Descobrirmos que em 1931 se proclamou a República Galega provocou mais umha vez em nós o sentimento de que umha parte importantíssima da nossa história nos estava a ser sequestrada. Os jornais da Galiza, Portugal, Espanha, Guiné Equatorial, Argentina, etc., deram conta da proclamaçom da República Galega no 25 e 27 de Junho de um agitado 1931 e, porém, ainda hoje para boa parte da historiografia “nacionalista” galega isso foi pouco mais do que umha lenda urbana. De êxito efémero, mas a Galiza foi independente durante umhas horas: em Ourense assaltam a Governo Civil e retiram a bandeira espanhola colocando a galega, enviam-se telegramas aos jornais de todo o mundo para dar a nova, e as sereias das fábricas ressoam de júbilo toda a noite. Na Corunha a notícia recebe-se com euforia, e em Compostela exige-se a criaçom do Estado Galego no pleno municipal e nas congregaçons obreiras. E assim chega o 27 de Junho, com a demissom dos poderes na capital da Galiza e a assunçom destes por parte da Junta Revolucionária da República Galega, com Alonso Rios, Campos Couceiro, José de Valenzuela, Eduardo Ponte, Manuel Beiras, etc… Duraria pouco, mas ninguém nos vai tirar o orgulho de recordá-lo.

Nos soubemos desta consumaçom do arredismo galego polo facsímil da crónica de El Pueblo Gallego divulgada polo Partido Comunista do Povo Galego na sua página web. Ao pouco o portal galizalivre.org transcreveu e traduziu para o galego o conteúdo do mesmo, e começou a circular pola rede. Começamos a investigar e pouco encontramos: Lois Pérez Leira anunciara numha entrevista que estava a preparar um livro sobre o tema que finalmente nom realizou. As referências da história do nacionalismo galego mencionavam o caso apenas como umha anedota ou, as mais das vezes, nem o mencionam. Em geral, a época que vai da queda da Ditadura até as Cortes Constituintes da IIª República espanhola nom parecem estar estudadas mui afundo: e é o período mais revolucionário do nacionalismo galego.

O esquecimento desta época efervescente, e do fito da proclamaçom da República Galega, também se deve em boa parte à composiçom dos protagonistas da mesma: o sector mais arredista do nacionalismo galego e o componente obreiro, ambos os dous ingredientes demasiado grossos como para passar a peneira da versom oficial da história do nacionalismo que nom é outro do que o pinheirismo. A República Galega foi a uniom de dous factores: a) a culminaçom da greve revolucionária dos trabalhadores do caminho-de ferro, que contava com o apoio da pequena-burguesia que via no comboio a chegada do progresso, e b) o passo à prática de um processo constituinte de um Estado Galego que começou ao pouco de se proclamar a República Espanhola, visando ser umha das naçons da República Federal, e no que a Assembleia do 4 de Junho na Corunha se erguerá numha espécie de governo provisório com Alonso Rios à cabeça. No entrelaçado destes dous conflitos tenhem um papel importantíssimo os galegos chegados de América que traziam um nacionalismo muito mais radical, muito mais arredista, e umha bagagem importantíssima nas luitas obreiras que lhe era totalmente alheio aos galeguistas de aquém-Mar. Confluírom, pois, o nacionalismo bonaerense encarnado em Alonso Rios (que, contodo, nem pertencia à aza mais radical do mesmo, a independentista, senom à possibilista e socialista), e os revolucionários obreiros como Eduardo Ponte, protagonista de várias insurrecçons anarquistas em América do Sul. Mistura avondo incendiária como para que o pinheirismo figesse passar estes factos por próprios da juventude irresponsável, e nom umha data a recordar.

Advertimos também do caracter deste texto: nem somos especialistas em história, nem a urgência da investigaçom ―decidimos há apenas uns meses comemorar esta data―, nos permitírom fazer um texto tam rigoroso como quigermos. Aqui aparece mais ressaltada a história de um dos dous factores ou pólos desta proclamaçom da República Galega, que é a do nacionalismo. Esta investigaçom necessita, com certeza, de especialistas na história do movimento obreiro galego para sinalar dados, protagonismos e factos de importáncia que a nós seguramente se nos escapárom.

No mundo do independentismo apenas era conhecida a anedota que conta nas suas memórias Luís Souto, o companheiro comunista de Castelao na sua gira polas Américas. Nelas relata como o médico ourensano Fernandes Carneiro com outros camaradas, “proclamou a República Soviética Galega Independente na cidade de Ourense. O choio foi deste jeito: O doutor, com quatro ou cinco companheiros mais, obreiros da construçom, subiu ao Governo Civil na rua do Progresso, prenderam o Governador, pecharam-no num quatro, retiraram a bandeira republicana do balcom do Governo Civil e içaram umha com umha fouce e um martelo vermelho, que dizia em letras douradas República Soviética Independente de Galiza”. Souto diz que foi em 1932, sem especificar o mês; mas outros historiadores sustenhem que na realidade a proclamaçom aconteceu no 14 de Abril de 1931, e outros relacionam-no com a República Galega de finais de Junho da que nós falaremos. Em todo caso é bem significativo que seja mais conhecida esta anedota do que os factos que no 1931 abalárom por primeira vez a ideia de mesmo umha Hespanha com “H” para atrever-se a pôr na prática um autêntico exercício de autodeterminaçom.

Nós fazemos nossas as palavras dum dos protagonistas da proclamaçom da República Galega, Manuel Beiras García –pai de Xosé Manuel Beiras–, e dizemos sem complexos que “ainda quando se trate de restar-lhe importáncia, terá sempre para nós, os amantes de umha Galiza livre, umha transcendência exemplar digna de ter presente”.

* Limiar do livro 27 de Junho de 1931: proclama-se a Republica Galega, editado por A. C. Lucerna (Cerzeda), A Revoltaina Cultural da Beira de Bergantinhos (A Laracha), A. C. Foucelhas (Ordes), A Gentalha do Pichel (Compostela), galizalivre.org, Escola Popular Galega e Editorial Corsárias.