Por José Manuel Lopes Gomes /

A comunidade científica ainda debate nestes dias em que medida a severa vaga de calor que ressequiu a Europa nortenha é devida ao quecimento global ou a umha concatenaçom azarosa de factores. Seja como for, o continente continua a viver fenómenos climáticos extremos e as populaçons urbanas, que nas últimas décadas eram alheias a qualquer preocupaçom polo tempo, começam a decatar-se que os sinais que dam os céus afectam também à nossa existência quotidiana. Neste contexto, a Galiza prepara-se para receber a enéssima vaga de calor africano da presente década.

Em fotografia de satélite, vastas zonas do Reino Unido, a Alemanha ou países escandinavos aparecem tingidas de pardo, como aconteceria em qualquer verao mediterráneo, ou nas comarcas da Galiza mais arredadas da influência atlántica. É a pegada que deixou umha vaga de calor sem precedentes, acompanhada de incêndios florestais quase desconhecidos em tais latitudes. A comunidade científica británica estuda cuidadosamente o acontecido ; mesmo os estudiosos mais prudentes apontam o efeito estufa como um dos agentes fundamentais para explicar o que acontece. A mudança das temperaturas oceánicas e as alteraçons na corrente do golfo podem desenhar para a Europa occidental um novo padrom climático, de consequências dificilmente predizíveis.

Certamente, fenómenos como estes fôrom frequentes desde que existem registos, todo ao longo da era industrial (na que a temperatura global da Terra aumentou um grau) ; a novidade é a frequência com que se produzem, e a amplitude do território que atingem. Peter Stott, do ‘Met Office’ británico, declarava recentemente ao ‘The Guardian’ que ambos os dous elementos provam que nos enfrentamos a um reto de grande magnitude. Michael Mann, pesquisador do centro ‘US Climate’, manifestou : “estamos apenas ante um aviso de aquilo com o que imos ter que lidar no futuro”. O que hoje chamamos ‘fenómenos extremos’, diz o estadounidense, “vai-se chamar simplesmente verao de nom diminuirmos as emissons de carvono”.

O deserto avança

Pola sua ubicaçom geográfica na transiçom entre duas áreas climáticas -eurosiberiana e mediterránea- a Península Ibérica é considerada zona especialmente sensível para a mudança que se avizinha. Porçons do sul português e espanhol achegam-se aos parámetros bioclimáticos africanos, e zonas do leste padecem já fenómenos de desertizaçom.

Trataria-se dumha das zonas da Uniom Europeia onde primeiro se puidessem dar migraçons climáticas. Quanto aos efeitos sociais, económicos e sanitários, som sobejamente conhecidos: vagas de incêndios como as que sacodírom Portugal no verao passado -repetidos há uns dias na Grécia- falam às claras dos perigos do clima imprevisível. A produçom agrária nom demorará em ressentir-se da ruptura dos ciclos naturais, e novos andaços reordenam a distribuiçom das espécies. A avespa asiática e a avespinha do castinheiro som ameaças palpáveis no sul da Europa.

Galiza: calor mais intenso e repetido

Certamente, ainda estamos longe dos registos de calor e seca assustadores que cada ano se batem no país vizinho : no passado verao, a cidade de Córdova aturava a máxima temperatura histórica desde que se conhecem dados : 46,9º, numha sequência temporal de acumulaçom de temperaturas superiores aos 40º, e num espaço geográfico que avança do sul ao norte.

Porém, a nossa Terra tampouco nom se livra de cenários mais do que preocupantes. A área de domínio mediterráneo (o val do Minho, e parte da província de Ourense) está a viver períodos prolongados de seca e temperaturas extremas com maior frequência desde que começou este século. Se os registos climáticos indicam ‘veraos anómalos’ nos anos 1981, 1989 ou 1995 na passada centúria, tais marcas extraordinárias estám-se a reiterar pontualmente desde 2011 até a actualidade. Desta volta, em 2018, o ar requentado acumulado no norte da África ascenderá até a nossa latitude assim que o anticiclom das Azores alcance, fora de tempo, o lugar que habitualmente ocupa desde o mês de Junho. Espera-se que desde a quarta feira até o domingo praticamente toda a Galiza -agás a Costa da Morte e a Marinha- supere folgadamente os 30º. Em áreas do interior beirarám-se os 40º.

Indiferença e cumplicidade

Por palavras do decrescentista galego Manuel Casal Lodeiro, entramos numha fase que podemos chamar de ‘caos climático’, pois desconhecemos exactamente o patrom de comportamento meteorológico que imos enfrentar. Deste modo, os riscos multiplicam-se.

E enquanto o Estado espanhol mantém abertas algumhas das centrais térmicas mais poluintes e directamente responsáveis da situaçom, como Meirama ou as Pontes, a mídia dominante silencia a gravidade do repto que enfrentamos, dando por feito que o actual modelo de consumo e depredaçom vai permanecer intocado neste tempo de colapso e recursos minguantes.

*Fontes : The Guardian, Meteogalicia, Aemet, El País, adiante.gal, informaçom própria.