Os laços galego-portugueses fôrom revisitados umha e outra vez pola historiografia, dando especial privilégio ao ámbito das afinidades culturais e ao diálogo das elites dissidentes a ambas beiras do Minho. Esta visom intelectualista, que com toda provabilidade está muito influenciada polo peso que os sectores pequeno-burgueses tivérom e tenhem no galeguismo, deixou porém de parte na memória popular outras manifestaçons de irmandade, como pode ser a cooperaçom guerrilheira liderada por José Velo Mosqueira no DRIL da luita contra Franco e Salazar ou, bem mais atrás no tempo, a criaçom de estruturas proletárias estáveis entre galegos e portugueses. Os Congressos Operários Galego-Portugueses fôrom um grande fito internacionalista que resgatamos neste artigo.

Teixeira de Pascoaes, Rodrigues Lapa, Guerra da Cal, Otero Pedraio, som alguns dos nomes galego-portugueses que venhem à nossa cabeça ao pensarmos na longa lista de pensadores aderidos à recuperaçom da velha unidade occidental peninsular. Mais difícil nos resulta pensar, ainda, nos milhares de galegos e portuguesas anónimas que cruzárom a raia numha ou noutra direcçom, para continuarem caladamente a influência recíproca das duas terras irmás. Há quase umha década, o historiador Dionísio Pereira chamara a atençom sobre este défice com a obra ‘Emigrados, exilados e perseguidos. A comunidade portuguesa na Galiza (1890-1940)’, editado por Através Editora. Na realidade, longe das esferas intelectuais, existiu umha viçosa influência lusa na Galiza, nutrida por emigrantes, exilados e também militantes que contribuírom com os seus braços e cerebro ao ideário internacionalista. Assim, ainda que é certo que muitos portugueses fôrom empregados pola patronal galega como furagreves, as iniciativas solidárias entre ambas as bandas enfraquecêrom estas práticas divisionistas. Que o povo português contribuiu para a nossa emancipaçom demonstra-o o feito que, segundo os dados manejados por Pereira, por volta de 300 vizinhos do sul fôrom retaliados trás 1936 ; deles, perto de setenta perdêrom a vida a maos do fascismo.

Congressos obreiros: rachar a fronteira

Na viragem de século, a nossa Terra encetava o caminho cara a chamada ‘sociedade de massas’ : o sufrágio universal masculinho levava à politizaçom também das classes populares, o proletariado das pequenas cidades medrava ao alento dumha tímida industrializaçom, e o agro fervia com a demanda da aboliçom foral. Como pano de fundo, em sectores destacados da nossa intelectualidade frutificara a ideia da nossa condiçom nacional : os estudiosos descobriram a existência dum reino milenário, e a nossa língua voltara à letra impressa, também na prosa política, desde o esforço de Lamas Carvajal e o seu ‘Tio Marcos’.

Naquela Galiza em mudança, penetrara o anarquismo, nomeadamente na Corunha, centro atlántico ligado como sempre às correntes de pensamento mais avançadas ; parte do proletariado viguês aderia ao socialismo, e em Compostela, apesar do peso abafante da igreja, o movimento obreiro fixera-se actor político local, em aliança com os republicanos. Lá onde a luita de classes virava mais intensa, a patronal recorria às suas armadilhas : umha delas era a contrataçom de obreiros portugueses como furagreves (ao sul do Minho, os capitalistas faziam o mesmo com trabalhadores galegos).

Neste contexto, e graças às facilidades de comunicaçom fornecidas polo caminho de ferro, a classe operária de ambas as margens do Minho decide-se a um passo audaz. No 17 de janeiro de 1901 sindicatos proletários galegos e portugueses convocavam os seus delegados a um encontro em Tui. A cidade fronteiriça foi, no primeiro quartel da centúria, foi um foco importante do socialismo, do republicanismo e do galeguismo, daí a forte resistência que vai plantar aos golpistas em 1936.

Três décadas antes, naquele inverno de 1901, 59 credenciais representavam 92 associaçons dos dous países. O delegado corunhês José Rodríguez presidia a sessom, e a mesa do congresso apresentava um reparto paritário entre galegos e portugueses. A imprensa da época fala de sucesso de convocatória, e recolhe como umha das conclusons a celebraçom de comícios em Vigo e em Ourense para divulgar as iniciativas aprovadas. A partir de entom, umha comissom permanente ficava estabelecida na cidade olívica, presidida polo tipógrafo socialista Enrique Botana.

Dous novos congressos

A coordenaçom continuava um ano depois, e no 5 de abril de 1902, 84 obreiros, representando sociedades galegas e portuguesas, encontravam-se em Viana do Castelo. O peso dos galegos do sul era importante, com delegaçons de Moanha, Baiona, Ponte Vedra ou Baiona, mas de novo os proletários compostelanos tinham um papel de destaque. Baixo a presidência do português Vitorino Ribeiro de Miranda congregárom-se os ofícios que constituiam o grosso do tecido produtivo urbano da Galiza : trabalhadores da via, pedreiros, sapateiros, tipógrafos, curtidores, barbeiros, toneleiros…no encontro vianês projecta-se a criaçom dum meio impresso conjunto e a consolidaçom da estrutura conjunta, a Uniao Operária Galego-Portuguesa. Umha das teimas do obreirismo da altura era a formaçom e instruçom da classe, o labor formativo como passo imprescindível para livrar batalha. Umha das resoluçons do encontro estabelecia que ‘…enquanto existe umha classe que ordena e outra e outra que tem que obedecer, umha classe que todo o possui e outra que nada pode dispor, ou esta se prepara convenientemente ou nom estando preparada é impotente para as causas da sua miséria.’

Em 21 e 26 de abril de 1903, o derradeiro congresso do ciclo tem lugar em Braga, baixo a presidência de Inácio Lourenço. O encontro, que se acompanhou dumha manifestaçom e dumha excusom de convívio, reclamou a jornada de 8 horas, o sufrágio universal e a liberdade de consciência, partindo da separaçom da igreja e o Estado. Tratou-se do ponto e final dumha iniciativa valente e prometedora, já que o IV congresso, programado para se celebrar em Ponte Vedra, nunca tivo lugar. A causa aduzida foi a concidência com o Congresso de Agrupaçons Socialistas da Galiza. As dinámicas internas e a lógica das políticas estatais puido com esta tentativa de reencontro galaico-português. Para o investigador Eliseo Fernández, ‘a tentativa de solidariedade malogrou-se, mas os seus frutos ainda ficárom por muitos anos entre os obreiros das duas margens do Minho.’