No último médio século, a fisionomia da Galiza, a distribuiçom demográfica e as actividades económicas sofrêrom umha mudança sem precedentes ao alento dum novo modelo de obra pública, nomeadamente de infraestruturas de transporte. Tal modelo, de direcçom exógena e alheio a qualquer debate social, tivo como protagonistas um feixe de empresas fundidas em interesses e estratégias com o poder político espanhol. Informes recentes da imprensa comercial reconheciam que a obra pública na Galiza continua a ser monopólio de velhos conhecidos, indistinguíveis da oligarquia que governa o Reino de Espanha desde 1939.
Segundo um informe editado na primavera de 2019, a adjudicaçom de obra pública em território galego revela a hegemonia indiscutível de nom mais de vinte empresas, que sistematicamente acaparam a oferta estatal de infraestruturas. O estudo é da Federaçom Galega da Construçom, que no passado maio descobria ao grande público que apenas dez empresas recebiam na Galiza o 70% do total das adjudicaçons do Estado. As mais delas relacionam-se com as obras faraónicas do AVE e derivaçons auxiliares desta (tais como gestom de túneis ou electrificaçom). O tratamento de privilégio da Junta com certas companhias é também chamativo, se bem nom tam evidente. O governinho autonómico apostou em dar o 56% das suas adjudicaçons de obras a um total de dez empresas.
Empresas amigas, baixo suspeita
Demonstrando mais umha vez que a corrupçom fai parte substancial do capitalismo espanhol, umha recente sentença judicial deita umha longa sombra de suspeita sobre o mega-projecto do AVE e a rede político-empresarial que o promoveu. A Comissom Nacional de Mercados e Concorrência multou recentemente catorze empresas participantes na linha Ourense-Compostela do AVE; quatro das multadas fam precisamente parte das beneficiadas por adjudicaçons do Estado e da Junta: Elecnor, Alstom, Indra Sistemas e Electren Tenice.
O delito provado foi o falseamento da livre concorrência ou, por outras palavras, a consolidaçom dumha posiçom de monopólio baseado em redes clientelares. O ‘crumpy capitalism’ ou ‘capitalismo de compinches’ permitiu estas companhias repartir o bolo das obras, excluindo as suas rivais em contratos previamente amanhados. Doravante, 15 companhias terám que pagar 118 milhons de euros em multas, e 14 dos seus directivos afrontam sançons de até 660000. Todas estas empresas enfrentam agora a proibiçom de assinar mais contactos com a administraçom.
Capital sem pátria?
Se o capital tem pátria ou nom, se a oligarquia económica promove ou nom adesons nacionais, esse é um velho debate da sociogia e os movimentos emancipadores. No caso que nos ocupa, umha parte importante do tecido empresarial artelhado por volta das grandes infraestruturas tem relaçom nominal com a Galiza; mas em nengures na sua política de empresa se alvisca qualquer identificaçom com o país.
Apenas três empresas de construçom recebem o 30% das adjudicaçons em território da CAG. Umha delas é a ourensana ‘Construcciones Paraño SA’ (COPASA), fundada em 1985, que experimentara umha rápida decolagem desde os primeiros governos do fraguismo. A imprensa comercial menos cercana ao PP já assinalara a meados na década de 90 a sua relaçom evidente com o PP. Os principais accionistas da companhia partilhavam diversas empresas com Aurélio Miras, deputado no Hórreo e membro da executiva do PP. O próprio irmao de Jesus Palmou, Higinio Palmou, era um dos trabalhadores na sede ourensana da empresa; apresentado como um ‘simples chófer que fazia recados’, era titular dum poder que lhe permitia retirar fianças da administraçom.
COPASA é o tipo de grande empresa histórica das elites galego-espanholas desde o saqueio da posguerra, relacionadas com sectores económicos tradicionais (conserva, transporte, alimentaçom, construçom), fundida com o poder político desde os ámbitos locais e dinamizadora de actividades com pouco input tecnológico e valor engadido.
A globalizaçom, certamente, transformou este modelo empresarial e, no ronsel da globalizaçom, criou-se outro tipo de companhia, aberta ao exterior e progressivamente desgaleguizada na sua composiçom étnica. Outra das empresas beneficiadas polo dedo do poder é a conhecida San José, fundada polo pontevedrês Jacinto Rey, desenvolvida em vários continentes, assente em Madrid, e tristemente conhecido no mundo nacionalista pola compra e afundimento do histórico A Nosa Terra. Rey é um dos grandes milhonários da construçom no Estado espanhol, conhecido politicamente por tecer redes de relaçom com todos os partidos institucionais (tentou-no inclusive com o nacionalismo autonomista galego, contribuindo para fundir o seu prestígio). Embora a imprensa do regime promociona San José como emblema do ‘empresariado galego’, no web da companhia o galego está ausente; Rey mora em Espanha e visita apenas a nossa Terra nos seus veraos nos círculos elitistas de Sam Genjo; os seus filhos, Jacinto e Javier Rey González, dirigentes da companhia, som quadros formados entre a Universidade San Pablo CEU e os Estados Unidos; no conselho de administraçom da empresa, Rey situou grandes capitalistas hindus como Sunil Kanoria, argentinos como Guillermo Nielsen, ou árabes como Nasser Homaid Salem Ali Aldarei (que facilita o trabalho de San José para os regimes despóticos do Golfo).
História dumha fugida
Repassarmos a grande empresa que repassarmos, veremos uns traços comuns no capitalismo autóctone: o seu nascimento liga-se com condiçons sociais e económicas endógenas; no seu desenvolvimento, as empresas estreitam vencelhos com Madrid, e entre os seus quadros dirigentes começam a aparecer nomes espanhóis; com a passagem do tempo, e no quadro da globalizaçom selvagem, crescentes porçons do seu capital estrangeirizam-se.
O mesmo modelo cumpre-se numha outra das grandes empresas adjudicatárias, Acciona. A maioria do público identifica-a com a poderosa saga dos Entrecanales Ibarra, e acerta; mas é menos conhecido que a sua fundaçom tivo lugar na Galiza em 1862. Denominava-se MZOV (Compañía de los Ferrocarriles de Medina del Campo a Zamora y de Orense a Vigo) e posteriormente fusiona-se com umha companhia de construçom da burguesia catalá; é a finais do século XXI quando se aprova a fusom com Entrecanales y Tavora, para dar lugar à terceira construtora espanhola.
Mesmo a galeguidade do Grupo Puentes, enxalçado permanentemente pola mídia como o emblema da ‘engenharia de futuro’ desenvolvida na Galiza, começa a pôr-se em causa. A empresa de Otero Alonso, cuja direcçom geral estava já em maos da granadina Purificación Torreblanca, esa a negociar a sua venda a umha transnacional chinesa, segundo revelou a imprensa económica no passado agosto.
Um modelo alheio
Independentemente da origem étnica dos grandes oligarcas, as grandes empresas de construçom, mergulhadas numha campanha sistemática de remoçom do nosso território, levam desde os inícios da jeira democrática executando os planos radiais de Espanha na Galiza. Um tecido de transportes que dificultou ou cortocicuitou a interrelaçom das nossas comarcas, mimando apenas o rápido contacto com Madrid. A única preocupaçom de vertebraçom interna foi apenas a artificial concentraçom de populaçom e actividade na conurbaçom que vai de Ferrol ao Porrinho, fomentada pola AP-9.
Ainda sem imaginarem o AVE ou a invasom de betom, os nossos devanceiros captárom-no com inteligência. Urbano Hermida, o independentista berciano da SNP escrevia n’A Fouce em 1933:
‘Fazendo gala de muito tropicalismo ou de ignoráncia, afirmou-se que a ferrovia de Ourense era questom de vida ou morte para Galiza; nom hai tal (…) A Galiza fam-lhe falta muitas vias de comunicaçom mas se temos em conta a fabulosa riqueza hidráulica que possímos, damo-nos conta aginha que o lógico é encarar a comenência da construçom de ferrocarris eléctricos. Itália graças ao aproveitamento da electricidade tem excelentes ferrocarris, cujas tarifas som as mais baratas de Europa. Cito este exemplo de fora ainda que temos na casa os eléctricos de Vigo-Baiona e o de Corunha-Sada, cujas vias quigera eu ver alongar-se por todos os recunchos da nossa Terra até chegar a ter umha bem tecida rede, cujas cabeças estivessem nos nossos portos e nom numha estepa estrangeira (…) O feito é que se queremos deixar de ser um viveiro de emigrantes que vam levar a outras terras o melhor da sua vida, temos que afazer-nos à ideia de que os nossos problemas, desde a repovoaçom florestal até o fomento da nossa riqueza, e desde a organizaçom do nosso comércio interior e exterior até este problema dos transportes, tém que ser plantejados e resoltos por nós e para nós.’