tem consistência e evapora-se cada vez que as defesas interrogam os investigadores. As suas fontes som indiretas, as suas certezas fráxeis, que ponham o foco sob organizaçons legais que desenvolvem atos legais porque lhes dim que o façam (e aqui o juiz cortou a reflexom das defesas, “já sei por onde vai, nom admito que se fale de investigaçom prospectiva”) sem ter indícios de delito e, quando parece que os tenhem, nom interrompem os atos nem sancionam os participantes (e aqui o juiz tampouco deixou afundar nas razons). A pergunta da defesa, “que outros atos autorizados vigiam vostedes?”, quedou no ar. Todo som suspeitas. Algumhas surpreendentes, porque interrogam a umha testemunha que declara que nom entende o galego e que nom sabia o que se dizia nas publicaçons em Internet que lhe mandavam descarregar e trasladar a outro investigador. É como se traem declarar um telefone. Ou o secretário da investigaçom manifestando que vigiava as mui perigosas redes sociais de Causa Galiza e Ceivar e as proclamas violentas que lançavam enquanto reconhece que estas organizaçons nom mantinham atividade clandestina nengumha e que o seguimento policial se fizo porque suspeitam que eles faziam parte de Resistencia Galega. Tudo vai parar em Resistencia Galega, a Realidade que se impom na sentença de 2013, ditada polo juiz Guevara.

Onde está o ponto que determina se existe apologia do terrorismo ou nom numha manifestaçom pública de apoio a presos políticos? “Nom há ponto nenhum, o delito é elástico”, reflexionam refugiados da tarde gris sobre Torrejón os que manhá voltaraám levantar-se para acudir a Audiência Nacional sem esperança nengumha. Há anos que o independentismo galego sabe que nom se permite pisar linhas vermelhas, e cuidou-se de pisá-las. Mas as linhas movem-se. Um jogo perverso, a Realidade.