Por Eddie Abrahams e Susan Davidson (traduçom do galizalivre) /

Em 1987 e 1988 produzírom-se importantes aniversários na luta pola libertaçom negra. Em 1838, a escravatura foi abolida nas colónias britânicas do Caribe. O 17 de Agosto de 1887 nasceu Marcus Garvey, um destacado pioneiro do nacionalismo negro. Estes aniversários fôrom usados por umha diversidade de oportunistas do Partido Trabalhista e do nacionalismo negro para apresentar a visom política e a contribuiçom de Marcus Garvey como um guia válido para a luta contra o racismo e o imperialismo hoje.

Garvey dedicou a sua vida à luta polo seu povo, «a poderosa raça negra», como el a chamava. Foi escritor, editor de livros e jornais, organizador político e agitador. Hoje som muitas as pessoas que afirmam estar a seguir os seus passos.

Dentro do movimento comunista e anti-racista, continua a haver um virulento debate sobre a verdadeira visom política de Garvey e a sua contribuiçom para a luta pola libertaçom negra e polo socialismo. Este debate remonta-se ao esplendor da sua influência quando liderava a Universal Negro Improvement Association (UNIA) [Associaçom Universal para a Melhora do Negro] – um movimento verdadeiramente popular basado principalmente nas empobrecidas massas negras nos EUA durante a era da pós-Primeira Guerra Mundial.

As ideias de Garvey mantenhem ressonância em sectores da pequena burguesia e do Partido Trabalhista dedicados hoje à luta contra o racismo. Assim, fai-se necessario para as comunistas entender o significado e o caráter contraditório da herança de Garvey.

Garvey – organizador político

Em 1909, com 22 anos e já um jornalista consumado, Garvey abandonou a Jamaica numha tournê que o levou por Costa Rica, Equador, Nicarágua, Honduras, Colômbia, Venezuela e Panamá.

Em todos estes países, testemunhou de primeira mao as terríveis pobreza, sofrimento e exploraçom dos jamaicanos que fôrom forçados a abandonar as suas casas na procura de trabalho e meios de subsistência. No Panamá, ficou particularmente chocado com as condiçons dos trabalhadores que construírom o Canal do Panamá.

Enquanto viajava, fixo discursos e arengou as trabalhadoras nos campos de tabaco, nas minas e nas fábricas tentando organizá-las para melhorar as suas condiçons.

Retornou à Jamaica em 1914 onde deu seu primeiro grande passo como organizador político ao fundar a UNIA. As suas viagens convencera-no de que a dispersom do povo africano em todo o mundo à mercê dos exploradores brancos era a fonte da sua debilidade. A declaraçom fundacional da UNIA proclamava que o seu alvo era «Unir todo o povo negro do mundo num grande corpo para estabelecer um país e um governo absolutamente de nosso».

Garvey deveria ampliar a sua visom de libertaçom negra para incluir a libertaçom da África, que na altura estava dividida entre as principais potências imperialistas europeias. El adoptou o slogan «África para as africanas – na casa e no exterior».

Enquanto a UNIA nom cresceu inicialmente na Jamaica, nos EUA tornou-se um movimento de massas muito rapidamente logo de que Garvey chegara lá em 1916. Esse sucesso levou a um confronto imediato com a organizaçom daquela dominante entre os negros – a NAACP (National Association for the Advancement of Coloured People – Associaçom Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor). Em 1919, a UNIA tinha mais de 30 agências em diferentes cidades e reivindicava umha participaçom de mais de 2 milhons. O jornal de Garvey, The Negro World [O Mundo Negro], imprimia-se em espanhol, francês e inglês e tinha umha grande distribuiçom internacional. Foi banido em muitas colónias. As penas por posse eram geralmente de cinco anos. No Dahomey francês, era a prisom perpétua.

Garvey e a classe trabalhadora negra

A UNIA que Garvey criou nos EUA representava umha ruptura massiva do povo negro com a burguesa NAACP. A fenda entre a liderança burguesa da NAACP e as condiçons reais de pobreza, desemprego e racismo enfrentadas pola massa negra após a Primeira Guerra Mundial levárom o agromante movimento negro a procurar umha nova liderança – encontraro-na em Marcus Garvey e a UNIA.

No entanto, nem a organizaçom nem as políticas de Garvey eram capazes de lidar com as demandas democráticas e sociais das massas. O comunista negro Harry Haywood dixo que este «primeiro grande movimento nacionalista» fora «desviado para vias separatistas reacionárias», que: «sob a generalizaçom de Garvey. . . foi desviado dum curso potencialmente anti-imperialista as vias do “retorno pacífico a África”».

Como preparaçom para tal retorno a África, a UNIA realizou umha conferência em 1920, quando 25 mil delegados lotárom Madison Square Gardens para discutir os seus aspectos práticos. Numha atmosfera quase de carnaval, Garvey foi proclamado Presidente Provisório da África para governar com a ajuda de um corte de duques e nobres criado polo movimento à imagem da aristocracia europeia.

Garvey patrocinou com entusiasmo o desenvolvimento de empresas capitalistas negras. Os lucros destes iam destinados a financiar o “retorno à África”. Em 1919, a Black Star Shipping Line foi estabelecida, seguida o ano seguinte por umha Corporaçom de Fábricas de Negros, que desenvolveu umha cadeia de mercearias, restaurantes e lavanderias para serem gerenciados só por pessoas negras.

Quaisquer que sejam as suas intençons idealistas, este programa realmente atendia às necessidades inmediatas da pequena burguesia negra num período de crise económica que devastara a economia do gueto. Além disso, a falta de organizaçom democrática da UNIA impediu a assunçom de posiçons de liderança no movimento por parte de representantes genuínos da classe trabalhadora negra, incluindo comunistas.

Garvey, capitalismo e comunismo

Um dos motivos do fenomenal, embora efêmero, sucesso de Garvey foi a incapacidade do recém formado Partido Comunista dos EUA (CPUSA) para tornar central a questom do racismo e o papel de liderança da classe trabalhadora negra em qualquer movimento comunista nos EUA. Dentro da CPUSA havia quem até negava a existência de racismo e considerava todos os assuntos apenas como problemas de “classe”. Deste jeito, fechavam deliberadamente os olhos ao chauvinismo branco e ao racismo da aristocracia operária. A tendência revolucionária no CPUSA tivo sempre que lutar contra o racismo de grandes sectores militantes do Partido. Assim, de facto, o movimento operário nos EUA e o CPUSA, em particular, nom conseguírom unir-se com a emergente classe trabalhadora negra, que, portanto, apoiava naturalmente forças separatistas nom comunistas, anti-comunistas e negras, como a UNIA de Garvey.

Enquanto comunistas e garveytas forjárom alianças ocasionais nas lutas sociais, estes estavam mais freqüentemente envolvidos em confrontaçons amargamente hostis. À medida que comunistas desenvolvérom o seu trabalho em áreas negras como Harlem e começárom a ter êxito na organizaçom da classe trabalhadora, Garvey lançou umha campanha abertamente antioperária e anticomunista.

Garvey opuxo-se à militância conjunta de operários e operárias brancas e negras. Enquanto as comunistas lutárom para organizar e melhorar as condiçons de todas as trabalhadoras, pretas e brancas, Garvey aconselhava as trabalhadoras negras a assinar acordos para evitar greves e fazer de fura-greves. Declarou:

«…O único amigo conveniente que o trabalhador negro tem na América no momento actual é o capitalista branco … Se o negro tomar meu conselho irá-se organizar sozinho e sempre manter a sua escala de salário um pouco menor do que os brancos até el ser capaz de se tornar, por meio de liderança adequada, no seu próprio empregador…»

Em 1924, na Convençom Internacional da UNIA, Robert Minor, comunista, propuxo umha aliança entre a UNIA e o CPUSA para combater o racismo nos sindicatos e, em conjunto, declarar a guerra contra o Ku Klux Klan. Garvey opuxo-se.

Nom se opuxo só aos comunistas que lutavam contra o racismo, mas também colaborou ativamente com os racistas. El chamou os ataques comunistas contra o KKK de «acto de suicídio político». Foi nesse mesmo ano que Garvey conheceu o coronel Simmons, o Grande Mago Imperial do KKK e convidou John Powel, organizador dos Clubes Anglo-Saxons para dirigir-se à UNIA. Esta colaboraçom criminal foi realizada na crença de que poderia acelerar a repatriaçom de cidadáns negros dos EUA para a África.

A UNIA que no seu primeiro período dera a milhares e milhares de pessoas negras um senso de dignidade e confiança desintegrou-se rapidamente por causa da política pequeno-burguesa de Garvey; o seu programa escapista de um “retorno à África” foi um obstáculo para umha luta militante polos direitos democráticos nos EUA. O seu separatismo levou-no a dizer:

«Nom nos estamos a organizar para lutar contra ou lixar o governo da América».

Entretanto, o exemplo de total determinaçom da militância comunista na luta em campanhas que vam desde “Sem trabalho, sem aluguer” e manifestaçons anti-linchamento, brigas contra a polícia, arriscando detençons e prisom na actividade diária ganhou para a sua causa a muita gente que ficara desiludida com as conspiraçons de Garvey. No entanto, a CPUSA fracassou em tornar central a questom da libertaçom negra na sua plataforma e gradualmente sucumbiu ao chauvinismo do movimento operário dos EUA. Desta maneira, o CPUSA perdeu qualquer apoio que tivesse entre a classe trabalhadora negra. Ficárom só alguns comunistas isolados, como Harry Haywood, e mais tarde nos anos 70, George Jackson, fóra do CPUSA, desenvolvendo a posiçom comunista correcta que colocova a classe trabalhadora negra e a luta contra o racismo no centro dum movimento revolucionário da classe trabalhadora.

Apesar da política pequeno-burguesa de Garvey, a classe dominante dos EUA nom podia tolerar nenhuma organizaçom negra de massas de significância. O FBI, por conseguinte, incriminou a Garvey, encarcerou-no por dous anos e depois expulsou-no a Jamaica em 1927. Garvey permaneceu ativo na política negra até a sua morte em Londres em 1940, mas nunca com o mesmo seguimento de massas que desfrutara nos EUA.

*Publicado em revolutionarycommunist.org com o título “Marcus Garvey: communist assess his political outlook as a guide for action today”