Por Júlio Teixeiro /

Além dos lumes habituais de cada ano, periodicamente Galiza vive crises incendiárias como a que sofremos, neste mês de Outubro, e que arrasou 35000 hectares de monte. Os custos directos destes lumes (extinçom, rendas perdidas, restauraçom das zonas calcinadas…) cifram-se nuns 550 milhons de euros. Umha quantidade que ultrapassa o orçamento total da Conselharia do Meio Rural para o 2018. De facto, cada ano o impacto dos incêndios sobre a economia galega, calculado em relaçom ao PIB, supera em cinco vezes o que tem sobre a economia espanhola.

As cifras som eloquentes e pareceria que ajudam a entender; aliás, a exemplar reaçom do povo diante de situaçons tam dramáticas é sempre reconfortante. Mas nada disso oculta umha sensaçom generalizada de perplexidade perante o sem sentido da tragédia. O lugar natural do drama e a tragédia, o teatro, serviu no s. XX para fazer balanço ‑desde a lucidez traumatizada daquel momento- do programa histórico da modernidade nos seus elementos básicos: progresso, luz da razom, dignidade humana… Um balanço, nada optimista, que reflictem paradigmaticamente os contributos de autores como Ionesco ou Beckett, caracterizados por tentar exprimir, no cenário, o sentido do sem sentido. Neste país, a fatal periodicidade dos incêndios (e doutros desastres ambientais como as marés negras ou as diversas pragas) renova, continuamente, a intuiçom do absurdo na consciência social. E, infelizmente, nom como liçom filosófica tirada da literatura, mas como experiência derivada da realidade.

Bem pensado, porém, o absurdo nom existe fora da literatura. Tudo o que é real é também racional; ainda que, por outro lado, sejam possíveis racionalidades diversas e mesmo alternativas. Por exemplo, quando se procuram explicaçons econômicas para os incêndios nom se trata apenas de identificar os interesses que ganham com o lume (que sem dúvida os hai), mas, sobretudo, de desvendar os fundamentos e as regras econômicas que dam sentido a recorrência, ano trás ano, dos incêndios florestais. Fundamentos e regras nas que consiste umha racionalidade segundo a qual, a organizaçom social, reduz às pessoas a umha individualidade, solipsista, cujo único vínculo é o consumo; a natureza é codificada como espaço topológico manipulável; e a práxis produtiva desenvolve-se sob o pressuposto dum crescimento perpétuo.

Defronte dessa racionalidade sistémica, outra racionalidade é possível. Umha racionalidade comunitarista, baixo cuja estrutura, a consciência individual exterioriza-se colectivamente; a natureza torna-se território e, portanto, responsabilidade social; e a produçom tem como critério principal as necessidades da gente, materiais e imateriais. De se efectivar na Galiza, esta ordem de cousas, recuperaríamos a natureza como território, reverteríamos o despovoamento e o inverno demográfico e, em consequência, os incêndios passariam de ser regra a excepçom.