Nestes dias de retraimento pensei no Miguel.

Há uns meses ele escrevia um artigo onde compartia alguns dos pensamentos em que ocupa a mente durante o seu sequestro. Umha das reflexons rematava deste jeito: Nego-me a calcular se vale a pena ter crianças, bater-se por um amigo, ficar sem dedas ascendendo o Himalaia ou enfrentar o cárcere por te opor à destruiçom do teu país, mas sei que nom há fortuna que consiga tornar habitável um mundo no que estas cousas deixem de fazer-se.

Estas palavras precipitárom na minha cabeça e cada pouco tempo ecoam entre os meus pensamentos. A última vez foi há uns dias, quando lia o livro de Bobby Sands, Um dia na minha vida. Enquanto lia as palavras do militante irlandês, lembrei-me dos presos independentistas galegos e nomeadamente do Miguel. Lembrei-me de como o seu compromisso político o levou, a ele e a tantos outros, à cadeia. Perguntei-me como estaria a levar o seu cativeiro e decidi escrever-lhe umhas palavras. Aguardo que nom demorem muito em chegar-lhe. Também me lembrei de que ele gostava de andar polo monte e que participava habitualmente dos roteiros que organizava a Agrupaçom de Montanha “Águas Limpas”. De andar polo monte a umha cela de Soto del Real…

Se depois de pouco mais dum mês sem poder praticar nenhuma atividade ao ar livre, e sem intençom de comparar a situaçom de confinamento que sofremos agora com a situaçom dos presos políticos, eu já anseio correr polo monte e, sobretudo, sair a vogar com os meus companheiros, nom consigo imaginar o que se pode chegar a sentir estando sequestrado longe da Terra durante tanto tempo. Além de mais, sei que para Miguel andar polo monte nom é apenas um passatempo ou um desporto, é mais do que isso. Cuido que apoiaria aquilo que escrevera Castelao: Para nós a Pátria é um sentimento natural, inspira-se em realidades sensíveis aos cinco sentidos. A Pátria é a Terra.

Pensar na passagem de Castelao trouxo-me ao recordo a declaraçom de A.M.A.L., Nom Consumimos Paisagem. Havia muitos anos que a lera e nom lembrava do título. Tivem que acudir ao blogue da Agrupaçom e retroceder até o ano 2007 para encontrá-lo: Nom consumimos paisagem. Porque nunca se consume o que forma parte da identidade própria. Só se consumem as “cousas”, o que está fora e é exterior. O chão que pisamos nom se compra nem se vende. Nom tem valor de troca. As nossas montanhas, a nossa paisagem nom som “cousas”, nom som “mercadoria”; som Terra, som Pátria, som País.

As saídas ao monte som mais que um entretimento ou um exercício físico. Também som algo mais que um consumo compulsivo de beleza e de paisagem. Nom nos interessam os reptos, as marcas ou os desafios desportivos. Botar-nos ao monte significa saúde, convívio, conhecimento e luita. Por isso nas nossas mochilas nunca vai faltar umha bandeira, um sprai que nos dé voz ou um acto-manifesto reivindicativo. Queremos demoler a dissociaçom que o capitalismo espanhol faz das nossas vidas, enlatando-nos em tempos mortos para o lezer-consumo, para o trabalho, para a política. O novo tempo de vida vai ser simultaneamente um tempo de convívio, de desfrute, de esforço e luita.

Tenho a conviçom de que a sua coragem fará que o seu passo polos calabouços espanhóis só provocará que saia mais forte, com os seus ideais mais fortalecidos. E cum sorriso. Tomo prestadas as suas próprias palavras para intentar animar-me a mim mesmo e àquela gente que ainda crê na nossa capacidade de sobrevivência como naçom, porque tarde ou cedo, confio em que volveremos compartir caminhos entre montanhas, jantares sobre a erva e ceias fronte ao lume.