Em muitas ocasions, o povo vai por diante dos seus governantes, a consciência por diante da lei. É o caso do rechaço à tauromáquia, que alcança nos últimos anos umha dimensom importante que fai modificar leis e costumes. Ainda que na Galiza esta prática foi de importaçom espanhola e massivamente ignorada polas classes populares, a indiferença virou rejeiçom. ‘Touradas fora de Ponte Vedra’ demonstrará-o mais umha vez com manifestaçom no vindouro sábado.
Debate-se ainda qual é a origem do espectáculo taurino. Certos pesquisadores situam-no na Creta pre-cristá. As fontes som contundentes na hora de recolher o combate desigual entre um homem armado e um touro no circo romano. Júlio César assentou esta forma de morte, segundo conta o historiador Plínio O Velho. Também o escritor romano Ovídio dá conta do chamado ‘karpíforo’, onde um touro embestia um pano vermelho.
Longa controvérsia
Nos reinos peninsulares, os primeiros valedores da hegemonia castelhana fixérom da tauromáquia umha prática assentada. Assim aconteceu com Carlos V, afeiçoado confesso à matança de animais ; também Felipe III e Felipe IV defendem a ‘festa’. O primeiro constrói a praça de touros em Madrid e o segundo estoca mais de 400 javarins. Os monarcas espanhóis pressionarám sempre contra a proibiçom eclesiástica das touradas. Num Concílio celebrado em Toledo em 1565, a hierarquia católica diz que as touradas som ‘mui desagradáveis a Deus’. E dous anos mais tarde, o papa Pio V fai pública umha bula abolicionista que ameaça com excomunhom os matadores de animais. A pressom dos monarcas hispanos suaviza a pressom eclesiástica. Com Gregório VIII, a proibiçom é matizada.
Bem é certo que com Felipe V e o seu reformismo borbónico a tauromáquia oficial recua de novo. Com a influência francesa proibem-se as ‘fiestas de los cuernos’. Em contrapartida, começa a abrir-se passo umha tauromáquia popular em ruas e praças mesetárias e mediterráneas, por vezes com concurso da religiom. Os jogos com bezerros nas ruas, perseguidos, com os cornos acesos ou maltratados em diversas formas ganham peso na Península nos séculos XVI e XVII. Procura-se ‘um touro burlado, humilhado e morto polo povo de a pé’, diz umha confraria sevilhana na Idade Moderna. Nestes tempos, um crescente sector económico dos matadeiros aproveita-se do divertimento popular com o mau trato. Começam a extender-se os pastos para touros, e construem-se praças permanentes. Na América, a hispanidade legará este espectáculo através dos seus enviados coloniais.
Crítica ilustrada
O receio ante a tauromáquia nom é umha moderna atitude animalista. Os ilustrados abandeirárom-na desde postos de responsabilidade governamental. O Conde de Aranda limitou-na ao máximo, e o reformista afrancesado Melchor de Jovellanos foi fero detractor. Um déspota ilustrado como Carlos IV fijo cumprir esta lei antitaurina em 1805 : som os touros ‘pouco conformes à humanidade que caracteriza os espanhóis, causam um conhecido prejuízo à agricultura polo estorbo que oponhem ao fomento da gadaria vacuna e cabalar, e o atraso da indústria polo lastimoso estrago de tempo que ocasionam em dias que devem ocupar os artesaos nos seus labores.’
Inquisiçom, feche de universidades, polícia…e touros
Alguns emblemas da ‘Espanha negra’ associam-se naturalmente. Fernando VII procurou ganhar o fervor popular recuperando os touros com morte. Foi o mesmo monarca que recuperou a Inquisiçom à volta do seu exílio e, quando este órgao foi disolto por pressom europeia, o que fundou a polícia nacional, corpo especializado -como hoje- em perseguiçom política. Ao rei absolutista cabe o honor também de purgar as universidades de liberais e até mesmo, no final do seu reinado, de clausurá-las. Há umha tradiçom escura do projecto espanhol que fai casar vários retrocessos de maneira simultánea.
Na etapa isabelina a tauromáquia fica num baleiro legal que nom impede as praças funcionarem, nem a Escola de Tauromáquia, constituída em 1834, seguir com as suas ensinanças. Medra o lobby económico ligado à gadaria latifundista e, ao abeiro da Restauraçom, o espectáculo consolida-se. A Espanha do caciquismo, a guarda civil e os touros alcança rango de tópico, e nom só.
‘Lástima de bois’. Indiferença na Galiza
Em vilas galegas desenvolveu-se umha restrita afeiçom toureira ligada às elites galego-espanholas que chegaram da Meseta com a ocupaçom castelhana. Segundo o historiador Montero Aróstegui, a primeira corrida formal na Galiza regista-se em Ferrol em 1803, com gado e pessoal chegado de Espanha. Porém, o maior desenvolvimento taurino liga-se à burguesia foránea da Restauraçom, ou às pseudo-elites alheeiras das cidades. De feito, as grandes praças de touros (Compostela, Ponte Vedra, Corunha, Noia, Ferrol…) som das décadas de 80 e 90 do século XIX. Castelao eternizou o abraio labrego ante o maltrato gratuíto no seu ‘lástima de bois’.
Nos últimos anos, como em todo o mundo occidental, a sensibilizaçom com o mau trato animal extendeu-se no nosso país. Este fenómeno, junto com a forte identidade galega, deu pé na nossa terra a um forte movimento antitaurino que cada verao se manfiesta com força -nom por acaso- em duas das cidades mais espanholizadas, a Corunha e Ponte Vedra. Um estudo de 2010-2011 registava que 99,9 % da populaçom galega nom assistia aos touros.
No passado, os governos de várias cidades fixérom frente comum na iniciativa ‘Galiza, melhor sem touradas’. Plataformas populares denunciárom o apoio de deputaçons como a pontevedresa ao lobby taurino, e apontárom que existência de corridas ‘som umha autêntica excepçom na lei de protecçom animal’.
Espanholismo cercado
Nom surprenderá que a praça de touros de Ponte Vedra, que reúne à oligarquia local cada verao, esteja em maos da família Lozano. De origem manchega e ligada ao sector latifundiário, som proprietários de praças como a de Córdova, Saragoça, Aranjuez ou Albacete. Na sua página web definem o fundador como ‘prototipo del hidalgo manchego’. Eduardo Lozano, responsável da praça pontevedresa, reconhece que ao estar a nossa terra longe de qualquer foco taurino, ‘exigiu um grande esforço de difusom e criaçom de afeiçom.’
O espanholismo considera a pervivência taurina como um logro, se fixermos caso da imprensa militante. ‘Pontevedra, perla taurina de Galicia’, intitulava o ABC há uns anos ; e ‘El Mundo’, em parecida linha, exaltava a ‘última plaza de Galicia, dique de contención de las Mareas’. Os jornalistas espanhóis chufam-se das 48 penhas taurinas que, subsidiadas polo lobby toureiro, malvivem na cidade do Leres, contrárias ao sentir popular.
No vindouro sábado terám que escuitar de novo o berro ‘Agora aboliçom’. Umha manifestaçom sairá às 20hh00 da Peregrina, e rematará com um discurso da actriz e youtubeira Baia Fernández.