A expansom do coronavirus e a declaraçom do Estado de Alerta a ele associado polo governo estatal, fijo com que durante os últimos dias fossem publicando-se em redes sociais e serviços de mensagens instantâneas diferentes redes de apoio mútuo para garantir a assistência e cuidado de pessoas em situaçons de vulnerabilidade por causa do isolamento social ou de fatores associados à diversidade funcional (motórica, sensorial, etc.).
O vírus, de origem desconhecida, mas de efeitos perigosos para as pessoas idosas -com patologias associadas- desvelou a falsidade inerente ao mito do individualismo inelutável, próprio das sociedades capitalistas ocidentais. Um organismo microscópico foi suficiente para lembrarmos a tese de Kroptokin no seu reconhecido livro O apoio mútuo, no qual o anarquista russo demonstra que, embora exista competiçom entre espécies e entre sociedades humanas, dentro dumha mesma espécie e umha mesma sociedade o apoio mútuo é a principal força para garantir a sobrevivência do grupo. Combatia assi o darwinismo social prevalecente na Europa do começo do século XX, tradiçom intelectual que chega até os nossos dias transmutada em argumentos economicistas neoliberais. Como lembraria décadas depois o romancista inglês, A. Huxley: “Talvez a mais grande liçom da História é que ninguém aprendeu as liçons da História”.
Podemos recuar mais no tempo e viajarmos até a Grécia Clássica para conhecermos o mito da criaçom do homem por Prometeu e Epimeteu, narrada no Protágoras de Platom. Os deuses tinham o dever de modelar as criaturas no interior da Terra, com umha mistura de terra, fogo e outras substâncias. Epimeteu, que tinha uma sabedoria imperfeita, já tinha esgotado, sem perceber, todas as qualidades com os animais nom humanos (velocidade, força…), esquecendo-se de reservar algumha cousa para prover o homem, que ficou nu, sem calçados, sem coberturas e sem armas. E tinha chegado o dia marcado polo Destino, em que era preciso que o homem saísse da Terra e vinhesse para a luz. Diante dessa dificuldade, Prometeu nom sabia que meio de salvaçom poderia encontrar para o ser humano. Decidiu entom roubar de Héfesto a habilidade com o fogo, e de Atena a inteligência, para entom dá-los aos homens como forma de defender a sua vida. No entanto, o problema nom acabou porque o que aconteceu é que os homens luitavam entre si e, ao nom cooperarem, eram pressa fácil doutros animais. Destarte, tivo que intervir o próprio Zeus e dotar os humanos de habilidades como o sentido ético e político.
Um sentido ético e político que permitiu a Zygmunt Bauman datar o início da civilizaçom humana há milhares de anos no seu ensaio Confiança e medo na cidade. Da mao do que fora o seu professor de antropologia na universidade, refere o descobrimento dum esqueleto humano fóssil que rompera a perna quando criança, mas que graças ao cuidado comunitário morrera aos trinta anos de idade. A fragilidade, vulnerabilidade e pequenez humana ficaram gravadas desde entom com carbono-14 na consciência coletiva da nossa espécie, mas também o sentido ético e político da nossa existência porque, no fundo, sabemos que também podemos ser nós aquele homem desvalido.
Semelha que esta certeza se manifesta no nosso inconsciente coletivo em momentos em que se torna real a ameaça. Isoladas, sentimos medo no cerne do nosso cérebro primitivo, mas também compaixom polas outras pessoas. O nosso eu hipertrofiado dissolve-se num nós, num bairro, numha comunidade, num povo unido contra a ignomínia dum Estado que reagiu com demora e autoritarismo centralista porque tinha que decidir entre os interesses da humanidade ou da macroeconomia, entre a vida sustentável e segura ou o crescimento do IBEX 35, entre o direito a umha vida digna dos povos ou os interesses espúrios dumha minoria privilegiada.
Da base social surgem, polo contrário, iniciativas pensadas para o bem comum como o caso dos grupos de apoio mútuo da Corunha que som
A resposta que levantamos dos bairros conscientes da Corunha para por-nos ao lado das pessoas mais vulneráveis, as nossas vizinhas e vizinhos, nestes momentos complicados. Umha resposta autogerida que procura ativar a solidariedade justo quando mais a precisamos.
GAM / Acerca de
Tenhem como alvo detetar necessidades de pessoas em situaçom de vulnerabilidade e organizar soluçons de proximidade nos bairros de: Eiris, Norte, Labanhou-Escolar, Gaiteira, Orçam, Sam Pedro-Rosais, Matogrande-Ofimático, Elvinha-Birloque, Mesoiro, Quatro Caminhos, entre outros.
Através da aplicaçom Telegram podes consultar todos os grupos e criar novos em zonas em que ainda nom há movimento organizado.
Em Compostela, a associaçom vizinhal As Marias quer ativar medidas de solidariedade. O coletivo de habitantes do bairro informa de que tenhem disponibilidade para ajudar às vizinhas para o que necessitarem: dificuldades de movimento, necessidade de informaçom, botar umha mao nalgum recado, entre outras tarefas. Na imagem inferior podes consultar os números de telefone e os correios eletrónicos disponibilizados pola associaçom.
En Lugo, a rede de apoio mútuo que nascera há vários anos inspirada na rede de solidariedade criada em Seattle em 2007 como organizaçom formada por trabalhadoras e inquilinas que luitam por reivindizaçons coletivas mediante a acçom direta, também oferecem ajuda coletiva através do seguinte contato:
Mail: apoiomutolugo@riseup.net
Facebook: Rede de Apoio Mútuo Lugo
Instagram: @apoiomutuolugo
Twitter: @apoiomutuolugo
O movimento feminista tem apontado nos últimos tempos a importância de socializarmos os cuidados, de acabarmos com a lógica da competência económica e de repensarmos a base ética dos nossos relacionamentos porque cuidar é, como indica Josemi Valle em La capital del mundo es nosotros, o meio para possibilitarmos o nosso próprio florescer como sociedade, estabelecendo estruturas de equidade, partilhando, falando, rindo, ajudando, respeitando e dignificando ao outro. Porque esse outro, no fim de contas, somo nós através dum olhar que nos abraça desde há milhares de anos.