A reclusom domiciliária e a cancelaçom da agenda política, social e militante na rua, pode ser um bom tempo para a reflexom serena e o debate necessário para enfrentar os novo desafios que se nos imponhem para umha nova realidade ainda mais dura e crua que nasce, e cujas consequências parecem imprevisíveis, assim o confirmam os inúmeros artigos escritos sobre a crise sanitária que, como se nos lembra nalguns dos textos publicados por este jornal, é apenas umha manifestaçom da crise global do sistema capitalista. Reflexons e debates, por outro lado, adiados ou precipitados pola urgência que impom umha atividade frenética, em multidom de frentes abertos, e sempre marcados pola implacável repressom que exerce o estado.
A emergência sanitária e o impacto brutal que terá, que já tem, sobre as classes populares galegas obriga-nos a medir e repensar o que até ontem percebíamos como tempo de crise, mas um tempo integrado já no nosso quotidiano, onde as diferentes manifestaçons políticas encontravam o seu próprio espaço material e discursivo. Neste tempo de crise pré-viral tem surgido, dentro da ampla e plural base social do independentismo, o debate sobre as formas de organizaçom social e política desejáveis para umha Galiza livre, e as ferramentas (institucionais, administrativas, económicas,…) mais convenientes para a sua construçom. Este debate alcança inúmeras matérias de discussom e presenta diferentes graus de implicaçom dependendo dos modelos em causa. Porém, o debate sobre as formas de organizaçom social no espaço marginal, que nom quer dizer irrelevante ou insignificante, que ocupa o independentismo na sociedade galega, som o reflexo dum debate global entorno das luitas emancipadoras após o fracasso das estruturas tradicionais de organizaçom de classe na construçom dumha nova sociedade, e o surgimento de novos paradigmas inspirados nas luitas indigenistas, ou nos contributos e as exigências ineludíveis do feminismo, entre outras.
O surgimento no independentismo de novas expressons políticas de carácter comunitário e anti-institucional, ou para-institucional, como as redes de apoio mútuo, as cooperativas integrais, as escolas populares, ou os centros sociais autogestionados, que soubérom integrar a esfera da reproduçom da vida e os cuidados na sua prática política, mostrárom os limites das formas tradicionais de luita monopolizadas polos partidos clássicos e os sindicatos de classe, aprisionados numha concepçom do mundo que reduze todas as relaçons sociais às esferas do ámbito privado ou público, entendendo como público aqueles serviços que presta o estado. Estas novas expressons políticas tenhem raízes muito heterogéneas mas partilham, no fundo, a consciência do colapso do sistema capitalista e das velhas ferramentas de emancipaçom, coincidindo também na necessidade de operar desde já na construçom dumha nova sociedade, sem aguardar por um assalto ao poder institucional eternamente adiado. A brutal irrupçom desta crise mundial sanitária, que nom é mais do que umha manifestaçom do colapso do sistema tal e como o conhecemos, confirma os pressupostos teóricos destas expressons políticas, e a necessidade de tecer alternativas comunitárias às formas de relacionamento social do capitalismo.
No entato, a crise desatada pola expansom pandémica do coronavírus, ao mesmo tempo que confirma as teses que proponhem um novo tempo (de decrescimento), e um novo espaço (de afetos e cuidados), paradoxalmente, também assinala os seus limites como alternativa possível, no presente, ao sistema capitalista. Para já, fica confirmado que nom existe um além fôra do capitalismo, que assumir a luita pola emancipaçom social e nacional, implica assumir as contradiçons do sistema e portanto, o campo de batalha onde se imponhem e se enfrentam a concepçom do público e do privado, ou dito doutro modo, nom podemos abandonar o terreno onde, após a queda da Uniom Soviética, se dirime a luita de classes nas sociedades ocidentais. Devemos portanto, reconhecer a vigência de sindicatos e partidos tradicionais como instrumentos necessários para a luita nacional e social.
Acreditar que o colapso do sistema pressupom o anúncio de novas formas de relacionamento social comunitárias, ou pretender que o assalto ao poder institucional trairá consigo a nossa libertaçom, som duas afirmaçons distintas que nascem do mesmo pensamento mágico, fundado nos prejuízos ideológicos. Se mesmo assim acharmos que a atual crise nom evidenciou os limites da açom comunitária e os da política no sentido clássico do termo, já o estado espanhol, na sua deriva mais autoritária e belicista, se encarrega de lembrar-no-lo , a golpe de estado de excepçom.
A necessidade dum equilíbrio entre o comunitário e o público nom está isenta de tensons, ainda mais se temos em consideraçom que, em última instância, o público na Galiza está subordinado aos interesses do estado. Afortunadamente no independentismo galego som tendências marginais as que adoptam posturas irreconciliáveis. Nos últimos tempos, dentro do independentismo, tem tomado força a posiçom comunitária mas, desde o exercício da autogestom educativa, tem-se defendido o ensino público frente a sua privatizaçom, embora se tenha denunciado os seus mecanismos de reproduçom social; tem-se defendido a sanidade pública embora se tenha denunciado a sua funçom no controlo da populaçom e ensaiado formas de gestom comunitária da saúde; tem-se defendido os direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores das indústrias maciças enquanto se denuncia o carácter depredador e poluente destas indústrias….
Reconhecer os limites das duas formas de expressom política significa perceber o potencial libertador de ambas mas, se isto é umha certeza que tem demostrado na prática o independentismo, entom acho que a pergunta que nos devemos fazer coletivamente é esta: O que nos impede construir umha estratégia política unitária do independentismo?