A imprensa obediente e subsidiada deu a notícia com o seu costumeiro tom apologético: a Galiza será sede dumha universidade privada que concorrerá com os centros públicos, agravando ainda mais a delicada situaçom dum ensino público falto de financiamento e deficitário em recursos e alunado. Com centro administrativo em Compostela e actividades académicas em Corunha e Vigo, a nova instituiçom educativa continuará a afundar também a híper-concentraçom de infraestruturas e recursos no occidente da Galiza, que se arreda a passos agigantados dum interior desertizado.

No parlamentinho, o partido governante apresentou o anteprojecto de lei que dará lugar à Universidade Intercontinental da Empresa. Promoverám-se graus, mestrados e doutorados em áreas, ‘muito ligadas ao mercado’, como nom podia ser de outra maneira. Ciências sociais e jurídicas, engenharia e arquitectura serám as áreas priorizadas.

Na foto de apresentaçom do projecto, um velho conhecido, muito reverenciado polas elites galego-espanholas: Juan Carlos Escotet, proprietário de Abanca e de Banesto, o milhonário mais poderoso da Venezuela, que soubo sortear com habilidade o ascenso do projecto bolivariano salvando a sua fortuna e os seus investimentos. Desde que as velhas Caixa Galicia e Caixa Nova esboroárom, consumando a privatizaçom definitiva das poupanças das galegas e galegos, Abanca entrou numha época dourada. 2018 foi o seu melhor exercício, com um benefício neto de 430 milhons e umha rendibilidade do 11 % superior aos seus competidores.

Juan Carlos Escotet, proprietário de Abanca e Banesto participou da apresentaçom da nova entidade educativa privada. Fizo da crise virtude e colocou Abanca em 2018 com uns benefícios milionários.

Pobre propaganda da Junta

A notícia do anteprojecto suscitou as críticas da oposiçom institucional e, de maneira velada, das próprias hierarquias académicas. No parlamentinho, Luís Villares acusou Feijoo de querer reduzir alunado no sistema universitário público com a chamada ‘cláusula de estabilidade’, que limita o número de vagas, e considerou lamentável o feito de o documento do PP nom conter ‘nem memória técnica nem académica.’

Na passada semana, o presidente da Junta aproveitou a inauguraçom do curso académico para enxalçar a sua gestom em matéria educativa. Com um financiamento às três universidades de 433 milhons de euros no passado exercício, ‘bateu-se um registo histórico’, manifestou o líder direitista. Na realidade, as declaraçons fórom desafortunadas, e fixérom-se quando já se conhecia um informe muito severo da Associaçom Estatal de Directores e Gerentes de Serviços. No documento, a Galiza aparece como umha das quatro comunidades autónomas (com a Catalunha, Castela A Mancha, e Andalucia) onde o gasto público ainda está por baixo do habitual na época pre-crise, isto é, antes de 2009. Antonio López, reitor da USC, e em absoluto conhecido por posiçons contundentes, manifestou no seu discurso que a universidade pública está num ‘momento crítico’. Exigiu um ‘quadro geral de financiamento’, e ‘recuperar os recursos perdidos durante a crise’. Tais palavras som coerentes com a sua linha discursiva desde que alcançou a reitoria. Em entrevista aos meios, o professor de Direito Financeiro lamentou-se de que a achega pública às universidades nom alcance ‘o 1 % do PIB’, e de que a inestabilidade laboral seja um dos elementos definitórios da instituiçom.

Antonio López, actual reitor da USC pom de manifesto “momento crítico” da universidade pública.

O programa de ferro dos neoliberais

Na década de 90, eram apenas quatro as universidades privadas no Reino de Espanha: Navarra, ligada ao integrismo católico ; Deusto, foco de formaçom das elites conservadoras bascas ; e as Pontifícias de Salamanca e Comillas. Num processo imparável fomentado pola direita extrema, em apenas duas décadas, o número de universidades privadas multiplicou-se por cinco. Especialmente ilustrativo foi o caso de Madrid, banco de provas por excelência da direita espanhola mais agressiva. A dia de hoje, no centro da Península existem treze universidades privadas, face seis públicas.

As classes dominantes adoitam seguir planos estratégicos com o horizonte posto na longa duraçom. Assim, nom podemos entender a extensom destes focos de concorrência e darwinismo social sem entender o que supujo a LOU. Aprovada em 2001 com a oposiçom de boa parte do mundo académico e das massas estudantis, aquela iniciativa da ministra Pilar del Castillo bateu em Compostela com mobilizaçons históricas de direcçom assemblear. Umha vez estabelecida, porém, o quadro legal permitia dar igual personalidade jurídica a centros públicos e privados, deslocando os custes das instituiçons para os usuários. Por palavras do professor Isidro Moreno Herrero em entrevista no diário Público, ‘a LOU foi a resposta política de quem considera a iniciativa privada um aliado estratégico no logro dum ensino (…) de maior qualidade, no canto dumha concorrência ou ameaça.’

Universidade de Navarra, vinculada ao integrismo católico, é umha das universidades decanas no Estado espanhol.

Na época de Wert como ministro de educaçom, as condiçons para a fundaçom dum centro privado ainda se flexibilizárom. Além de estándares de tipo técnico (tamanho, extensom, instalaçons), toda entidade que ‘ofereça titulaçons oficiais’ pode considerar-se universidade. Muitas delas, de feito, nom realizam labores de pesquisa. Os resultados fórom incontestáveis : se em 2008-2009 apenas o 15 % optavam por umha universidade privada para realizarem os estudos de mestrado, em 2017-2018 eram já o 36 %. O deslocamento de alunado da pública à privada foi promocionado politicamente desde 2011. A suba dos preços de matrícula desde o ano 2011 encareceu os graus num 29 %, muito mais do que subírom os salários desde entom.

Espanholizaçom e servilismo à vista

A universidade foi, no último médio século no mundo occidental, um campo fértil para o pensamento crítico, formas de sociabilidade alternativa, e obviamente experiências militantes. O campus compostelano tivo um papel memorável na oposiçom à ditadura, mas também na formaçom de milhares de quadros do movimento nacional que espalhárom o nosso ideário, umha vez licenciados, por todo o território da Galiza. A privatizaçom da experiência estudantil, unida à sua vinculaçom exclusiva aos filhos da burguesia e pequena burguesia, tem sempre consequências negativas para a saúde dum povo. Levando em conta que as classes abastadas que promovem a futura Universidade Intercontinental odiam a língua e identidade galegas, prepara-se outro foco activo de espanholizaçom e fomento de valores individualistas e insolidários. Por isso o independentismo e o nacionalismo entendêrom a defesa dumha universidade pública e realmente popular como defesa da coluna vertebral da naçom futura.