Um fio vermelho percorre a história dos povos. Palavras que se criam esquecidas entre anúncios de carros e produtos bancários voltam para reconstruirem o que o mercado desfijo em nome da liberdade. Uma palavra, liberdade, que podemos ler, ouvir e ver na maior parte dos anúncios, precisamente porque está em stock, apenas disponível para quem poda compra-la.

A dignidade, no entanto, nom se pode comprar nem vender e por isso é o maior capital da Rede de Apoio Mútuo de Lugo. Uma rede que, aos poucos, está a tecer um novelo de cuidados que viaja de janela em janela, de porta em porta; no fim de contas, de coraçom em coraçom.

Como é que nasce a rede de apoio mútuo de Lugo?

A Rede de Apoio Mútuo de Lugo nasceu em 2018 com o objetivo de criar um tecido para enfrentar as diversas opressons e injustiças com as que nos podemos atopar quotidianamente, já seja em quanto a questons laborais, direito à vivenda, discriminaçons por questom de classe, género, raça… Sempre formulada de jeito horizontal, quer dizer, em lugar de partir duma base assistencialista, entendemos o grupo como um conjunto no qual apoiar-se e ser apoiadxs. Assim, quem fai parte é suscetível quer de receber ajuda, quer de presta-la quando for preciso.

Rede de Apoio Mútuo de Lugo.

Nos vossos cartazes, perante a crise do COV19, pode-se ler: o apoio mútuo entre as de abaixo é imprescindível. Por que achades necessária a organizaçom popular neste contexto?

Atopamo-nos ante uma situaçom de crise excecional, quer no terreno da saúde quer no económico; este último, ademais, provavelmente se prolongará bastante ao longo do tempo. É também um tempo em que estamos em perigo de ver curtes nos nossos direitos na suposta busca dum bem maior. Assim, vemos como se estám militarizando as ruas e lexitimando níveis de autoritarismo, aplaudidos por personalidades de todas as cores políticas, que nom seriam viáveis há um mês.

Neste contexto cremos importante manter a perspetiva e, sem cair em banalizar a pandemia nem em atitudes irresponsáveis, tratar de ser conscientes da deriva sociopolítica que acarreta esta crise.

Rede de Apoio Mútuo de Lugo

Vimos como a resposta por parte da populaçom luguesa foi rápida e ampla, demonstrando assim que, em tempos difíceis, o único jeito de persistir é apoiando-nos entre iguais, quer agora quer com o que virá.

BRILAT em Lugo. ElProgreso

Nos últimos dias estades a fazer um chamado a utilizar a rede para garantir o cuidado das pessoas mais velhas e em situaçom de risco por algum tipo de doença. Há muitas pessoas nesta situaçom? Como desenvolvedes estas tarefas de cuidado?

Sobretudo ao princípio, mas continuamente recebemos chamadas de pessoas que precisam este tipo de ajuda. Pessoas que nom podem sair da casa e as alternativas oferecidas nom sempre som úteis ou assumíveis. Por exemplo, o Concelho de Lugo, em convénio como os taxistas, habilitou um serviço de entrega em domicílio da compra por parte dos segundo. Isto leva consigo nom só o pago dos produtos, senom também a tarifa do taxi, que em muitos casos nom é assumível economicamente. Tentamos levar os produtos que precisam às casas de quem nom pode sair, sempre levando em conta as medidas de proteçom e higiene precisas. Ultimamente, ademais, estamos a ver também como outra das necessidades é a de acompanhamento. Há muitas pessoas agora que estám sós e nom tenhem um jeito simples de se comunicarem, polo que o isolamente emocional é também um fator.

Outra modalidade de ajuda é o banco de alimentos e produtos para aquelas pessoas que podam doar ou que necessitem víveres por estarem numha situaçom de precariedade económica. Está a haver muita demanda de comestíveis nestas últimas semanas?

Desde que começou o estado de alerta a quantidade de pessoas que se viu numa situaçom ainda mais precária que anteriormente e altíssima. Nas duas primeiras semanas o concelho nom proveu de nenhum serviço acrescentado e, evidentemente, a problemática aumentou muito, já que muitos coletivos que antes tinham um ingresso agora foi cortado; trabalhadoras sexuais, o mercadinho ou mesmo quem pede esmola está agora fora de toda proteçom.

Rede de Apoio Mútuo de Lugo

Recentemente enviastes um documento ao Concelho, assinado por vários coletivos sociais da cidade, no qual denunciades a falta de serviços sociais, assim como uma insuficiente visibilidade dos recursos ofertados por parte da Administraçom local. Que está a fazer o Concelho perante este crise? 

Como queda mencionado na pergunta anterior, desde que começou o estado de alerta muitas pessoas se atoparom em situaçom de desamparo. Outra tanta já o estava antes. As instituiçons que oferecem assistência colapsarom mui cedo. Algumas limitarom os seus serviços e outras nom tinham força para atenderem toda a demanda. Perante a possibilidade de atopar pessoas dormindo na rua e famílias sem comer, o Concelho demorou duas semanas em reagir e aumentar a infraestrutura. Durante os primeiros dias era quase impossível falar ou contactar por telefone, a maioria dos centros socioculturais fecharom e nom havia nenhum jeito de comunicaçom direta.

Ademais, as pessoas com as que falávamos que se atopavam nesta situaçom mui frequentemente nom conheciam os recursos que publicitava a administraçom. Nas redes sociais viam-se circular anúncios do Concelho mostrando as ajudas, mas nos centros socioculturais aos quais acudiam antes quem os precisava nom aparecia nenhum tipo de informaçom, apenas um cartaz anunciando o feche.

Se quem precisa dessa ajuda nom a recebe e, por outra parte, quem nom a precisamos atopamo-la frequentemente, é possível pensar num interesse eleitoralista na escolha das estratégias comunicativas.

Rede de apoio mútuo de Lugo

Outros problemas, alvo da vossa crítica, som as deficiências no exercício de direitos fundamentais como o direito à vivenda. A teórica moratória governamental para evitar despejos foi efetiva ou continuam pessoas a ser expulsas das suas casas?

As medidas decretadas polo Governo nom som um resgate às inquilinas nem às famílias, som na realidade um resgate ou uma garantia à banca, aos fundos de investimento, aso grandes proprietários e aos detentores de vivenda.

No tema hipotecário o Governo implementou uma moratória de três meses sob umas condiçons praticamente excludentes para a totalidade, onde 9 em cada 10 petiçons para a moratória ficam fora, segundo denuncia a própria Plataforma de Afetados pola Hipoteca. É conclusivo pensar que as medidas atuais nom se afastam muito do Decreto “anti-despejos” aprovado em 2012 polo Partido Popular. A banca é responsável direta da crise económica de 2018 e benfeitora do seu resgate, já que nos adeveda mais de 65.000 milhons de euros.

Açom de Lugo sem Mordaças

Quanto ao aluguer, a “medida estrela” som os micro-créditos bancários sem interesses, garantidos polo Estado, seguindo a linha das recomendaçons da banca, a patronal imobiliária e os grandes proprietários. Isto traduz-se em que a fatura será paga por nós, ainda que seja a prazos. Outra das medidas é a renovaçom automática de seis meses de aluguer mantendo as condiçons atuais do contrato, mas sem questionar-se nem sequer se as condiçons já eram abusivas, o que levaria consigo falar da necessidade imediata de leis destinadas ao controlos dos preços do aluguer.

Em qualquer caso, entendemos que se deve exonerar do pagamento às inquilinas, distinguindo nos alugueres aos grandes arrendatários dos pequenos proprietários, no caso de estes últimos presentarem dificuldades económicas.

Além de todo isto, sinalamos também a carência de vivendas sociais ofertadas polas administraçons locais e autonómica. Lugo é uma das cidades com maior percentagem de vivenda vazia, e o Concelho nom tomou nenhuma medida ao respeito, nem agora nem antes desta crise.

Todas estas questons, e especialmente neste contexto, ponhem de manifesto a falácia da auto-regulaçom do livre mercado, e destaca a necessidade de coletivizaçom de setores estratégicos, uma banca pública ou o questionamento da vivenda como um produto económico. Esta crise deve fazer-nos ir à raiz dos problemas e fazer parte da açom. Esperamos que a greve de alugueres se espalhe por toda a Galiza e o resto do Estado.

Rede de Apoio Mútuo de Lugo

Tendes denunciado também a situaçom de especial desproteçom das mulheres e crianças, vinculando-a com a falta de assistência da polícia autonómica por estar esta última a desenvolver outro tipo de trabalhos. Que está a acontecer neste sentido?

O problema é que, como é de costume, os sujeitos em situaçom de maior vulnerabilidade som sempre os mais prejudicados. Atualmente existe uma carência de recursos ao destinarem-se ao Covid19; a crise sanitária mostra a falta de recursos públicos nom só na saúde. Se bem nom cremos que a Polícia Autonómica seja competente na soluçom a problemáticas de carácter social e político (que requerem doutras soluçons afastadas dos corpos policiais), atualmente nom se está a formular o debate nestes termos tam necessários, simplesmente torna-se evidente a falta de assistência nestes eidos e a desproteçom e esquecimento por parte das administraçons para garantir uns direitos mínimos a respeito da violência de género. Por outra parte, desde a denúncia coletiva houvo lixeiras melhoras quanto ao tratamento destas situaçons.

Se alguma pessoa precisar da vossa ajuda, como podem contactar-vos?

Podese-nos atopar nas redes e na página web apoiomutuolugo.noblogs.org. Aí temos, ademais, as ligaçons aos grupos de whatsapp que utilizamos para organizarmo-nos polos distintos bairros e também os telefones de contacto por se houver qualquer dúvida, que som os seguintes: 675146402 ou 698191152