Por Jorge Paços /

Som as palavras de Antom Alonso Rios há 87 anos em Compostela, segundo as recolhia ‘El Pueblo Gallego’. Apenas umha mostra dum comício incendiário que decorreu num dos dias de maior cárrega simbólica para o nosso movimento nacional : a proclamaçom dumha efémera República galega graças aos esforços combinados de independentistas, agraristas e comunistas. A desatençom espanhola das obras do caminho de ferro Ourense-Samora motivou o estoupido popular.

Como todo o mundo pode supor, a proclamaçom da República galega é um feito ignorado pola imensa maioria da populaçom, e está ausente dos livros de texto. Apesar da sua curta duraçom e do seu carácter simbólico, reveste importáncia histórica : pom de manifesto a existência dumha afiançada consciência nacional, e o seu engarce com as causas sociais mais avançadas da altura a-a obreira e a agrária. Também revela a determinaçom do nosso povo -testemunhada em outras ocasions- para dar um golpe da mesa quando a paciência se esgota, e as mostras de desprezo espanholas sobardam todo o permisível.

Abertura e incerteza políticas

Em 1931, a Galiza e o conjunto do Estado encetavam um tempo novo, no que as incertezas eram grandes, como também o eram as expectativas de todos os actores políticos. No campo nacional, o galeguismo tencionava superar a parálise padecida na ditadura de Primo lançando um partido de massas com programa possibilista, enquanto o arredismo, apenas activo além mar, procurava aguilhoar a mocidade mais radicalizada a favor do rupturismo e a acçom directa. Em termos gerais, o propósito nom foi conseguido, mas os feitos de Junho só podem ser entendidos com este impulso. Campos Couceiro, um dos promotores da iniciativa, era um membro da Sociedade Nazonalista Pondal recém chegado de Bos Aires.

O detonante da insurrecçom foi a decisom do conselho de ministros em Madrid, ao acordar a suspensom das obras do caminho de ferro entre Samora e a Corunha. As obras desta enorme infraestrutura -em termos da época- mudaram a paisagem social do surleste galego ; mais de 10000 trabalhadores, que agora viam perigar o seu trabalho, punham-se em contacto com as teses e as práticas do movimento obreiro numha das comarcas mais pobres e isoladas do país.

A paralisaçom das obras é entendida por umha parte importante da sociedade como umha aldragem à Galiza inteira. Na imprensa autonomista da época (mais autonomista e mais livre que a que hoje se denomina de tal modo) podem-se ler críticas duríssimas ao tratamento que recebe o país por parte de Madrid. Nom surprende entom que cabeçalhos como ‘El Pueblo Gallego’ mostrem total compreensom pola greve que se convoca em apoio ao caminho de ferro.

Na madrugada do 25 de Junho, umha multidom marcha na cidade das Burgas e ocupa a casa do Concelho ; no prédio do governo civil, a bandeira espanhola (republicana) é retirada, e no seu lugar ergue-se a ensenha nacional. Neste feito simbólico mostra-se, contra as versons facilonas do galeguismo hispanista, que a participaçom arredista era determinante.

Através de comunicaçom telegráfica, a mais ágil na altura, os manifestantes esperam respostas das autoridades espanholas : ao outro lado da linha acham-se dous esquerdistas, Largo Caballero e Casares Quiroga, que contestam com boas palavras mas sem compromissos determinantes. A ambiguidade governamental leva a concluir à multidom que, dumha ideologia ou outra, os gestores de Madrid sempre anteponhem a sua perspectiva espanhola à compreensom dos interesses da Galiza.

Importantes cabeçalhos da imprensa espanhola ou catalá recolhem os feitos, como também o fam jornais de Áustria ou os Estados Unidos. A milheiros de kilómetros observa-se com interesse a rebeliom galega ; para a imprensa estadounidense, a tentativa autodeterminista protagoniza-a um povo de celtas, isto é,  de ‘sonhadores, trabalhadores e advogados inteligentes’.

De Seabra a Compostela

A bandeira galega chegou a içar-se também na Póvoa de Seabra, que manifesta abertamente a sua vontade de se integrar na Galiza ; trata-se quiçá do feito político -nom cultural- mais contundente produzido na Galiza oriental em favor da unidade do nosso território.

Mas o momento mais transcendente decorre em Compostela na jornada do 27 de Junho. Da concentraçom e comício celebrados na capital saírom as palavras mais contundentes, e a própria proclamaçom da República. Qualquer das arengas fai palidecer os discursos politicamente planos e autocensurados da imensa maioria da esquerda e do nacionalismo actuais : Carrero Valenzuela fala de ‘independência absoluta’ ; o comunista Eduardo Puente chama a ‘levar à forca todos os que vendem a Galiza’ ; e Alonso Rios, o galeguista formado na emigraçom e no movimento agrário, teima na desconfiança com o poder central, e numha revoluçom – ‘se cumpre com as armas na mao’- no momento em que se esgotárom ‘todas as soluçons humilhantes’. A independência e a aproximaçom a Portugal som propostas chave do seu discurso.

A insurrecçom seguiu o seu curso : o concelho é assaltado, as autoridades dimitem, e Alonso Rios é nomeado presidente da Junta Revolucionária da República Galega. O Estado galego estava proclamado, e restava que o resto das comarcas seguissem a insurrecçom.

Rectificaçom estatal e legado político

Nom sabemos qual seria o alcanço desta proposta independentista de nom produzir-se a rectificaçom do governo republicano ; si sabemos que, em termos estritos, nom foi derrotada, senom que os insurrectos decidírom repregar-se umha vez que o governo aceitou umha das reivindicaçons essenciais do movimento popular : a continuidade das obras.

Contodo, o legado político foi importante : quanto menos dous dos dirigentes da revolta, Campos Couceiro e Alonso Rios, continuárom o seu trabalho galeguista em altas responsabilidades associativas na Argentina posterior a 1936. A Alonso Rios, que foi o primeiro presidente simbólico da nossa República, cabe-lhe a honra também de ter sido o último presidente legítimo da nossa Terra, como máximo responsável do Conselho da Galiza trás o passamento de Castelao. Apenas a traiçom dos chamados ‘galeguistas do interior’, que renunciárom à luita política na posguerra, impediu que Alonso Rios fosse restituído como presidente legítimo na Reforma política, como si o fôrom os líderes da Generalitat e do Governo Basco no exílio.

Resgate da memória

Dos efeitos traumáticos que para a nossa memória tivo o genocídio de 1936 dá prova que até começos deste século que andamos, o movimento galego nom se lançasse a umha recuperaçom decidida deste capítulo da nossa história. Desde o ano 2010, colectivos como A associaçom cultural Foucelhas, a Revoltaina cultural de Bergantinhos, comemorárom com um jantar a data ; centros sociais como a Gentalha do Pichel tenhem popularizado os feitos de 1931. Neste ano, a Associaçom Cultural Alexandre Bóveda, da Corunha, lança um importante trabalho de divulgaçom histórica ; a organizaçom Causa Galiza, por seu turno, convoca umha ceia de fraternidade em Lugo com a projecçom do documentário ‘A República galega : umha história nom oficial’, de Lois Pérez Leira.