No 1 de setembro de 1980, umha operaçom dirigida pola brigada de informaçom da polícia espanhola culminava na detençom de dezasseis independentistas galegos. Supunha o segundo grande golpe repressivo contra o movimento, apenas cinco anos depois de que o mesmo corpo armado executasse extrajudicialmente Moncho Reboiras e detivesse e encarcerasse vários militantes da UPG. No primeiro governo da UCD, e com o independentismo já organizado em estruturas de seu, o Estado gorava a construçom dumha organizaçom armada galega e tentava neutralizar todo um movimento político emergente.

Os feitos

As primeiras notícias da imprensa da época, bem mais lentas e dosificadas que as da actualidade, assinalavam a detençom de ‘quatro atracadores vinculados a umha organizaçom de extrema esquerda nacionalista’. Os detidos eram Nieto Pereira, Árias Curto, Cid Cabido e Atanes López. Segundo fontes policiais, os quatro estavam acusados de atracarem umha sucursal bancária na Derrasa, em Ourense, e caíam em distintos pontos da Galiza poucas horas depois dos feitos.

Tais detençons desencadeam umha operaçom que, ao que parece, levava tempo preparada, e que no total soma dezasseis pessoas, implicadas em diversas causas populares, e todas elas significadas polo seu ideário independentista. Entre os detidos topavam-se os tententes alcaldes de Monforte e Vila Boa pola candidatura Unidade Galega (Árias Curto e Patrício Recamám), o presidente da associaçom de vizinhos de Vila Boa (Antom Bértolo) ou destacados activistas contra a construçom da AP-9 em várias comarcas do surleste do país (caso de Arturo Estévez ou Manuel Pousada). A detençom do escritor Xosé Luis Méndez Ferrín, cabeça destacada do Partido Galego do Proletariado, causa alarma aliás na intelectualidade, e amplia o eco solidário.

A operaçom tem grandes repercusons, quer polo número de detidos, quer pola sua releváncia social. A imprensa dá-lhe umha dimensom nova ao noticiar, com os militantes submetidos à lei anti-terrorista, que um importante arsenal de armas foi descoberto numha oficina mecánica em Monforte de Lemos, propriedade de Árias Curto. As muniçons e o armamento teriam origem basca e, em tempos de grande crueza do conflito entre ETA e o Estado, isto supom pôr um enorme foco mediático nesse incipiente desafio galego.

Na altura, a lei antiterrorista permitia manter os militantes detidos até dez dias (frente os cinco actuais). Ainda sem se resolver o desenlace da operaçom, e com os independentistas incomunicados e vítimas de coerçom e maus tratos, o chefe superior da polícia espanhola na Galiza, Javier García Carpintero, oferece umha rolda de imprensa com grande expectaçom. Carpintero declara que um grupo de militantes independentistas levam sendo objecto de extremo seguimento desde março de 1978, quando formalizam a sua saída da UPG com a formaçom do Partido Galego do Proletariado. ‘Gora-se um plano subversivo terrorista a nível regional da Galicia’, intitula La Voz. O mando policial pom o acento em que tal partido marca como um dos objectivos, nos seus textos estatutários ‘a fragmentaçom e destruçom do Estado espanhol’, e também a necessidade ‘dum destacamento armado que progressivamente se convirta em exército do povo.’

Vários dos militantes detidos serám formalmente acusados de acçons de sabotagens contra as obras da autoestrada do Atlántico, de colocaçom de explosivos na ‘cruz dos caídos’ franquista de Vigo, de expropriaçom bancária, de expropriaçom num polvorim, e de depósito de armas e explosivos. O sumário declara que os encausados ‘formam parte dum grupo armado que persegue a independência da Galiza’. O nome da organizaçom é Luita Armada Revolucionária, e a polícia gora o seu desenvolvimento, por palavras literais, ‘quando estava na fase inicial de desenvolvimento da sua infraestrutura’.

Luitas e ideias

Na Galiza da altura, depois de que a esquerda espanhola assinasse o pacto constitucional, o independentismo aparece como umha alternativa emergente contra o novo quadro jurídico político. Militantes arredistas fixeram parte dos chamados Comités contra a Constituiçom (CCC) e participavam de diversas iniciativas municipalistas populares, a mais destacada daquelas Galicia Ceibe (OLN). Integrados em candidaturas abertas como a de Unidade Galega, estavam presentes nalguns governos municipais.

Para além disso, o occidente do país estava massivamente mobilizado contra umha AP-9 que feria mortalmente muitas paróquias e núcleos habitados, além de desequilibrar gravemente o país cara a faixa occidental, favorecendo um modelo de mobilidade particular e gerido por empresas privadas, que ainda hoje padecemos. A mobilizaçom popular contra a autoestrada, chamada ‘navalhada à nossa Terra’, tivera ampla dimensom, e o independentismo complementara-a com ataques variados a maquinária e instalaçons das empresas.

Uns anos antes, tivera lugar a primeira grande ruptura do nacionalismo de posguerra, que na realidade supujo a emergência do arredismo depois de trinta anos de silêncio. Desaparecidos os colectivos independentistas da emigraçom, fora de núcleos pessoais isolados, apareciam na Terra organizaçons que apostavam na soberania plena. Os críticos com a evoluçom da UPG trás a queda de Reboiras acusam o nacionalismo de ‘abandonar o internacionalismo proletário ; suscrever o galeguismo minimalista da Geraçom Nós; e abandonar as armas’. Nessas coordenadas temos que entender a apariçom do Partido Galego do Proletariado e a formaçom de LAR.

Solidariedade

As vozes contra as detençons nom se fixérom esperar. A primeira, a do próprio PGP, principal alvo da operaçom, que deslindava a diferença entre programas políticos e feitos delitivos:

‘confundir o PGP com umha organizaçom armada é umha clara tentativa de estabelecer, à desesperada, as bases dumha feroz repressom contra umha alternativa nacionalista e independentista de inspiraçom marxista leninista, para silenciar a oposiçom ao processo autonómico’

Contra a fórmula tantas vezes repetida de implicar organizaçons políticas em acçons violentas diziam os comunistas:

‘o PGP considera a luita armada mais umha modalidade de luita dentro dum plantejamento geral, mas esta forma de luita corre a cargo dumha organizaçom específica, e nom do nosso partido’

Forças diversas fam pública a solidariedade: o POG, com quem participavam alguns dos detidos em plataformas locais, diz que ‘cumpre respeitar as garantias jurídicas das pessoas detidas’, e preocupa-se com que algum deles puidesse ter sido detido por ‘delito de opiniom’ ; aliás, critica duramente a vontade mediática de relacionar ‘Unidade Galega com a violência’. O BN-PG, ainda que deixa claro a sua rejeiçom ‘à mecánica que subjaz aos feitos que dam lugar a esta campanha’ (em alusom à luita armada) solidariza-se com os detidos e entende que a operaçom dirige-se a silenciar a oposiçom ao pacto autonómico.’ Também Galicia Ceibe OLN esclarece, contra o golpe repressivo que é ‘umha organizaçom assembleária, que reune pessoas de diferentes ideologias em favor da autodeterminaçom.’ Da amplitude do golpe repressivo dá prova o feito de implicar pessoas da Irmandade Galega, que em nota de imprensa define-se simplesmente como ‘organizaçom que pretende profundizar na autonomia da Galiza’. Também entidades nada relacionadas com o independentismo defendêrom os detidos: caso do professorado do liceu Santa Irene de Vigo, ou a Associaçom de Escritores em Língua Galega.

Comunicado do Bloque Nacional-Popular Galego

Consequências

Depois de terem denunciado torturas em dez dias de detençom, vários dos detidos ingressam em cadeias, primeiro na Galiza, logo em Espanha. No ano 1981, trás várias excarceraçons, ficavam presos Nieto Pereira, Cid Cabido, Árias Curto, Edelmiro Domingues, Francisco Atanes e Arturo Estévez. O juízo contra LAR celebrou-se em 1982 e tivo como resultado a condena firme de Recamám, Atanes, Nieto, Cid e Curto. Um indulto do governo do PSOE conseguiu a libertaçom dos presos em 1983.

Na altura nasceram as Juntas Galegas como Amnistia, que intitulárom ‘Setembro’ o seu vozeiro, polo mês em que as detençons se produziram. O independentismo ficou duramente golpeado, mas um núcleo persistente prosseguiu, trás este ciclo repressivo, sostendo a organizaçom Galiza Ceive OLN, da que sairiam novos projectos para o país na década de 80.

Certos traços da época contrastam com os nossos : alguns de especial dureza, pois a lei antiterrorista era, se cabe, ainda mais cruel, ao superar-se a semana de incomunicaçom ; o uso da tortura física era quase indiscriminado. Em contraste, porém, as condenas por delitos associados a ‘terrorismo’ nom eram tam avultadas como no presente, e resulta surprendente que, num contexto recém saído da ditadura, nom se tipificasse a chamada ‘apologia do terrorismo’, podendo as organizaçons expressar-se a vontade sobre a violência política. Mesmo a imprensa do regime, obviamente hostil à causa galega, adopta na sua linguagem um tom bastante comedido: ‘operaçom contra umha hipotética frente armada do PGP’, intitula um cabeçalho da época; ‘seguem operaçons contra o grupo armado’, aponta outro.

Seja como for, com luva branca ou punho de ferro, as operaçons políticas anti-independentistas continuárom em 40 anos de Regime : contra APU em 1991, contra BRIGA e AMI em 2005, e contra Causa Galiza e Ceivar em 2015 e 2017.