Por galizalivre /
Conseguir fazer crer que o galego é um povo manso e submisso por natureza foi umha das armas ideológicas prediletas do espanholismo, chegando ao ponto no que a grande maioria das elites autóctones interiorizárom e difundírom o mito. Assim como na Guerra Civil os dous bandos coincidírom paradoxalmente em dizer-se representantes da “autêntica Espanha”, face a invasom “estrangeira” -ora russa, ora germana-; hoje em dia da extrema direita espanhola ao autonomismo galego coincidem em explicar -num curioso exercício de essencialismo- as reacçons de autodefesa do nosso povo como antinaturais, e portanto só explicáveis em base a agentes foráneos.
Nom se entra em análises sociológicas da origem do conflito, nem muito menos no debate político. Quem se defende da agressom espanholista já nom é alguém equivocado na estratégia, ou “um violento”, senom que mesmo deixa de ser “galego”. Mas realmente o povo galego foi sempre manso? Do mito da belicosidade galaica contra Roma, passando polos galegos do medievo afamados na península como arriscados, o soldado galego elogiado por Wellington e postos como exemplo do que deveriam aprender os espanhóis, ou a resistência anti-franquista tomada como exemplo para a Resistence francesa, a história mostra umha e outra vez episódios que desmentem o tópico.
Rescatamos um texto bem curioso, publicado em La Correspondencia Militar de Madrid em 12 de dezembro de 1902, no que se mostra o temor de que os numerosos desacatos à autoridade da Guarda Civil -criada como polícia rural no século XIX- podam generalizar-se, impedindo-lhe cumprir “a sua delicada missom”, que nom era outra do que a pacificaçom do mundo rural para fazê-lo entrar nos corsés do Estado moderno.
Outra agressom
Energia para punir
Segundo notícias da Corunha, na noite do domingo último foi agredida por vários paisanos a parelha da Guarda Civil que se achava de serviço na estrada de Santiago, próximo a Carral, no sítio chamado Mesom do Bento.
Prestava a parelha o seu serviço, quando vários moços, que acabavam de sair de umha taberna, a rodeárom berrando: “Morra a Guarda Civil!”, atirando várias pedra aos guardas, resultando ferido na testa o guarda Manuel Rodríguez. Os indivíduos da benemérita tivérom que fazer uso das suas armas para impor-se aos agressores, resultando morto o paisano André Vazques, de duvidosos antecedentes, e alguns outros feridos, capturando um tal Farinhas, que foi dos que com mais ardor agrediu os guardas.
Di-se já que a agressom foi devida a achar-se embriagados os moços. Pode que o estivessem; mas na Galiza vam-se repetindo estes feitos, o que acusa umha grande falta de respeito à Guarda Civil.
Nom há muito que no cantom do Barco de Val d´Eorras foi agredida a força do Corpo. Em julho último outra turba de bêbedos, melhor dito, malfeitores, na romaria de Santiago de Riba, próximo a Chantada, assassinárom um guarda, e os outros indivíduos que ali prestavam serviço tivérom que fazer uso das suas armas para impor-se àquela turba de selvagens; e algo parecido ocorreu na noite do 27 de maio do ano anterior ao regressar umhas parelhas da romaria de Uges, cerca da Corunha, quando ao chegar ao lugar denominado Feáns, umha turba de moços ali emboscados figérom umha descarga sobre os guardas ao grito de: “Morra a Guarda Civil!”.
Severíssima pena marca o Código de Justiça Militar para castigar esses delitos; mas em nengum de esses dous casos sabemos que se tenha aplicado com a flexibilidade que reclamam a sua gravidade e o necessário que é manter a força moral do Corpo.
Tam punível debilidade para castigar os delitos de desacato à Guarda Civil dá lugar a que esses factos se repitam, porque a impunidade alenta os malfeitores. Por isso a criminalidade aumenta em proporçons alarmantes.
Para manter os prestígios e a força moral da Guarda Civil, há que ser inexoráveis no castigo dos que cometem esses delitos de desacato, sem dilaçons que quitam às penas o grande efeito da exemplaridade.
O que vem ocorrendo na Galiza é intolerável, e se nom se ha de castigar severamente aos autores desses atentados, perderá ali a Guarda Civil a força moral que lhe é tam necessária para encher a sua difícil e delicada missom, respondendo aos fins para que foi criada.
La Correspondencia Militar
Madrid, 12 de dezembro de 1902