Pio R. Terraço e Antolim Faraldo (traduçom do Galiza Livre)/
A historiografia oficial espanholista costuma apresentar a Revoluçom Galega de 1846 como um pronunciamento progressista espanhol com lenes recendos galeguistas mercé à participaçom dos chamados “provincialistas”, arroutados românticos para ela. Porém, umha leitura directa dos textos daquele movimento nom só constata a existência das duas almas, a do militarismo liberal espanhol e a do galeguismo revolucionário, mas também a hegemonia do segundo. Para além do manifesto ultra-conhecido, em que, cabo do Galiza como “colónia da Corte” que se ergue pola sua liberdade, aparecem repetidas palavras de ordem do liberalismo espanhol, cumpre repararmos nos artigos que aquela revoluçom aprova. Umha verdadeira declaraçom de independência na práctica que significa o povo galego como sujeito moderno na história, de maneira semelhante às independências americanas três décadas anteriores. Aliás, a influência libertária em Ramom de la Sagra, mestre daqueles primeiros galeguistas, percebe-se nas medidas a favor das classes populares. Chegam a nacionalizar a banca e comunitarizá-la nas juntas comarcais, a anular a reforma tributária de Mon-Santillán e a fixar os preços do sal como primeiras medidas revolucionárias. Velaqui a entrada, o final e alguns dos artigos aprovados por aquele governo da Galiza soberana que presidiu Terraço e do que foi secretário de Estado Antolim Faraldo.
Junta superior provisória do Governo da Galiza
Devecente por demonstrar com factos palpáveis a lealdade das suas intençons e o grandioso objecto dos seus pensamentos em favor da sempre humilhada e abatida Galiza, esta junta bole a ditar as disposiçons seguintes, encaminhadas todas a fazer forte a revoluçom, e a destruir instituiçons opressoras e absurdas que desmentem a bondade das doutrinas liberais e a civilizaçom moderna. Todas estám em harmonia com os princípios proclamados em Lugo o dia 2 de Abril, e há muito tempo que recebérom a aprovaçom do país inteiro, porque som o eco das suas necessidades e o cumprimento dos seus desejos. Estas medidas, precursoras doutras muitas, grandes e benéficas, ham-lhe infundir ao povo galego a segurança de que com a revoluçom do 46 se inaugura a segunda época da sua história. A Junta Superior da Galiza nom vai perder de vista um só intre que podem aspirar a muito dous milhons de cidadaos laboriosos e honrados, unidos polo laço do interesse comum; e ao serem tam preciosos estes momentos nom se detém a expor as numerosas razons que a movem a decretar o seguinte:
Artigo 1º
Declaram-se nulos todos os actos do Governo de Madrid desde o dia 2 deste mês.
Artigo 2º
Todas as juntas existentes na Galiza e as que se forem constituindo ficam declaradas auxiliares desta Superior.
Artigo 3º
Todos os concelhos cessam definitivamente nas suas funçons: ham ser substituídos polos que existiam no ano 1843. Se algum destes nom merecer a confiança pública, há nomear outro a Junta de distrito.
Artigo 5º
Fica abolido o sistema tributário. Todo funcionário público ou qualquer pessoa que infringir esta disposiçom, há ser castigado com o quádruplo das quantidades que perceber para além da pena à que está sujeito polo art. 19.
Artigo 9º
Fica suprimida a polícia: os alcaides ham desempenhar as funçons que lhe estavam confiadas, consonte à lei do 3 de Fevereiro.
Artigo 11º
Desde o momento em que se constituir umha Junta em qualquer vila, o comissionado ou representante do Banco de San Fernando, como depositário dos caudais da naçom, há pôr estes ao serviço dela.
Quem contravinher esta medida, além de ficarem comprendidos no art. 19, ham responder com os seus bens ou os dos seus fiadores das quantidades que retiverem ou entregassem aos funcionários do ex-governo de Madrid.
Artigo 12º
Todo o sal existente nos armazens da Galiza se há vender ao preço de 25 reais a fanega, com intervençom recíproca dos empregados do ramo, e das Juntas e concelhos respetivos; a quem se encarrega o cumprimento desta disposiçom.
Artigo 13º
Umha comissom do grémio e Claustro da Universidade de Santiago há propor as reformas que cumpre introduzir no plano de estudos de 17 de Setembro para o pôr em harmonia com as boas doutrinas do livre ensino.
Artigo 14º
Todos os licenciados do exército que residirem na Galiza se ham organizar em batalhons que tomarám o nome de “Defensores do Povo”. As Juntas ou concelhos ham dispor o preciso para que podam tomar as armas quando o determinar esta Junta, momento desde o que ham receber quatro reais diários e umha dose de pam.
Artigo 15º
Os “Guardia Civiles” ham formar um corpo intitulado “Guias da Liberdade” e ham gozar do mesmo soldo que até o de agora. Ham estar imediatamente às ordens do general em chefe das tropas da Galiza.
Artigo 17º
Cria-se um esquadrom de cavalaria em cada província da Galiza. Para tal fim, declaram-se expropriadas todos os cavalos e bestas de alçada de sete quartas com a rebaixa de quatro polegadas.
Artigo 19º
Declara-se traidor à causa nacional a todo aquele que direta ou indiretamente contrariar a revoluçom iniciada o dia 2 na cidade de Lugo.
Artigo último
As Juntas, concelhos e demais funcionários públicos ficam encarregados do rápido cumprimento das anteriores disposiçons sob a sua mais estreita responsabilidade.
Pátria e liberdade. Santiago, 16 de Abril de 1846. -Pio Rodríguez Terraço, presidente- Por acordo da Junta; Antolim de Faraldo, secretário.