Ranha-céu

Porque eu sou do tamanho do que vejo

F. Pessoa

Waits cantava baixinho

mentres apanhávamos

musas rotas de par dos contentores da praia

I like my town

dizia

with a little drop of poison

exalando o fume negro do cigarro

sobre o mar

esta dá para uns poemas

há que lavar-lhe a cara

deitava-la na mao coma quem cuida unha lapa

miravas-me do abismo

cravavas-me o receio

as luzes dos faróis brincavam-che coas bágoas

Depois

desde o balcom

acovilhados na noite espessa de licor

nós

lindeiros da brancura

recolhíamos palavras dum palangre furtivo

estendiamo-las no chao sobre um hule de nácar

e tecíamos versos livres até a alba

Encirradas as bandadas de gadoupas do ventre

agromavam-nos punhos nos braços ergueitos

que floresciam à luz dumha estrela

tam próxima…

e bicavam-se no alto

num big bang incendiário

os corpos teu e meu impregnados de lascívia

dançantes cometas embriagados

centrífugos

arrebolando a infância ao telhado da lua

Longe

soavam os disparos da morte

como conchas estalando baixo os pés dum gigante.