Por Isaac Lourido /
Ramón Piñeiro era pago pola CIA. Esta ideia sintetizou por muitos anos o descontento do soberanismo galego com as elites da cultura autonomista. E a essa ideia reduze-se praticamente todo o conhecimento disponível sobre o encaixe do galeguismo no contexto da Guerra Fria cultural. Um conhecimento, portanto, extremamente fraco, mais bem intuitivo, alicerçado na suspeita e na vontade de confronto político.
Hoje está provado que o Departamento de Estado norte-americano desenvolveu nos anos da Guerra Fria um sofisticado plano para combater a ampla influência soviética sobre a comunidade intelectual europeia e latino-americana. A estratégia foi articulada de maneira deliberadamente opaca, através de diferentes instituiçons, publicaçons e agentes, dum sistema de financiamento quase sempre indireto (congressos, bolsas, conferências, editoras) e dumha política de seduçom e cooptaçom de pessoas nunca explicitada como tal. Os objetivos fôrom atingidos: foi nesse contexto quando se consolidárom os conceitos de “mundo livre”, “totalitarismo”, “cultura” ou “liberdade intelectual” que ainda hoje fazem parte da cobertura ideológica das democracias liberais no dito primeiro mundo.
Em estudos amplamente documentados, María Teresa Ordaz Romay concluiu que os republicanos exilados nos EUA após a guerra civil espanhola fôrom maciçamente captados para esta estratégia, com três objetivos: intensificar a divisom da oposiçom ao franquismo, reforçar a penetraçom do imperialismo ianqui em Latino-América e preparar o terreno para a reforma política após a morte de Franco. Testemunhas diretas como Victor Fuentes e investigaçons críticas como as de Sebastiaan Faber demonstram que a imensa maioria daquela comunidade exilada – na qual tivérom protagonismo galeguistas como Emilio González López, Ramón Martínez López ou Ernesto Guerra da Cal – fôrom atingidos com maior ou menor intensidade, consciência ou predisposiçom polas redes da CIA. Aliás, outros galegos anti-comunistas e anti-nacionalistas como Salvador de Madariaga ou Eugenio Fernández Granell nunca se molestárom muito em ocultá-lo.
Por sua vez, os trabalhos de Olga Glondys permitem-nos enquadrar a participaçom dos homens de Galaxia nesta Guerra fria cultural. Sabemos por exemplo que Domingo García-Sabell foi integrante permanente da delegaçom espanhola do Congresso pola Liberdade da Cultura – rede de intelectuais que tivo grande centralidade neste processo – e que Ramón Piñeiro, embora sem a mesma continuidade que García Sabell, também participou nessa estrutura. A quem lesse com olhos curiosos o romance de Manuel Vázquez Montalbán sobre Jesús Galíndez, exilado basco e colaborador da CIA, talvez o apanhasse de surpresa encontrar naquelas páginas o nome do corunhês Emilio González López. Figura destacada do hispanismo norte-americano da época, dirigiu de 1964 a 1971 a Escuela Española do Middlebury College e convidou nesse período Ramón Piñeiro para proferir cursos sobre filosofia em cinco veraos consecutivos.
A revelaçom em 1966 do financiamento do Congresso pola Liberdade da Cultura por parte do Departamento de Estado norte-americano provocou umha grave crise na iniciativa, e motivou o abandono de muitas das pessoas que a integravam, alegadamente por sentir-se utilizadas para fins que desconheciam. Isto indica que qualquer interpretaçom simplificadora dos factos – do tipo, “os galeguistas de Galaxia estavam ao serviço da CIA” – corre o risco de distorcer a realidade. Será talvez menos arriscado dizer que se produziu naquele contexto umha convergência de interesses e benefícios recíprocos, que o reconhecimento era mais facilmente acessível polo caminho do novo liberalismo cultural e do anti-comunismo promovido polo bloco capitalista ou que, se formos generosxs, aqueles galeguistas preferírom a determinada altura olhar para outro lado.
Importa muito mais saber que fôrom eles os responsáveis e os responsabilizados de preparar o terreno, que foi essa umha das bases constituintes do galeguismo atual, da nossa intelectualidade, da nossa normalizaçom.